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sexta-feira, 22 de outubro de 2021

ORÇAMENTO DE ESTADO E LEIS LABORAIS: ESTARÃO LIGADOS?


Agora, que estamos na fase de discussão do Orçamento de Estado para 2022 e em que os partidos de esquerda (PCP; BE e PEV) colocam as questões das alterações às leis laborais como uma das condições para sua a aprovação, tem-se lançado a ideia que orçamento é orçamento e leis laborais são leis laborais, pelo que não devem ser misturados.
Lamento, mas, em minha opinião, o Orçamento de Estado, tendo âmbito próprio, não está à margem das leis laborais, pois elas fazem parte da política geral do governo, o que procurarei demonstrar.
Sabemos que OE é um instrumento de política financeira, económica e social e as leis laborais têm tratamento próprio e autónomo do OE, mas, isto é uma questão meramente técnica, pois o OE e as políticas laborais e sociais são indissociáveis e inseparáveis, já que, politicamente, é impossível avaliar um OE sem ter em conta as políticas que o governo desenvolve no seu conjunto. Para encurtar caminho, direi, como sempre disse, que não há políticas de esquerda com leis laborais de direita.
Ora, sendo a aprovação do OE uma condição que ajuda a sustentar o governo, importa dizer que não é muito coerente aprovar um OE com os votos da esquerda para, depois, durante o resto do ano, em matérias laborais, sociais e até económicas esse mesmo governo não cumprir com o aprovado e governar à direita e com o apoio da direita. É óbvio que, sob a capa de que o OE é uma coisa e as leis laborais são outra, este, ou qualquer outro governo fica com mãos livres para em Outubro, Novembro e Dezembro fazer que é de esquerda e nos restantes nove meses do ano se entender com a direita, como se tem visto. Por isso, na avaliação política, e não técnica, da governação temos de ter em conta toda a política e não apenas a orçamental.
Ainda assim, se fizermos uma avaliação rigorosa à governação do governo minoritário do PS e aos seus Orçamentos, aprovados com os votos da esquerda, facilmente concluiremos que os avanços proclamados não devem ser desvalorizados, mas, em minha opinião, estão muito aquém do propagandeado e só a necessidade de justificar opções de duvidosa coerência e justeza justificam tamanha publicidade.
Mas, dando de barato que tecnicamente OE e leis laborais são coisas distintas, sempre direi que a realidade mostra inequivocamente que estamos perante OEs que mantêm uma matriz neoliberal e economicista, que não altera o perfil periférico da nossa economia e que está a ter consequências nefastas para os salários, para as Funções Sociais de Estado e os Serviços Públicos, para a Habitação, para a qualidade dos Transportes Públicos, para a Coesão Territorial, entre outros. Dou exemplos:
• É ou não verdade que estes OEs continuaram a negar o direito de negociação colectiva aos trabalhadores da Administração Pública e que por via disso e invocando isso se nega uma correta política de carreiras, de aumentos salariais dignos a estes trabalhadores e por arrasto aos demais trabalhadores do sector privado, onde se incluiu a tímida actualização do Salário Mínimo Nacional e que havendo aumentos isso tem implicações directas no aumento das receitas e na distribuição da riqueza?
• É ou não verdade que as desigualdades sociais e as assimetrias regionais se acentuaram e a pobreza atinge níveis que nos envergonham e que se empobrece a trabalhar?
• É ou não verdade que são precisos mais médicos, enfermeiros, técnicos de diagnóstico e pessoal auxiliar nos hospitais e centros de saúde e que o governo impede as contratações necessárias e está a levar à degradação do SNS?
• É ou não verdade que, tendo por base os chamados constrangimentos orçamentais, o governo faz um ataque às carreiras dos docentes e se recusa em adoptar políticas de rejuvenescimento dos quadros de docentes e a contratação de pessoal auxiliar e administrativo?
• É ou não verdade que a aplicação da redução do preço dos passes sociais (PART) está perfeitamente inquinada porque com estes OEs faltam recursos para contratar trabalhadores e aumentar a frota e a sua aplicação deixa de fora as populações do Interior?
• É ou não verdade que em sede do OE as políticas de combate às assimetrias regionais, onde se inclui a urgência de abolição das portagens no Interior do país, são débeis e ineficazes quando esta é uma questão indispensável para a melhoria da qualidade de vida, para o aumento da competitividade da economia do Interior do País e para o aumento do rendimento disponível dos trabalhadores e famílias?
• É ou não verdade que a política de habitação, vertida na recente lei de bases de habitação e nos OEs, é um embuste que mantém a especulação imobiliária e rendas especulativas absolutamente inacessíveis aos trabalhadores que apenas vivem do seu trabalho?
• É ou não verdade que o governo nos seus OEs persiste na linha do controle e redução do défice à custa dos direitos laborais e sociais dos portugueses e em particular dos trabalhadores e insiste na recusa em renegociar a divida que continua a aumentar, atingindo valores nominais assustadores e impagáveis?
• É ou não verdade que o governo continua a desprezar a necessidade imperiosa do investimento público, como propulsor do investimento privado, e que por isso o perfil da nossa economia continua frágil, exposta às oscilações internacionais e europeias e à economia de casino e em que a vantagem comparativa que apresenta são os baixos salários, e o emprego precário e sem direitos?
• É ou não verdade que o mesmo governo que quer os votos favoráveis para aprovar os OEs é o mesmo governo que agravou a legislação do trabalho (por exemplo alargou o período experimental para 180 dias) e resiste a alterar as leis laborais aprovadas por Passos e Portas? É óbvio que é verdade!
• E por fim! É ou não verdade que o OE, a ser aprovado com os votos à esquerda, negaria aumentos salariais justos e o correto descongelamento de carreiras e a esquerda ficaria ligada a isso?
Estes são apenas alguns exemplos que fundamentam a minha opinião sobre os OEs destes últimos anos que, pesem embora pequeníssimos avanços e travagens de ambições da direita política, estão em linha com a política laboral do governo, com a diferença que as leis laborais são aprovadas pelo PS com a direita e os OEs são aprovados pela esquerda.
Eu sei que me dirão que a não aprovação dos OEs poderia levar à queda do governo com a penalização dos responsáveis por essa queda e o regresso da direita pura e dura. Sobre isto direi que só há queda do governo se este não ouvir o clamor do mundo do trabalho e preferir ouvir as anacrónicas confederações patronais e não quiser aceitar negociar as propostas dos partidos de esquerda. Mas, já agora, antes de qualquer voto contra, defendo uma atitude negocial de exigência pública, participada, envolvente, transparente e publicitada e depois disso, estou certo que a penalização só existiria se houvesse tibiezas na explicação, se não houvesse clareza na exigência de políticas para os trabalhadores, reformados e camadas intermédias da população, vulgo micro, pequenos e médios empresários.
É isto que eu defendo para qualquer solução política futura e, por isso, defendo que voto favorável dos OEs deve se feito com Orçamentos que respondam aos problemas do país e que não cedam ao grande capital financeiro e especulativo e com a garantia de políticas laborais e sociais que defendam os trabalhadores, combatam a precariedade e assegurem o direito à negociação colectiva, pois com isso aumenta a estabilidade, dinamiza-se a economia e aumenta a receita do estado
Luís Pereira Garra in facebook

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