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quarta-feira, 5 de fevereiro de 2020

Coronavírus | Nem oito nem oitenta



Jorge Rocha* | opinião

Por estes dias os noticiários televisivos têm, inevitavelmente, o coronavírus como tema de abertura. À falta de um caso positivo em Portugal, que leve ao paroxismo as ansiedades das audiências, repetem-se as escassas atualizações oriundas das lonjuras asiáticas, tantas vezes quantas as necessárias.

O sobressalto coletivo vai sendo alimentado por muito que a Organização Mundial de Saúde racionalize a situação com a evidência de não estarmos perante uma pandemia, que justifique tamanhos receios, entretanto traduzidos em formas mais ou menos óbvias de um estúpido racismo antichinês.

Com uma média de 2% de mortalidade no universo dos contaminados, o coronavírus está muito longe da perigosidade do Ébola que, regularmente, causa um número bem mais significativo de vítimas mortais no continente africano sem que os grandes laboratórios farmacêuticos invistam recursos suficientes para lhe encontrarem a cura. Este coronavírus acaba por revelar-se elucidativo quanto à desigual importância atribuída a ameaças à saúde pública, consoante se perspetivam maiores ou menores riscos para as populações do próspero Ocidente. Com os vírus, que provocam razias em África, mas não encontram condições de propagação nas latitudes situadas fora dos limites tropicais, a preocupação mingua-se.

Ademais, para as atuais linhas editoriais, influenciadas pelos tiques de Guerra Fria em que os chineses tomaram o lugar outrora conferido aos soviéticos, uma situação comprometedora para a grande potência económica emergente revela-se autêntico maná, alimentando - mesmo que por alguns dias! - a inconfessada esperança de se manter inalterada a relação de forças atual, com os Estados Unidos a manterem-se como farol de referência do capitalismo selvagem. Mesmo que adivinhemos a facilidade com que esses mesmos diretores de «informação se renderão novamente aos encantos dos capitalistas chineses, se forem eles a melhor lhes garantirem o adiamento do previsível dia em que nenhuma recauchutagem desesperada conseguirá remendar o que já, há muito, se afigura condenado pela dialética evolução das sociedades futuras...




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