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Carvalho da Silva
Sou defensor convicto do Serviço Nacional de Saúde (SNS), pela evidência dos extraordinários ganhos para o conjunto dos portugueses, que a sua existência significa.
A universalidade no acesso em todas as áreas e patamares do exercício da medicina, desde logo, na saúde preventiva e no diagnóstico precoce, são um pressuposto confirmado de melhor saúde e, seguramente, de menor custo. Também é claro que as nossas escolas de medicina, de enfermagem e de outras profissões da saúde são de excelência, porque o SNS tem muita qualidade. Dessa qualidade têm-se apropriado os setores privado e social.
Pessoalmente, posso testemunhar que, se sou hoje uma pessoa ativa e saudável, o devo aos conhecimentos, às capacidades e multivalências acumuladas no SNS e aos saberes e dedicação excecional dos seus profissionais, que me resolveram três problemas muito delicados, um dos quais havia resultado da incapacidade de resposta de um hospital não plenamente público.
Recentemente, tenho acompanhado o bloqueio com que uma jovem, de 23 anos, se tem deparado no acesso a um diagnóstico e ao tratamento adequado. Esta jovem sentiu, ao descer umas escadas, a 6 de novembro, uma dor forte num joelho. Dirigiu-se à Urgência do hospital (região de Lisboa) onde, após a realização de um raio-x lhe foi comunicada a suspeita de uma rutura do menisco e marcada consulta para o dia 9. "Apesar de ter dificuldade em deslocar-se nesse dia ao hospital (não podia fazê-lo sozinha), compareceu. O médico apenas lhe entregou uma requisição de ressonância magnética para ela entregar no balcão. A ressonância é feita em clínica com a qual o hospital tem acordo. Esta jovem, porque tem formação e é muito ativa, já tentou desbloquear a situação via Centro de Saúde e através do site da Junta de Freguesia: sem êxito, em parte devido a condicionalismos resultantes das respostas à pandemia. No passado dia 15, do hospital foi-lhe transmitido que não vale a pena insistir no contacto, pois isto é mesmo assim. A clínica, quando receber o nosso pedido, contacta-a para marcar o exame".
Os atrasos nas respostas em saúde provocam problemas graves para os cidadãos e agravam aceleradamente os custos. Neste caso, corre-se o risco de o tratamento ou intervenção a fazer ser bastante tardia (a jovem trabalha e estuda) e a recuperação pode vir a ser bem mais demorada, por exemplo, em fisioterapia. E está todos os dias a tornar-se mais dispendioso, até com custos administrativos. Isto é demolidor para o SNS e uma rampa de encaminhamento para o setor privado de quem, em desespero e com condições financeiras, o possa fazer. Em algumas especialidades, aí o acesso é mais fácil e as instalações convidativas.
O SNS prestigiou-se nas respostas à pandemia, mas o insuficiente investimento e o retardar de um esforço estratégico de melhoria da sua organização são demolidores. Não embarquemos na ideia de que existe o suficiente consenso entre os portugueses para a defesa do SNS. É urgente a valorização salarial dos seus profissionais e das suas carreiras, o reforço de quadros, e um muito maior envolvimento e responsabilização de quase todas as profissões na definição e aplicação de novas dinâmicas na organização do seu trabalho.
Ponha-se de lado a lógica gestionária que mimetiza as práticas privadas centradas no lucro e nos ganhos imediatos. A saúde pode parecer cara no imediato, mas os ganhos obtidos com investimento atempado multiplicam-se no futuro como em nenhum outro setor.
*Investigador e professor universitário
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