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segunda-feira, 19 de julho de 2021

Quando o terrorismo se cruza com saúde mental


 www.dn.pt /


No final de junho um homem de 24 anos, de origem somali, atacou várias pessoas com uma faca na cidade alemã de Wurzburg, deixando três mortos e cinco feridos graves. O suspeito já era conhecido pelas autoridades e tinha historial psiquiátrico, tendo sido admitido numa clínica psiquiátrica uns dias antes do ataque.

Embora este homem possa sofrer de problemas de saúde mental, investigações posteriores ao ataque mostram que atuou sozinho e que possuía, em sua casa, propaganda jihadista, indicando que a investida pode ser fruto de motivação político-ideológica e não (apenas) de uma condição psiquiátrica. Quando o terrorismo se cruza com saúde mental várias questões surgem para apurar e perceber qual o peso de cada determinante - motivação político-ideológica ou situação psiquiátrica - no planeamento e no momento do ato.

Antes de avançar, importa aqui dar o contexto: a primeira geração de estudos na área do terrorismo dedicou-se a procurar e a provar que os terroristas tinham problemas de saúde mental (como é que alguém é capaz de praticar semelhante violência contra pessoas inocentes e sem qualquer ligação prévia de forma consciente e lúcida?, era a questão que inquietava os especialistas). No entanto, esta procura deu-se em vão, pois concluiu-se que os terroristas são pessoas normais, como tantas outras, mas que cometem a violência em nome de uma causa político-ideológica de forma racional e deliberada. Partiu-se então para o estudo dos fatores sociais e contextuais do terrorismo, o que inaugurou a segunda geração de estudos. Mais recentemente, dada a ausência de respostas para explicar certos atos extremistas, como o caso de atores solitários, que tem sido o modus operandi prevalecente na Europa nos últimos anos, os cientistas voltaram a olhar para os fatores de saúde mental como causa possível de explicação do terrorismo e da radicalização. As conclusões são pertinentes.

De acordo com estudos feitos com atores solitários - como o caso de Wurzburg - percebeu-se que a prevalência de problemas de saúde mental é 13,49 vezes superior em pessoas que cometem atentados isolados do que em pessoas envolvidas em grupos extremistas. E há quem vá mais longe, como a Radicalisation Awareness Network, centro de excelência da Comissão Europeia, que afirma que a presença de qualquer problema de saúde mental é uma pré-condição para qualquer ato extremista. Neste sentido, e para responder à questão sobre qual dos determinantes tem mais peso no momento do ato, outros estudos mostram que pessoas com problemas de saúde mental apresentam comportamentos e motivações racionais e, portanto, são capazes de cometer violência de forma deliberada e planeada.

A prevalência de doença mental e o seu cruzamento com o terrorismo mostra a complexidade e a dificuldade em avaliar e combater este fenómeno. Mas mostra também a necessidade de envolver a sociedade toda na prevenção da radicalização e da violência extremista, dado que, para as forças e serviços de segurança, é mais difícil identificar atores isolados que não se encontram envolvidos em grupos ou em redes extremistas.

Assim, um trabalho coordenado de consciencialização da sociedade e de prevenção da radicalização, que comece nas escolas e nas camadas mais vulneráveis, com o envolvimento de psicólogos, psiquiatras e assistentes sociais, conjugado com a partilha de informações entre si e com as autoridades, deve ser valorizado e implementado para evitar situações semelhantes no futuro. Mas, sobretudo, para promover desde cedo a saúde mental e a segurança de todos.

Investigadora da Universidade do Porto em prevenção de radicalização e terrorismo



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