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domingo, 2 de maio de 2021

Os bombos de Tomelloso, uma construção de pedra que resiste à passagem do tempo

 


Construções rurais tradicionais antigas concebidas para abrigar pastores e trabalhadores do campo, juntamente com os seus animais de trabalho e ferramentas agrícolas.


Em algumas localidades de Ciudad Real (Espanha) é possível vislumbrar, no meio do campo, algumas pequenas saliências (quando olhadas à distância) que aparecem do nada. As que estão mais perto da estrada podem ser vistas claramente, mas outras, mais distantes, parecem confundir-se com a paisagem e só podem ser vistas a poucos metros delas. São os chamados bombos, modestas construções rurais tradicionais concebidas para abrigar pastores e trabalhadores do campo, juntamente com os seus animais de trabalho e ferramentas agrícolas.

O idealista/news viajou a Tomelloso para descobrir estas joias arquitetónicas e a sua história. Jerónimo Pedrero, que era professor do instituto local e que publicou vários artigos sobre estas construções, chegou mesmo a recenseá-las. “Em Tomelloso há cerca de 300 bombos segundo o censo que fiz no ano 97/98 ”, esclarece. Na verdade, no local onde fizemos esta reportagem, existem facilmente cerca de uma dezena de bombos, espalhados pelos dois lados da estrada.

Qual é a origem desta construção? “Os bombos são construções de pedra seca, ou seja, não têm nenhum tipo de argamassa ou cimento. A razão pela qual estas construções foram feitas é a sobrevivência: os agricultores, os que trabalhavam na vinha, longe do centro do concelho, numa altura em que não havia automóveis, usavam-nas como abrigo”, explica.

Para a construção utilizaram a mesma pedra que encontraram nos seus trabalhos no campo. “A pedra que os arados arrancavam a uma certa profundidade, chamadas lajes, acumularam-se nas redondezas e a certo momento, quando perceberam que tinham de proteger-se e abrigar-se utilizaram a única coisa que tinham para isso, aquelas mesmas pedras”. E como não havia árvores na zona, fizeram o telhado e cobertura com a mesma pedra, em forma de falsa abóboda.

São construções que, embora rudimentares, têm uma técnica apurada visto que ainda se encontram de pé muitos anos depois e, embora algumas tenham sofrido colapsos, a maioria permanece em perfeitas condições. 

A maioria das que vemos estão fechadas, embora originalmente nem tivessem porta. “No início não havia porta, não havia nada para guardar. Hoje em dia, os agricultores têm coisas lá dentro, mas no início não passava de um simples refúgio e os seus donos na verdade deixavam entrar os vizinhos quando vinham fazer um trabalho qualquer, para fazerem fogo ou se aquecerem se fosse necessário. Porque muitas dessas tarefas eram no inverno, com temperaturas muito baixas. Eles só colocavam algo na entrada, à noite, para evitar a passagem do vento ”, diz Pedrero.

A planta do bombo é circular. No interior, consoante as suas dimensões, existem diferentes divisões: a primeira, destinada à lareira e também para dormir à noite, e uma segunda divisão onde os animais se abrigavam. 

Na primeira dependência, como dizemos, era feito o fogo e ali estavam os bancos para descansar e algumas estacas cravadas nas paredes para pendurar as alfaias das tarefas agrícolas. “Os bombos eram escavados, tinham uma certa profundidade, para evitar a humidade no seu interior: uma das primeiras tarefas na construção é fazer uma espécie de vala, delimitando o perímetro, e escavar a certa profundidade”, detalha o historiador .

VÍDEO

Os primeiros bombos só tinham uma divisão, à qual se foi acrescentando uma segunda, para os animais, como o passar do tempo. E, finalmente, passou-se para três divisões, uma na entrada e duas nos fundos. Ou seja, passou de uma primeira construção que era mero refúgio para uma mais elaborada, “que já atendia a outras necessidades, dando maior conforto aos trabalhadores”, diz Pedrero.

Deve-se notar que os bombos, que foram construídos a partir da segunda metade do século XIX, são assim chamados nesta área (e seus construtores são conhecidos como "bombeiros"), mas não em outras partes de Espanha onde pode haver mais ou menos semelhantes com outros nomes, por exemplo. Este tipo de habitação existe noutras partes da península, e é verdade que Tomelloso reúne muitas, mas como se transmitiu esta forma de construir? Transumância, agricultores que se deslocavam de um lugar para outro. “Esse conhecimento foi transmitido entre famílias, vendo-as trabalhar, como um aprendiz comum, ajudando no trabalho. Nos dias de hoje perdeu-se e já não há ninguém ativo que o faça, lamenta o historiador.

Já não há necessidade de pernoitar no campo, e por isso muitos bombos ficaram em desuso e outros são mantidos por respeito a um património que muitas vezes escapa dos nossos dedos. Em 1968, a autarquia de Tomelloso pôs em marcha um projeto para a construção de um bombo com o objetivo de torná-lo numa peça de museu. 

A obra ficou a cargo de Pablo Moreno, considerado mestre do trabalho em pedra seca: na construção utilizou mais de dois milhões de pedras. Esse dito bombo foi inaugurado no final dos anos 1970, quase certamente um dos últimos a ser construído na cidade.

Continuamos a caminhar entre os bombos e chamam a atenção porque muitos têm uma ferradura por cima da entrada, em sinal de boa sorte e para afastar o azar. “Dizem que os bombos têm a sua magia, que se se tocar nas suas pedras, vai observar-se o que aconteceu lá dentro ”, despede-se Pedrero.

Não sabemos se são mágicas ou não, mas, de qualquer forma, são uma joia bem desenhada porque ali continuam, a ver as páginas do calendário passarem.

    
www.idealista.pt

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