A Assembleia Constituinte que inicia hoje os trabalhar enfrenta o desafio de redigir a primeira Constituição nascida do voto popular em 200 anos de independência e terminar com a herança do ditador Augusto Pinochet, considerada a génese da desigualdade.

A Assembleia Constituinte que inicia hoje os trabalhar enfrenta o desafio de redigir a primeira Constituição nascida do voto popular em 200 anos de independência e terminar com a herança do ditador Augusto Pinochet, considerada a génese da desigualdade. A Assembleia Constituinte que inicia hoje os trabalhar enfrenta o desafio de redigir a primeira Constituição nascida do voto popular em 200 anos de independência e terminar com a herança do ditador Augusto Pinochet, considerada a génese da desigualdade.



"O ADN da Constituição de 1980, com a qual duas gerações cresceram, será quebrado. A nova Constituição vai retirar muito do poder oligárquico da direita que se apoderou dos recursos do Estado. 

A Constituição que o Chile começa a pôr fim não impôs apenas um modelo neoliberal que privatizou o país, mas o mais extremo de todos os modelos neoliberais do mundo", explica à Lusa o economista, cientista político e diplomata, Fernando Ayala.

Ao longo dos próximos nove meses, com a possibilidade de extensão por mais três, os 155 membros da Assembleia Constituinte, denominada Convenção Constitucional, vão debater um novo contrato entre o Estado e a população.

Depois de 40 anos de uma Constituição imposta pela ditadura Augusto Pinochet (1973-1990) que fez do Chile um dos principais laboratórios neoliberais do mundo, os chilenos elegeram em maio passado uma maioria de representantes da esquerda e da centro-esquerda.

A direita não obteve o mínimo de um terço dos votos para poder influir, muito menos vetar, as decisões de uma ampla maioria decidida a enterrar o último vestígio do legado de Pinochet.

Pela primeira vez na História, um país vai redigir uma Constituição com integrantes com igualdade de género: número igual de homens e mulheres. 

Pela primeira vez, o Chile terá uma Constituição que nasce do voto popular. As anteriores Constituições, de 1833 e de 1925, além da atual de 1980, também foram impostas.

A futura Lei Fundamental, única no mundo a acontecer durante uma pandemia, também vai reconhecer, pela primeira vez numa Constituição chilena, os 12,8% de indígenas da população ao ter reservado 17 dos 155 lugares aos representantes dos povos nativos.

Os chilenos entendem que a estrutura da atual desigualdade social do país é fruto do atual modelo neoliberal que define o direito à Educação, à Saúde e às Pensões como um serviço privado a ser contratado. Até mesmo a água é um bem privado no país. 

O Estado tem um papel secundário com um gasto social mínimo.

"O que aconteceu no Chile não é comparável a nenhum outro país. Aqui tudo foi transformado em instrumentos do mercado. O princípio da atual Constituição é o da 'subsidiariedade', isto é, aquilo que o mercado pode fazer, o Estado não tem por que intervir. O que se pretende é o nascimento de uma nova República", indica Fernando Ayala, também ex-embaixador do Chile em Portugal (2009-2012).

A Assembleia Constituinte foi arrancada à força através das grandes e violentas manifestações iniciadas em 18 de outubro de 2019. Mal sabiam os que se revoltaram com o aumento no preço do metro que aquela faísca conseguiria acabar com o mais sólido de todos os legados de Pinochet.

A atual Constituição foi levemente alterada mais de 50 vezes ao longo dos últimos 30 anos, mas a sua estrutura manteve-se intacta. Para ser reformada, era necessária uma maioria de dois terços de legisladores que dependia de um sistema eleitoral, criado para impedir a formação de maiorias.

A Constituição neoliberal gerou o período de maior crescimento sustentável da história do país. Por um lado, atraía investimentos e permitia estabilidade económica e política; por outro, concentrava a riqueza e mantinha as oportunidades restritas a um grupo de privilegiados.

"O processo que nasce agora põe fim à transição do Chile, da ditadura à democracia. Finalmente, a transição para a democracia será completa no Chile, com 30 anos de atraso", conclui Fernando Ayala.