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domingo, 28 de fevereiro de 2021

ESPECIAL - NO DIA EM QUE O GLORIOSO SLBENFICA COMEMORA 117 ANOS DE EXISTÊNCIA EIS UM POUCO DA SUA HISTÓRIA

 




Os primeiros tempos...

1904 a 1960

vídeo


115 Anos: O Percurso de Vida Para 24 Idealistas

NESTE DIA EM QUE CELEBRAMOS A FUNDAÇÃO.



Comemoramos o colectivo. A consumação de uma Ideia que depois se transformou num Ideal generoso e de superação.



Em tempos...há dois anos
Foi possível saber que os 24 fundadores eram muito jovens, com uma média de 20 anos . Apesar dessa juventude, os 24 Fundadores souberam - por amor a essa Ideia original e inovadora - "fazer um team só com portugueses" juntando miúdos do bairro de Belém sedentos de vitórias com um grupo de casapianos veteranos "bons de bola".



Agora é possível perceber o seu percurso de vida
Com uma investigação notável Victor João Carocha conseguiu balizar o percurso de vida da maioria dos Fundadores. Para já passamos a conhecer o tempo que cada um viveu antes e depois do "Glorioso" nascer nesse Dia do Ideal Solidário (24 pares entre pares), sem protagonismos de um sobre os outros, com escolhas democráticas que iriam ser um dos pilares do Benfica para sustentar uma Glória Imorredoira.


O que dá mais prazer nestas descobertas
Além de resgatar para a memória colectiva, esses 24 pioneiros, ou seja, como escreveu Luís de Camões "libertá-los da morte" que tudo faz esquecer, é também perceber que quase todos tiveram uma vida biológica que lhes permitiu perceber que aquele gesto na Farmácia Franco não foi efémero, muito menos episódico. A maioria viveu para ter a noção que a fundação do Clube, teve um significado amplo e grandioso. Ao reunirem-se e fundarem o Clube iniciaram a vida do maior e mais popular clube português e um dos mais notáveis no Futebol Mundial. E perceberam ao longo das suas vidas que isso estava a ser uma realidade.

Quase todos viram o Benfica fazer o primeiro TRI
No campeonato nacional entre 1935/36 e 1937/38. Bem como a primeira «dobradinha», em 1942/43. Todos viram o Benfica ser altaneiro no futebol português, com oito títulos de campeão regional em onze temporadas (1909/10 a 1919/20). Viram o Benfica "só com portugueses" derrotar os ingleses do Carcavellos Club, em 1907, 1910 e 1911. Quase metade viu a conquista da Taça Latina (1950) e houve ainda quem visse que partindo-se de um pequeno grupo que dava para fazer treinos jogados de onze contra onze, o Clube chegou à Glória de se sagrar Bicampeão Europeu, em 1960/61 e 1961/62. Que orgulho não devem ter tido.


HISTÓRIA DO SPORT LISBOA E BENFICA 1904/1954; MÁRIO DE OLIVEIRA E REBELO DA SILVA; I VOLUME, 1.º FASCÍCULO; PÁGINA 13; LISBOA, JANEIRO 1954; EDIÇÃO DOS AUTORES


O tempo justificou na perfeição os trabalhos e canseiras de carregar barrotes e redes, regadores e cal, bandeirolas e cordas com o rectângulo de jogo definido para marcar terrenos públicos, em Belém, para poderem jogar e treinar. De modo algum foi incómodo e inadequado, face aos meios existentes, a necessidade inicial de partilhar as Gloriosas camisolas já suadas do jogo anterior, de se equiparem ao ar livre e de tomarem banhos improvisados com um balde de água fria deitado sobre as suas cabeças. Tempos difíceis, só suportáveis por Homens de rija têmpera, acima de tudo crentes naquele Ideal generoso e de superação.

Vinte e quatro indomáveis legaram a milhões um Clube com classe e irascível em nunca desistir, de não querer nunca perder ou sequer empatar. Um Clube que sabe ganhar e reconhecer a superioridade do adversário na derrota mas com isso aprende para depois os vencer na desforra (jogo seguinte).

No seu túmulo, os 24 Fundadores descansam para a eternidade, credores perenes do carinho e reconhecimento dos actuais Benfiquistas e daqueles que hão-de vir. Sabemos agora onde a maioria repousa.




HOMENAGEM





Titularidade na primeira época, indiscutível na segunda
Depois de se estrear na equipa principal (20 de Setembro de 1936) e de ser um dos pilares da conquista do Bicampeonato Nacional em 1936/37 (totalista nas 14 jornadas com 16 golos) a segunda temporada – 1937/38 - com o “Manto Sagrado” foi arrasadora. O “Glorioso” jogou 39 encontros, com 3 510 minutos. Guilherme Espírito Santo jogou 37 (3 330 minutos). Apenas esteve ausente em dois encontros, ambos já próximos do final da temporada: em 1 de Maio de 1938 num jogo particular, no nosso estádio das Amoreiras, com o Luso FC Barreiro (V 7-1); e em 22 de Maio de 1938 na 2.ª mão dos oitavos-de-final do Campeonato de Portugal (actual Taça de Portugal) no empate (1-1) no campo do União Futebol Lisboa, depois de 3-0 na 1.ª mão (Espírito Santo marcou um golo).

Estreia como internacional aos 18 anos e 29 dias
Depois de tanta qualidade e quantidade (golos) Guilherme Espírito Santo foi seleccionado para representar Portugal. A estreia ocorreu, menos de um mês depois de ter completado 18 anos (a maioridade era aos 21 anos), em 28 de Novembro de 1938, entrando ao intervalo para uma vitória histórica, por 2-1. A estreia a marcar foi no jogo seguinte, com a Hungria, em 9 de Janeiro de 1939. Tinha 18 anos, 2 meses e 10 dias.
  
28 de Novembro de 1937. Estádio dos Balaídos, em Vigo. XIII Espanha - Portugal. Uma equipa capitaneada por Gustavo Teixeira (do SLB) onde jogavam mais quatro benfiquistas: Gaspar Pinto, Albino, Valadas (marcou o 2.º golo) e Guilherme Espírito Santo. Gaspar, Gustavo e Albino - por esta ordem - estão em pé ao lado do seleccionador Cândido Oliveira (casaco castanho e laço no pescoço). Valadas e Espírito Santo estão em baixo, os dois primeiros a contar da direita

Nove golos em… 52 minutos
Em 5 de Dezembro de 1938, há 74 anos, na 8.ª jornada do campeonato regional de Lisboa, o Benfica recebeu, no Estádio das Amoreiras, a equipa do Casa Pia AC, vencendo por 13-1 com Espírito Santo a marcar 9 golos, recorde de um futebolista do Benfica num jogo da equipa principal (se é que no Benfica não são todas equipas principais). E o Benfica até começou a perder, aos 6 minutos. E só aos 38 minutos conseguiu empatar, através de Espírito Santo. Depois seguiram-se mais 11 golos, com oito de Espírito Santo (39’, 49’, 54’, 60’, 82’, 83’, 84’ e 89 minutos. Contava ele que, um defesa casapiano a meio do segundo tempo questionava porque não parava ele de marcar a uma equipa onde tinha tantos amigos. Guilherme Espírito Santo pacatamente, encolheu os ombros dizendo: “Eu nem procuro a bola, elas aparecem-me à frente!”.




Lá no 4.º anel continuará orgulhoso pelo “seu/ nosso” Benfica

Alberto Miguéns

NOTA: Estes apontamentos são possíveis por que resultam de muitas horas de conversa franca e amiga, durante mais de década e meia, entre um adepto do Benfica e esta Glória do Clube. Um enorme futebolista e personalidade fantástica, que era o paradigma do Jogador e do Benfiquista: simples, virtuoso, trabalhador, dedicado e generoso. Só posso estar agradecido, por ter aprendido tanto com Espírito Santo.


O Benfiquismo é Assim






 Um leitor deste blogue enviou-me a digitalização da História do Clube, publicada aquando das Bodas de Ouro, em 1954, do Sport Lisboa e Benfica. Em termos digitais esta é uma história do Clube tripartida: Mário de Oliveira/Rebelo da Silva/Miguel Amaral.


EIS AQUI A MONUMENTAL HISTÓRIA DOS PRIMEIROS CINQUENTA ANOS DO GLORIOSO

Link do PDF para transferir para o seu computador


Há muito que se encontra esgotada e é uma obra monumental

Elaborada por dois Benfiquistas, à sua custa (foi edição de autor) publicada em fascículos mensais depois encadernados - capas também vendidas - após cada série de fascículos - eu ainda consegui comprar no início dos anos 80 numa livraria localizada na avenida da Igreja, talvez com o nome de "Multinova". Ou seja, uma parte dos fascículos encadernados em dois volumes sobreviveu-lhes. Para grandeza do Clube e deleite dos Benfiquistas.

 

Aquando da criação do Centro de Documentação do Benfica

Proposto aqui por quem está a escrever este texto, numa reunião, em Abril ou Maio de 2009 (antes da campanha eleitoral para 2009, pois a criação de um Museu faria parte do programa de Luís Filipe Vieira), estando presentes entre outros Domingos Soares de Oliveira, Alcino António e António Ferreira. Indiquei que um Centro de Documentação seria fundamental para a ideia de se construir o Museu, podendo ter várias funções. Uma das valências que indiquei foi disponibilizar documentação que se iria digitalizar "não classificada", ou seja, publicações que são públicas como jornais, livros, "Relatórios e Contas", várias revisões dos Estatutos e Regulamentos Gerais, por exemplo, aos associados. Nunca o quiseram fazer. O objectivo da minha proposta era reunir documentação, preservá-la, mas também dar a conhecer a grandeza do Clube, facilitar as pesquisas a quem as quisesse fazer e respeitar os associados pois se estes pagam devem ter direito a ter acesso (e facilitado) a documentação do Clube que está disponível noutros locais, como Bibliotecas e Hemerotecas. Recusaram sempre no sentido de não quererem que alguém saiba mais do que eles que têm o acesso privilegiado, quando esses eles nem querem saber dessas publicações para nada, a não ser, que tenham que fazer algum trabalho que os obrigue a ler. Muito me custou mas «manda quem pode, obedece quem deve».


O ideal seria ter acesso a muito mais documentos

Este blogue sempre que é possível vai disponibilizando lamentando não  poder ceder mais informação histórica. Resta agradecer a generosidade dos Benfiquistas que têm consideração para com o blogue e enviam o que têm. Obrigado.

 

Agora, pelo menos, este documento que até é globalmente o melhor

Pois está estruturado como uma história cronológica ficará disponível aqui no blogue para quem o quiser consultar e estudar. É também uma forma de homenagear os dois autores - Mário Fernando de Oliveira e Carlos Rebelo da Silva - que tanto tempo ocuparam, tantas viagens fizeram, tanto documentação leram para que os vindouros soubessem como nasceu e cresceu o Clube que amamos e eles também. Obrigado aos dois.

 

Claro que eu só disponibilizo o blogue

O trabalho de digitalizar as quase 1200 páginas foi de um Benfiquista que sabe interpretar o Benfiquismo. Partilha. 

Não o conheço pessoalmente pois recebi a nossa monumental história via correio electrónico. Ele nem estará interessado em que se saiba quem é, mas não posso deixar de aqui colocar o nome - Miguel Amaral - pois será útil para todos, até para mim visto que os meus volumes com tantas digitalizações já não estão lá em muito bom estado físico e agora podem ter o merecido descanso.  

 

Que seja útil para quem gosta de perceber como surgiu o Clube

E o porquê de se ter erguido bem alto superando os outros. Quem ler esta história perceberá com facilidade que foi o modo como se organizou e desenvolveu o Benfica que permitiu fazer dele a referência do desporto em Portugal. E nem foi necessário estar a fazer comparações com outros clubes. Os autores apenas mostram e ilustram como se tomaram as decisões e como elas tiveram impacte no crescimento sustentado do Clube. Eis um romance apaixonante, escrito por dois apaixonados para quem tem paixão pelo Benfica.

 

É isto o Benfiquismo. Partilha. Generosidade.

 

Alberto Miguéns


1904 Não é 1908. Vocês Sabem Do Que Eu Estou a Fala







DESDE QUE CONHEÇO A GLORIOSA HISTÓRIA QUE NUNCA TIVE DÚVIDAS ACERCA DO ANO DA FUNDAÇÃO: 28 DE FEVEREIRO DE 1904.


Agora ao ter que reler e juntar “materiais” nunca pensei ser tão fácil provar aos leigos e cépticos. Como penso que se vai comprovar no texto seguinte.

NOTA INICIAL: A complexidade do texto (explicações) e encaixe das digitalizações não permitem ter o texto completa pela meia-noite, mas como está o essencial decidi manter a edição. Vou continuar a "trabalhar nele" até me dar por satisfeito. ESTÁ FEITO! Quatro da matina!

Parte I: Como se chegou a 1908
Em 13 de Setembro de 1908 chegou-se a um tempo em que duas colectividades viviam dias difíceis. Uma porque tinha excelente superestrutura – boas equipas de futebol - mas não tinha campo nem dirigentes com tempo para se preocuparem muito em arranjá-lo nem paciência com burocracias e “papeladas”. Até a Sede era um quarto tão minúsculo que tinham de ter um armazém para guardarem os apetrechos dos jogos pois treinavam e jogavam em terrenos públicos. Queriam era jogar futebol. Era o Grupo Sport Lisboa (GSL ou SL). Outra colectividade tinha infraestruturas acima da média em Lisboa – campo de jogos na Feiteira e um bom grupo de dirigentes, tal como uma Sede espaçosa e condigna mas que vira todas as tentativas fracassadas em conseguir atrair futebolistas, de outros clubes, com categoria. Era o Grupo Sport Benfica, depois Sport Clube de Benfica (GSB ou SCB). Nada como dar a palavra a quem viveu esses dias – Luís Joaquim Gato - desde a sua entrada para associado do GSB, em 26 de Julho de 1907, até falecer, em 17 de Maio de 1979, como associado n.º 1 do Sport Lisboa e Benfica! 


1903/04: Grupo Sport Lisboa
O Grupo Sport Lisboa foi fundado, em 28 de Fevereiro de 1904. Pensado desde o início de Dezembro de 1903 foi escolhido o último domingo de Fevereiro para fundar o Clube. Ao final da manhã realizou-se um treino, com 10 elementos, nas traseiras da quinta de Praia do Duque de Loulé, alguns almoçaram/confraternizaram no António das Caldeiradas ou no Café do Gonçalves. Mesmo do outro lado da rua, em frente, deste último estabelecimento ficava a Farmácia Franco o local indicado, para nessa tarde 24 associados, fundarem o Clube e instalar provisoriamente a Sede até porque os dirigentes escolhidos (Gourlade: tesoureiro e Daniel Brito: secretário) trabalhavam na Farmácia e o principal núcleo de jogadores, os Rosa Rodrigues - José, Cândido e António - viviam no mesmo prédio, incluindo o presidente escolhido: José Rosa Rodrigues. NOTA: Não vou colocar o documento do treino com apontamentos de Manuel Gourlade e a lista de nomes elaborada por Cosme Damião porque são documentos fáceis de encontrar neste blogue.


1904/05: Grupo Sport Lisboa
Depois de um ano (1904) a treinar e a congregar cada vez mais associados-futebolistas, alguns com muita experiência por serem casapianos que jogavam já com muita qualidade há mais de uma década e sem haver qualquer tipo de segregação ou preconceito (riqueza, etnia ou ideologia) só havia duas condições: serem portugueses (nascidos em Portugal) e jogarem bem ou tudo fazerem para aprender a jogar bem futebol. O GSL conseguia com um ano de existência ter duas boas equipas e apresentava mesmo um terceiro grupo, ou seja, movimentava cerca de 50 associados. A dificuldade eram os treinos e jogos, pois tinham de partilhar o local com outras entidades por ser um logradouro público: as Terras do Desembargador, às Salésias. E sendo um terreiro público tinham de montar e desmontar os apetrechos do jogo a cada treino e a cada encontro. Mas as “flanelas vermelhas” (camisolas) e calções brancos cedo começaram a ter fama pois derrotaram na primeira temporada dois dos emblemas que eram considerados os melhores clubes de Lisboa com base em portugueses: o Grupo do Campo de Ourique e o Internacional/CIF, este com ingleses amigos dos Pinto Basto.


1905/06: Sport Lisboa
Na segunda temporada a popularidade do Clube permitiu-lhe jogar frente aos ingleses do Lisbon CC, na Cruz Quebrada. Uma proeza, pois permitiu a participação no primeiro torneio devidamente organizado em Portugal. Curiosamente o clube era muito popular mas nunca foi apenas designado por um nome - Lisboa, por exemplo. Deixou-se "cair" o Grupo, mas era o Sport Lisboa. Tal como o Foot-Ball Cruz Negra que era o Cruz Negra. Todos os outros tendo "vários nomes no nome" eram reduzidos a um: Carcavellos (CC&FC), Lisbon (LCC), Internacional (CIF), etecetra. Mas o SL continuava a debater-se com o problema de não ter um campo privativo, ao contrário de todos os outros com excepção para o Cruz Negra, que jogava também num terreno público, no Largo da Luz. Por isso teve vida curta e morte prematura. O Sport Lisboa já tinha tanta fama que foi aceite para jogar, em Carcavelos, algo difícil entre finais do século XIX e início do século XX, pois os ingleses do Cabo Sumarino só aceitavam receber clubes que tivessem a fama de fazerem encontros “renhidos”! Afinal o SL teve mais fama que proveito, pois perdeu por…0-7!


1906/07: Sport Lisboa e Grupo Sport Benfica
Entretanto, o Sport Lisboa ia cimentando a sua fama que culminaria, em 10 de Fevereiro de 1907, quando foi vencer os invencíveis ingleses de Carcavelos em plena Quinta Nova. E até se enganaram no comboio descendo em Paço de Arcos e fazendo o resto do percurso a pé. Conta-se que um dos jogadores da 2.ª categoria, criador da divisa “E Pluribus Unum”, espectactor indefectível e depois dramaturgo famoso logo arranjou cognome: Gloriosíssimo! Mesmo a continuarem de balizas às costas. 
Muito longe de Belém, mais a norte fundava-se um clube, tal como floresciam noutros locais da cidade inúmeras colectividades desportivas na ânsia de se afamarem no Futebol. Em Benfica, a 26 de Julho de 1906, era fundado o Grupo Sport Benfica. Clube muito bem organizado, com associados endinheirados entre a burguesia comercial do bairro e alguma aristocracia rural das quintas de Benfica que ocupavam 95 por cento de território no vasto Termo de Lisboa. Mas o Verão foi penoso para o Sport Lisboa. "Fartos" das balizas às costas e com condições precárias para se equiparem, treinarem e jogarem dá-se a debandada dos melhores futebolistas para outros clubes. A maior parte para o Sporting CP - que tinha boas infraestruturas mas fracos futebolistas - mas também para outros emblemas como o Foot-Ball Cruz Negra.


1907/08: Sport Lisboa e Sport Clube de Benfica
Em Belém, o Sport Lisboa tem de usar uma solução de recurso para não se extinguir. Como a 2.ª categoria era praticamente imbatível, um dos seus futebolistas - Marcolino Bragança - tem uma ideia genial. Porque não inscrever este grupo de futebolistas da 2.ª categoria em 1906/07 no campeonato da 1.ª categoria da temporada seguinte, em 1907/08? E assim foi! O Sport Lisboa acabara de resistir para todo o sempre. Mas todos tinham a consciência que a situação era precária. Ter um campo privativo, uma Sede condigna e uma boa organização administrativa era fundamental O Sport Lisboa podia aguentar mais uma ou duas temporadas mas estaria condenado. Em termos de Futebol é que nada mudara. Reorganizado o Clube em final de 1908 já havia, novamente, três boas equipas - 1.ª, 2.ª e 3.ª categorias - bem como até um 4.º grupo. Cerca de 70 futebolistas em actividade para um clube que um ano antes quase terminara!
Entretanto, em Benfica, continuavam os melhoramentos na Quinta da Feiteira, até com uma Sede nova. Havia muita actividade - mais recreativa que desportiva - baseada no ciclismo e o atletismo, embora neste uma equipa do clube fizesse sucesso ao conquistar a I Maratona Nacional (20 de Outubro de 1907), Mas...continuava era a faltar o Futebol. E um clube sem futebol "não vai longe". O Clube teve tão grande progresso que alterou a designação de Grupo Sport Benfica para Sport Club de Benfica, em 1 de Março de 1908. E presume-se que a sigla do emblema também, embora pouco se saiba - ainda - disso! NOTA: Nem o emblema era bicolor (preto e branco) pois decerto que era muito mais colorido. Só quem não tinha imaginação - eu nunca vi emblemas ou brasões sem serem muito coloridos - fazia emblemas como que a adivinhar as fotocópias de cem anos depois!




O Grupo (depois Sport) Clube de Benfica e o Futebol

Desde o seu início que os dirigentes procuraram atrair futebolistas mas essa tarefa revelou-se hercúlea. Havia quem desse pontapés numa bola, mas jogar Futebol era mais complicado. Persistentes nunca viraram à cara às dificuldades. A prova está em que o nosso guarda-redes João Persónio (embora não fosse associado do clube de Benfica) chegou a ser instrutor de futebol. Cosme Damião (entre outros futebolistas do Sport Lisboa) inscreveu-se como associado embora mais para participar nas faustosas festas que o clube tinha fama de saber organizar.



Parte II: Setembro de 1908
Na História do Benfica 1904/1954, está publicada uma acta (a n.º 93, de 2 de Setembro de 1908) que é fundamental - pois é o pilar do que se passou em 1908 - mas infelizmente no citado livro publicado entre 1954 e 1956 - falta-lhe a parte final (o original está numa vitrina do Museu semi-aberta ou semi-fechada, não permitindo a leitura que devia ser obrigatória). Restam as notas de Mário de Oliveira e Rebelo da Silva acerca do que está escrito na parte final - que por motivos de extensão da acta - não cabia numa coluna de uma página - devem ter decidido cortá-la no livro dos 50 anos). Mas chamo à atenção que a palavra junção aparece referida NOVE vezes e a palavra fusão nem uma! E não foi por acaso como vou demonstrar ao publicar a seguir a acta n.º 94 (4 de Setembro de 1908). Aliás a n.º 95 (13 de Setembro de 1908) e n.º 96 (16 de Setembro de 1908) que nunca foram tornadas públicas também são importantes para perceber o porquê dos clubes não perderem a sua individualidade e terem como data de referência para a fundação: 28 de Fevereiro de 1904.


(clicar em cima da imagem para obter uma melhor visualização)


Os artigos 7.º e 8.º não foram aceites, bem como o nome
O artigo 7.º (emblema) seria depois outro, ao justapor o emblema do Sport Lisboa sobre o emblema do Sport Clube de Benfica. Diz-se que uma ideia de Luís Carlos de Faria Leal (dirigente do Sport Clube de Benfica);
O artigo 8.º (equipamento) foi recusado por Félix Bermudes (do Sport Lisboa) e esta recusa acabou aceite pelos dirigentes do SCB que perceberam que as "flanelas vermelhas" já tinham um valor muito grande. Eram gloriosíssimas por conseguirem derrotar os invencíveis do Cabo Submarino;
O nome inicial proposto pelo SCB foi recusado pelo SL mas a sugestão de Félix Bermudes acabou aceite pelos dirigentes do SCB quando ao lermos a acta anterior, n.º 93, parece que não iriam ceder no nome visto ser tão importante para eles.



Junção não é fusão
Quer queiram quer não, já o expliquei há uns dias (clicar). Quem esteve envolvido nos acontecimentos de 13 de Setembro de 1908 sempre foi peremptório. Todos os anos após 1908, com destaque para 1929 (ainda Cosme da Damião e quase todos estavam vivos), 1954 (com destaque para Luís Carlos de Faria Leal) e mesmo em 1979 (com Luís Joaquim Gato)! O Clube foi fundado em 1904, porque foi decidido em 1908 e porque essa decisão é imutável. NOTA: Mesmo para quem entenda que não tem lógica.

Parte III: Depois de 1908
É a Lenda Universal do Futebol. Benfica! Conhecido em todos os "quatro cantos do Mundo". A junção foi um êxito, sempre com o vogal e depois vice-presidente Cosme Damião a liderar o futebol até 1926. Depois de 1926 coube a António Ribeiro dos Reis essa tarefa. Esta "tradição de 1908" manteve-se praticamente intacta até Manuel Vilarinho (2000/2003). Havia sempre um vice-presidente para o Futebol em todas as direcções. Origem: teimosia de Félix Bermudes e Cosme Damião em não deixarem os de Benfica meterem-se naquilo que não sabiam: "atrapalhar" a organização do Glorioso Futebol. Se havia dúvidas de quanto duraria o projecto a que todos se dedicaram, em 1908, para que tivesse sucesso, hoje estamos cá nós, em 2017 pelo menos, para dizer que resultou em pleno. E só temos que lhes agradecer. Foram inteligentes e quem beneficiou disso foram as gerações futuras de milhões de Benfiquistas. 


Parte IV: Bodas de Prata (1929)
O Clube nunca foi muito de comemorar publicamente os aniversários. Aproveitava-se mais dos finais de temporada para homenagear as equipas vencedoras. Sempre um Benfica com cunho colectivo. A sublinhar mais o todo que as partes. Há no entanto notícias esparsas em jornais, mas que são esporádicas. Nenhum ou mais que um ou dois jornais diferentes por ano. Não faz sentido trazer essas Notas de Imprensa para este texto. Em 1922 (no 18.º aniversário) houve amplas comemorações. Mas a primeira grande utilização dos jornais para mostrar a grandeza do Clube e estes para mostrarem a imponência de um emblema bem português foi em 1929, nas "Bodas de Prata" do Benfica! Com cerca de 80 por cento dos 304 associados existentes, em 13 de Setembro de 1908, ainda entre nós, 21 anos depois! E podem ser mais, pois há alguns de que não sei - ainda não sei - a data de falecimento! Toda a Imprensa, generalista ou desportiva, lisboeta ou de outra localidade referiu-se ao 25.º aniversário do SLB como um acontecimento nacional, o que ilustra a importância desportiva, mas também social, do Clube. Apenas com duas décadas e meia de existência mas muitas vitórias e recordes! Eis alguns exemplos, se bem que a melhor é a reportagem de "O Sport de Lisboa" que está em pdf´s consultáveis a partir deste blogue.



Para que não haja dúvidas ver estes pdf´s do jornal "O Sport de Lisboa" desse tempo: 31 de Março de 1929 (clicar)




Comemorações tardias e tardiamente
O Benfica poucas vezes comemorou os aniversários até 1929 e mesmo depois. E sempre tardiamente em relação a 28 de Fevereiro. Até nas Bodas de Oiro, em 1954, já com os primeiros fascículos da História do Clube 1904 -1954 editados desde Janeiro (com a lista de nomes feita por Cosme Damião publicada no primeiro fascículo) as comemorações foram em Maio de 1954. A justificação que sempre ouvi foi a de que o mês de Fevereiro ou mesmo início de Março eram meses arriscados devido à maior probabilidade de estar mau tempo: frio e chuva, diminuindo as hipóteses de ter comemorações bem compostas e com condições atmosféricas adequadas para as várias modalidades se poderem exibir. Nesse tempo tudo ao ar livre, em campos/estádios sem coberturas.

(clicar em cima da imagem para obter uma melhor visualização)



Ainda havia "gente de 1908" viva e recomendável em 1 de Dezembro de 1954
E felizmente , embora já em menor número, dos três associados mais antigos do Clube em 1954, dois que estiveram na decisão em 1908, continuavam entre nós na inauguração da "Saudosa Catedral" em 1 de Dezembro de 1954 (clicar)

"Endrominanço"
Como é fácil de demonstrar esta notícia é uma falácia. Um engano do redactor ou um erro tipográfico. Se o SLB fosse fundado em 1908 assinalaria os dois anos de existência em 1910. (clicarAssinalar o 4.º aniversário em 1910 era recuar até 1906. Data da fundação do Grupo Sport Benfica, mas que protagonizou uma junção com o Sport Lisboa, em 1908. A menos que os que se fazem passar por cépticos e "puristas" fervorosos de 1908, não aceitem 1904 mas já aceitem 1906. Porque assim o Sporting CP seria uns diazinhos mais antigo que o SLB!



Honrar os nossos de 1908
Esta foto e legenda/texto foram publicadas aquando da inauguração da "Saudosa Catedral" em 1 de Dezembro de 1954. Como se pode constatar comparando a legenda com o cabeçalho da acta que define a junção 46 anos atrás - em 1908 - ainda estavam vivos dois deles. Até parece que foi de propósito para honrar este meu texto a propósito deles, das suas decisões de 1908. Não acredito que haja um Benfiquista - falo de Benfiquistas, não de benfiQuistos, benfiquenses ou benfiqueiros - que queiram traí-los hoje ou amanhã só porque eles já cá não estão para se defender e defender a sua Ideia de 1908. Seria traição à sua memória. Isso eu não faço e nunca permitirei que se faça. A minha arma para isso? O teclado de um computador!



Se houvesse dúvidas basta ler esta entrevista para perceber que o clube é de 1904
Luís Carlos de Faria Leal por ser dirigente do Sport Clube de Benfica esteve presente em todas as reuniões que permitiram a junção. Ele foi explícito em 1954: «Quando há 50 anos formamos um Clube, nunca pensamos que hoje pudéssemos assistir a tão grande espectáculo». Não chega!?



A Imprensa portuguesa e as trapalhadas de trocarem nomes:


Ou de evitarem não indicando os nomes:



Eis um exemplo de sermos duplamente felizes enquanto Benfiquistas:
1. Termos uma história transparente por isso Gloriosa;
2. Sabermos que devido á dedicação (poucos desistiram) alguns dos nossos pioneiros ainda viram grandes realizações desse minúsculo clube que um dia criaram ou ajudaram a engrandecer. No caso de Faria Leal viu o Benfica dominar o Campeonato de Lisboa nos anos dez, ser TRI entre 1935/36 e 1937/38, conquistar a Taça Latina em 1950 e desfilou na "Saudosa Catedral" em 1 de Dezembro de 1954 num estádio para 30 mil pessoas. Ele que vira as "flanelas vermelhas" andarem de baliza às costas. Faleceu em 18 de Agosto de 1956 com a noção, como Benfiquista, de dever cumprido!


O Benfica é assim. Quem é ama e sabe ou quer saber mais. Quem não é odeia e não quer saber mais. Prefere viver com dogmas


Alberto Miguéns


COMO É EVIDENTE TRATA-SE DE UMA SIMPLIFICAÇÃO. É IMPOSSÍVEL DATAR O INÍCIO DAQUILO QUE SE FOI IMPLANTANDO COM O DESENVOLVIMENTO DO CLUBE.




O que se trata é do dia (28 de Outubro de 1911) da publicação no jornal "Os Sports Illustrados" de uma entrevista a Cosme Damião onde este traçou os caminhos da modernidade para o Clube. Princípios teóricos, pensados e amadurecidos mas que levou à prática. Grande Cosme Damião. No final umas breves notas de resumo das ideias dele e da consumação de Ideal. O principal é deleitarmo-nos com o modo como ele Benficou pela primeira vez.



Esta que eu conheça é a quinta entrevista a Cosme Damião desde 1904. Em sete anos cinco entrevistas, algumas curtas, mas esta tem uma "espessura" imponente. Depois desta conheço-lhe mais sete com destaque para a última, publicada em 5 de Março de 1945 no jornal "A Bola" n.º 11. Por motivos diferentes são as duas grandes entrevistas - não só em tamanho - ao nosso Pai Benfiquista. A de 1945 é sobejamente conhecida e fez com que o entrevistador, o jornalista Mário de Oliveira, percebesse que estava no tempo certo para pesquisar e escrever a História do Clube. Esta em 1911 é importante a outro nível. Marca a fronteira entre o que era mais um clube e como transformariam os Benfiquistas um clube em "O Clube" de Portugal e dos portugueses. Vejamos as ideias principais e como/quando foram concretizadas. Cosme Damião não era de dizer e não fazer.

NOTA: Só agora é que me apercebi que tinha este texto programado há vários meses mas... incompleto. A derrota irritou-me tanto que fez esquecer esta efeméride. Peço desculpa mas vou terminar. Daqui a uma hora estará concluído. São 00:48 horas da matina. Penso que tendo, pelo menos, 20 notas finais estas estarão concluídas. Boas leituras!

01. O Benfica (Clube) necessitava de deixar um bairro periférico (Benfica) para instalar-se no centro da cidade onde era popular e necessitava de aumentar a acessibilidade à sua Sede;

02. O Benfica (Futebol) projectava viagens ao estrangeiro e colaborar com iniciativas para trazer a Lisboa grandes equipas de clubes afamados para que os futebolistas percebessem as cambiantes tácticas e a importância da forma física para marcar golos, vencer jogos e conquistar títulos e prestígio;

03. O Benfica (Clube) desejava ter delegações nos locais onde tradicionalmente "recrutava" os futebolistas - Belém/Casa Pia de Lisboa e Benfica - e onde continuava a ter um número elevado - e sempre em expansão - de associados;

04. O Benfica (Futebol) era cada vez mais ambicioso não descurando o imediato em detrimento dos projectos para o Futuro;

05. O Benfica (Clube) aproveitava os futebolistas/dirigentes que por motivos essencialmente profissionais (mas também familiares) deixavam Lisboa rumando aos quatro cantos do País para aí instalar as futuras Filiais do Clube;

06. O Benfica (Futebol) tinha a ambição de premiar a assiduidade e capacidade de esforço daqueles que engrandeciam o Clube elevando-os a Sócios de Mérito entre outras distinções;

07. O Benfica (Clube) queria estar na vanguarda do desporto não sendo só um clube de futebol mas sim uma agremiação desportiva a praticar todos os desportos a que os associados quisessem aderir;

08. O Benfica (Instituição) queria ser uma força social organizando actividades muito para lá do âmbito desportivo;

09. O Benfica (Clube) desejava melhorar as suas infraestruturas desportivas para optimizar as condições de excelência para que os futebolistas e demais atletas pudessem evoluir e conseguir honrar cada vez mais e melhor a Instituição;

10. O Benfica (Formação/Futebol) dando importância ao "grupo infantil" sendo pioneiro ao separar os jovens dos veteranos que era o que ocorria muitas vezes na quarta categoria: jogarem miúdos de 16 anos com homens com 45;

11. O Benfica (Instituição) passar para a vanguarda da inovação e desenvolvimento das associações desportivas em Portugal;

12. O Benfica (Formação/Sócios) tentando que os associados revelassem alguma aptidão para determinada modalidade de modo a representarem o clube em competições desportivas;

13. O Benfica (Instituição) dispondo-se mesmo a organizar competições e provas substituindo e complementando as entidades oficiais;

14. O Benfica (Futebol) já tinha efectuado o primeiro jogo internacional, frente ao Stade Bordelais Université Club, em 22 de Maio de 1911;

15. O Benfica (Clube) já tinha uma Filial, organizada em Portalegre pelo valoroso futebolista Leopoldo Mocho, o Sport Lisboa e Portalegre, em 18 de Julho de 1911;

16. O Benfica (Futebol) desloca-se pela primeira vez, em 28 de Abril de 1912, para longe de Lisboa, jogando no campo da rua da Rainha, frente ao FC Porto, com dupla vitória: 8-2 (primeira categoria) e 2-1 (segunda categoria);

17. O Benfica (Futebol) joga pela primeira vez no estrangeiro, na Corunha, em 22 de Junho de 1912;

18. O Benfica (Clube) em 1 de Agosto de 1912 instala-se no segundo andar esquerdo do número 30 do Rossio (Praça D. Pedro IV) onde está na actualidade o Hotel Metrópole. É o quarto n.º 206; 

19. O Benfica (Instituição) teria um jornal "O Sport Lisboa" cujo primeiro número foi publicado em 24 de Agosto de 1913;

20. O Benfica (Clube) inaugura o novo campo de jogos, na Quinta Nova, em Sete Rios, a 12 de Outubro de 1913.


Obrigado, Pai Benfiquista!

Alberto Miguéns

https://em-defesa-do-benfica.blogspot.com/

A LIGA SALAZAR


A Liga Salazar
Já não bastava a campanha merdiática do colinho, agora os nossos adversários condimentam-na ainda mais, ao denominar a Liga como a Liga Salazar. Desrespeitam inclusivamente o patrocinador oficial, o que nem isso leva ao Proenca a intervir quando quem fala, não é alguém do Benfica (tudo bem, mantém a lógica de quando apitava).

Uma da maiores mentiras contadas nos meandros da bola é a ligação benfiquista ao regime salazarista. Basicamente, a premissa é que quando o Benfica ganhava tudo a partir dos anos 60, só o conseguia porque tinha o apoio do regime por trás. De certa forma, fizemos o mesmo quando associamos as vitórias do Porto apenas aos árbitros, e quando demos por ela, o Porto dominava a toda a linha e obteve imensas vitórias no exterior. E fazem agora novamente os nossos adversários com o mito do colinho. Ou seja, quando não se ganha, há que arranjar desculpas.
A diferença nesta alusão a Salazar, é que esta é uma situação passada, numa altura que até o Pinto da Costa era um catraio, se calhar nem isso. Porque duvido sequer que 99% dos animais que foram ao centro de estágio da Maia e que destilam ódio nas redes sociais, saibam sequer o que foi o Estado Novo.

Na verdade, a historia foi algo inversa: como o Benfica ganhava tudo, inclusivamente no exterior, então o regime tinha que se associar aos êxitos do Benfica, para se confundir com os mesmos. Como em qualquer regime fascista ou totalitário, nenhum governo pode ser associado a causas perdidas ou a derrotas qualquer que seja a natureza. Basta ver o que se passa na Coreia do Norte, por exemplo.
Mas pronto, já se sabe que uma mentira muitas vezes contada se torna um facto insofismável. E esta e uma táctica que fez escola por aqueles lados, como a famosa mentira sobre o Calabote, que começou com o Pedroto, 20 anos depois do acontecimento. Alias, nessa altura nem polémica havia e os relatos apontam para uma convivência saudável entre os intervenientes, pelo menos fora dos relvados.

Qualquer que seja o Blog, página de Facebook,comentários de origem anti-benfiquista, de vez em quando, lá nos chamam eles "o clube do regime".
Depois são as fotografias com Salazar, a saudação fascista por parte dos jogadores, etc. Enfim, um mar sem fim de acusações e evidências para lavar o cérebro dos mais pobres de espírito, que infelizmente são muitos, e outros que não o sendo, ficam toldados pelo ódio.
Por exemplo, Rui Moreira (imaginem) mostrou, num programa televisivo, uma imagem do Benfica a fazer a saudação fascista.
Para alguém supostamente bem instruído, deveria saber que a mesma era obrigatória em qualquer evento que estivesse presente alguém do governo de então. O seu clube, por exemplo, assim como o Sporting, faziam-no regularmente porque possuíam no seu elenco directivo precisamente membros desse governo (mas depois aprofundaremos esse tema).
Também não sou burro o suficiente de dizer que o nosso clube não o fazia, como muitos benfiquistas apregoam. Não é verdade! Também o fez.
Não é por aí que a porca torce o rabo.
Mas se quiserem associar o Benfica ao Estado Novo, convinha pelo menos consubstanciarem-se com factos reais. Convinha pelo menos que se usasse a Historia, porque convenhamos que não foram factos passados no tempo do Condado Portucalense.
E analisando a mesma, poderão verificar que se algum clube pode ser associado ao regime, de algum modo, esse clube não é com certeza o Benfica. Sim, é verdade que Eusébio não foi para a Juventus, porque Salazar não deixou, porque o considerava património nacional. E daí? Até à queda do Muro de Berlim, jogadores de leste nunca poderiam abandonar os seus países até aos 27 anos. Tudo para salvaguardar os resultados nacionais e não dos clubes individualmente! Um exemplo muito simples: nos anos 80 qual foi o principal clube soviético? Dinamo de Kiev, que contava com uma equipa fortíssima, base da seleção da URSS. Um clube ucraniano! Comparem o que fazia nessa altura a URSS e os seus clubes e o que aconteceu depois.
Mas tudo bem, vamos então enumerar fatos históricos engraçados:
1 - O primeiro facto, e provavelmente aquele que demonstra a ignorancia das pessoas, tem a ver com o anacronismo da acusação. O Estado Novo teve início em 1926 e começou a desintegrar-se em 1961 com as crises estudantis e a guerra colonial, como deveriam saber muitos adeptos rivais mais idosos e sobretudo os mais cultos. Senão, poderão comprovar em qualquer livro, enciclopédia ou com qualquer pessoa culta e objetiva, que tenha vivido esses tempos. Até aí o Sporting era a força dominante, e foi precisamente na fase decadente do antigo regime que o Benfica emergiu como força dominante do desporto português, e o Sporting começou a perder protagonismo. Basta contar os campeonatos antes e depois
2 - Um facto sintomático do quão "favorecido" era o Benfica durante a era dourada do Salazarismo. Os poderes públicos apoiavam tanto os “encarnados” que em 1956 escolheram o Sporting – por convite - para participar na primeira edição da Taça dos Campeões Europeus, apesar do campeão da época anterior ter sido... o Benfica;
3 - A propalada falta de resultados do Benfica depois da revolução dos cravos, que eles invocam, começou em 94, 20 anos (!) depois do 25 de Abril. Até lá ganhamos metade dos 20 campeonatos disputados e ainda fomos a 3 finais europeias. O Sporting desde o 25 de Abril ganhou 4 campeonatos, até hoje! Menos que o numero de casamentos do Pinto da Costa e os mesmos que Benfica ganhou nos últimos 6 anos! Se somarmos o percurso depois de terminada a crise do Benfica, então, o Glorioso ganhou 15 campeonatos e foi a 5 finais europeias. Sim, não foi uma força dominante, mas longe do deserto que os adversários querem fazer passar.
4 - Para que não pensem que estamos a tentar insinuar que o Sporting era o clube do regime, o primeiro clube e único a deter o estatuto de utilidade pública entre 1928 e 1959 (época dourada do Salazarismo), e todos os benefícios associados a esse estatuto, sabem quem foi? Foi o FC Porto. Em 1928, o seu presidente era um ilustre PIDE Urgel Horta, importante figura do regime, como se pode comprovar na fotografia, e obteve junto do seu grande amigo Óscar Carmona essa gentileza. O Benfica e Sporting, por exemplo só obtiveram o mesmo estatuto em 1960!
5 - Tanto SCP como FCP sempre tiveram entre os seus dirigentes altas figuras do Estado Novo. No SCP Salazar Carreira, Góis Mota, Casal Ribeiro. No FCP Augusto Pires de Lima, Cesário Bonito, Ângelo César, o tal Urgel Horta. Tudo ministros e deputados da União Nacional. Em contrapartida, os benfiquistas elegiam em eleições democráticas opositores ao Regime como Manuel da Conceição Afonso, o Capitão Júlio Ribeiro da Costa, Felix Bermudes ou o próprio Borges Coutinho (em cuja casa, nos Açores, se planeou o sequestro do Sta. Maria, contra o antigo regime). Isto para não falar em alguns adeptos ilustres desde esses tempos, sobretudo um tal de Álvaro Cunhal (apenas o pai do comunismo português).
6 - Góis Mota, figura do regime, era presidente do Sporting quando em 56 irrompeu de pistola em punho no balneário dum árbitro ao intervalo num jogo que o SCP empatava com o Atlético (podem verificar, é um facto relatado até por Sportinguistas). Aposto que Bruno de Carvalho o tem como ídolo.
7 - No início dos anos quarenta, em plena época dourada de Salazar, o F.C.Porto beneficiou da ajuda dos seus influentes homens do poder para, através de dois cirúrgicos alargamentos, evitar cair para a segunda divisão, após se ter classificado em terceiro lugar no seu campeonato regional, que na altura apurava as equipas (os dois primeiros) para a prova nacional. Podem ir verificar.
8 - O Estádio das Antas foi inaugurado a 28 de Maio (de 1952), dia comemorativo da revolução que deu origem ao Estado Novo (verifiquem se quiserem, os portistas podem é não gostar do resultado do jogo). O antigo campo do Sporting que o Benfica viria a ocupar em 1941 ficava no topo do Campo Grande, então conhecido como Campo 28 de Maio. Não só o Benfica nunca assim o designou (era, simplesmente, o campo do Campo Grande) como o inaugurou a… 5 de Outubro.
9 - O Benfica foi campeão europeu em 61,com jogadores que faziam parte dos movimentos de libertação das colónias, como Santana e Coluna. Obviamente que Salazar não teve alternativa senão engolir o sapo e colar-se ao êxito do clube, aproveitando-se dele para efeitos políticos.
10 - O hino do Benfica (“Ser Benfiquista”) cantado por Luís Piçarra não é o original do clube. O primeiro hino, composto por Félix Bermudes, chamava-se “Avante Benfica” e foi silenciado pelo regime, por motivos óbvios. Félix Bermudes foi perseguido pela PIDE.
11 - Álvaro Cunhal, José Saramago, Xanana Gusmão, Jerónimo de Sousa, António Vitorino de Almeida, Artur Semedo, Manuel Alegre, Miguel Portas e muitas outras figuras da esquerda portuguesa... tudo adeptos do Benfica de longa data, alguns infelizmente já falecidos. Portanto, acham mesmo que figuras ilustres da esquerda como aquelas, algumas delas figuras centrais da luta contra o Estado Novo iriam mesmo apoiar um clube do Regime????? E qualquer região predominantemente comunista, já agora, qual o clube dominante em termos de apoio? Benfica! E qual o clube associado à burguesia lisboeta, mais associada a movimentos de direita? Sporting!
12 - Ainda antes de haver democracia no País já ela era praticada no Benfica! O Benfica foi a primeira associação do país com eleições livres o que era repudiado pelo Estado Novo e as suas eleições vistoriadas pela PIDE
13 - Qual a cor do Benfica? Vermelho! Cor associada a regimes comunistas e não ditatoriais de direita como o Estado novo. Daí terem sido designados por Encarnados. Ao contrário do Real Madrid por exemplo – que usava cores queridas aos falangistas de Franco. Já agora, quais as cores do Estado Novo? Azul e Branco!
E mais poderia continuar, mas não vale a pena.
Em todo o caso, só uma última curiosidade:
Qual o nome da primeira esposa de Jorge Nuno Pinto da Costa, e mãe de Alexandre Pinto da Costa?
Manuela CARMONA Graça! imaginam de quem era familiar?
A Chama Imensa 

sábado, 31 de dezembro de 2016

Cândido, Ribeiro dos Reis, Godinho e o Tarrafal



Chegou-me, há uma semana, às mãos e olhos, um livro que há muito desejava ler e ter, da autoria de Cândido de Oliveira: "Tarrafal - O Pântano da Morte". Muito há (haverá) a dizer acerca do livro e do seu autor.


Semanário "O Benfica"; página 3; 2 de Julho de 1953
O treinador do Benfica, Ribeiro dos Reis (à direita) entre o presidente do Benfica Joaquim Bogalho e o do FC Porto (Urgel Horta) com o treinador do FC Porto, Cândido de Oliveira (à esquerda, de óculos), no Estádio Nacional, antes da final da Taça de Portugal, em 28 de Junho de 1953, conquistada pelo Benfica após derrotar, por 5-0, a equipa do FC Porto

Um momento épico
Na final da Taça de Portugal da temporada de 1952/53 encontraram-se dois Benfiquistas que nesse dia, como treinadores, foram adversários: Ribeiro dos Reis (pelo Benfica) e Cândido de Oliveira (pelo FC Porto). Grandes amigos, Ribeiro dos Reis nunca perdoou a Cândido de Oliveira um dia, no início do Verão de 1920, ter "virado costas" ao "Glorioso", quando o Clube tanto necessitava dele que era "apenas" capitão da equipa de futebol!

Cândido infiel, Cândido fora... para sempre
Como resultado da infidelidade do seu capitão - Ribeiro dos Reis era um dos futebolistas da equipa - o seu grande amigo e antigo capitão da equipa Cândido de Oliveira nunca mais regressou ao Clube, encontrando sempre em Ribeiro dos Reis, dirigente do "Glorioso" praticamente até morrer, um obstáculo ao seu regresso. Quando António Ribeiro dos Reis faleceu em 3 de Dezembro de 1961 já Cândido de Oliveira deixara o nosso mundo em 23 de Junho de 1958.


Fotografia de Cândido de Oliveira nos ficheiros da PIDE (Polícia Internacional de Defesa do Estado) Fotografia gentilmente enviada pelo dedicado leitor do blogue Victor João Carocha. Obrigado. Fotografia e legenda acrescentada às 03.05 da matina de sábado, 05 de Julho de 2014

E tantas vezes Cândido de Oliveira podia - e ao que constava queria - ter regressado ao Benfica
Cândido de Oliveira depois de futebolista tornou-se o melhor treinador português, talvez o melhor de sempre, treinando no Brasil o mítico CR Flamengo, em 1950, importante ano da fase final do Campeonato do Mundo realizado no Brasil. Durante os anos 30, 40 e 50 o Benfica necessitou inúmeras vezes de um treinador. De "um" treinador! Quanto mais do "melhor deles"! Para António Ribeiro dos Reis, um dos pilares do Benfiquismo que burilou o Benfiquismo do pioneiro Cosme Damião: Quem sai porque quer não regressa por querer...

Uma promessa para 24 de Setembro
Deixo já a digitalização de uma fotografia (a do início deste texto) retirada de uma edição do jornal "O Benfica". Enquanto  procuro uma fotografia com melhor qualidade em que estejam estes dois amigos prometo para dia 24 de Setembro de 2014 - dia em que passam 118 anos do nascimento de Cândido de Oliveira - escrever acerca desta relação benfiquista entre dois Benfiquistas... mas "fora" do SLB.



Copiar (parte) do livro
Entretanto aqui ficam - no final deste texto - deliciosas, mas tenebrosas, páginas de um capítulo do livro de Cândido de Oliveira para quem quiser ler ou copiar para levar de férias. O tempo de ócio vai ser bem ocupado. E não vai ser tempo perdido.

E mais três notas
1.       O prefácio do livro, apenas editado em Portugal depois do 25 de Abril de 1974, é de José Magalhães Godinho que foi o primeiro director do jornal "O Benfica". Por agora fica neste espaço um prefácio que valeria também um magnífico artigo. Mais tarde haverá um texto evocando esse Benfiquista de Sempre, José Magalhães Godinho, nascido em 12 de Fevereiro de 1909 e falecido em 25 de Março de 1994, aos 85 anos;


Só um clube desinteressado do Poder do Estado Novo e sem temer represálias por que também não queria benesses podia ter como primeiro director do Jornal "O Benfica" ainda com o nome inicial de "Sport Lisboa e Bemfica", entre 1942 e 1946, um oposicionista como José Magalhães Godinho que foi referenciado pela PIDE quatro vezes durante o tempo em que dirigiu o Semanário do Clube. E foi preso quatro vezes, duas em 1930 e duas nos anos 40 (1947 e 1948). A sua acção democrática anti-censura, responsável e tolerante deu ao cargo de director do Semanário um prestígio e responsabilidade que outros depois - ao ocupar o mesmo cargo - tiveram dificuldade ou incapacidade em honrá-lo! A essa função e ao pioneiro director...
2.      António Ribeiro dos Reis (10 de Julho de 1896 a 3 de Dezembro de 1961) terá também um destaque neste blogue, em princípio no último dia deste ano (31 de Dezembro) assinalando os 100 anos da sua estreia com o "Manto Sagrado" na 1.ª categoria;

3.      O Benfica nunca foi um clube que discriminasse. Era, sim, um clube agregador que acolhia no seu seio todos os que quisessem engrandecê-lo independentemente da sua ideologia, etnia, género ou classe social. Em contraponto a um democrata, anti-fascista e anti-salazarista como Cândido de Oliveira, o EDB no espírito do Benfiquismo e da Gloriosa Cultura do Clube fará também a evocação de uma outra grande figura Benfiquista, ministro de Salazar: Augusto Cancella de Abreu, presumo que também salazarista e de direita, ao contrário de Cândido de Oliveira. Mas que só exerceu cargos no "Glorioso" depois de deixar de ser ministro e estar ligado ao Poder. Em 14 de Agosto de 2014, dia em que se completam 119 anos do seu nascimento em Anadia, no ano de 1895, o EDB homenageará um antigo presidente da Mesa da Assembleia Geral do Benfica, falecido em 6 de Abril de 1965. E dedicará a Cancella de Abreu o mesmo fervor, dedicação e rigor que terá para com Cândido de Oliveira, praticamente um mês depois. Se bem que o tema não seja o mesmo. Para Cancella de Abreu interessa destacar a sua acção como 11.º presidente da Mesa da Assembleia Geral, entre 27 de Julho de 1956 e 26 de Março de 1964, já doente. Enquanto que para Cândido de Oliveira interessará evidenciar uma amizade "fora do Benfica" entre ele e Ribeiro dos Reis. Ribeiro dos Reis que foi o 10.º presidente da Mesa da Assembleia Geral do Benfica antes de... Cancella de Abreu! 




Apesar de preferir destacar o Clube enquanto colectividade e não somatório de individualidades é sempre um prazer escrever acerca de Benfiquistas que sempre serviram o Clube e nunca se serviram dele!

Alberto Miguéns

Prefácio de José Magalhães Godinho ao livro de Cândido de Oliveira



Último capítulo do livro (páginas 129 a 153)
















  1. O futebol é feito em primeiro lugar pelos seus praticantes. E esses são também homens (ou mulheres), com as suas incongruências, as suas cambiantes e as decisões que tomam em função do meio onde se inserem e interagem com os seus semelhantes.

    Cândido Oliveira foi um homem notável. Um praticante de qualidade, um mentor , um treinador de sucesso. Foi tudo o que o Dr. José Magalhães Godinho escreve nesse prefácio.

    A vida é assim, por vezes afasta-nos daqueles que foram amigos num dado tempo. Pelo que nos diz, a cordialidade e a amizade entre Cândido de Oliveira e Ribeiro dos Reis manteve-se forte apesar da saída de Cândido que arrastou quase uma equipa inteira do Benfica com ele para a Casa Pia. Afinal fundaram o jornal "A Bola". Interessante como Ribeiro dos Reis terá então apartado o Benfica de tudo o resto, não colocando em causa a relação entre amigos mas fazendo questão de impedir qualquer regresso ao Benfica. Valores sólidos e coerência ao longo de décadas. Homem de fibra concerteza.

    Entende-se mas pelo menos do pouco que sei ainda assim lamento que não tenha havido uma reconciliação. Quando saiu Cândido era capitão do Benfica. Era treinado por Cosme Damião. Deveria pois ser o seu braço direito. Seria interessante perceber também a relação entre esses dois homens. Tanto quanto sei terão existido conversas antes da tomada de decisão. Não sei se o Alberto sabe alguma coisa sobre isso. Penso se não estou em erro que já li qualquer coisa de si a propósito de Cândido de Oliveira ter protelado por 1 ano essa decisão pois terá feito questão de sair como campeão.

    Cândido de Oliveira foi um dos maiores "ses" do Benfica. Como teria sido se não tem saído. Teriamos tido a crise de 1926 mais cedo? Teria sido diferente? Ter-se-ia Cosme afastado nessa data? Cândido era um pensador e por isso teria tido uma enorme importância na definição do Benfica como clube. Teriamos tido uma dupla Candido de Oliveira e Ribeiro dos Reis a fazer parte do pequeno núcleo de figuras-chave do clube. Parece mais do que provável.

    A parte do livro, a parte da experiência do Tarrafal é terrível. Cândido de Oliveira era um intelectual e pode - viveu para isso - racionalizar e relatar a sua experiência. Outros não tiveram a mesma sorte. É terrível perceber até que ponto um ser humano pode descer tão baixo para subjugar a este ponto um seu semelhante.

em-defesa-do-benfica.blogspot.com

segunda-feira, 12 de novembro de 2018

Cândido, Ribeiro dos Reis, Godinho e o Tarrafal



Chegou-me, há uma semana, às mãos e olhos, um livro que há muito desejava ler e ter, da autoria de Cândido de Oliveira: "Tarrafal - O Pântano da Morte". Muito há (haverá) a dizer acerca do livro e do seu autor.


Semanário "O Benfica"; página 3; 2 de Julho de 1953
O treinador do Benfica, Ribeiro dos Reis (à direita) entre o presidente do Benfica Joaquim Bogalho e o do FC Porto (Urgel Horta) com o treinador do FC Porto, Cândido de Oliveira (à esquerda, de óculos), no Estádio Nacional, antes da final da Taça de Portugal, em 28 de Junho de 1953, conquistada pelo Benfica após derrotar, por 5-0, a equipa do FC Porto

Um momento épico
Na final da Taça de Portugal da temporada de 1952/53 encontraram-se dois Benfiquistas que nesse dia, como treinadores, foram adversários: Ribeiro dos Reis (pelo Benfica) e Cândido de Oliveira (pelo FC Porto). Grandes amigos, Ribeiro dos Reis nunca perdoou a Cândido de Oliveira um dia, no início do Verão de 1920, ter "virado costas" ao "Glorioso", quando o Clube tanto necessitava dele que era "apenas" capitão da equipa de futebol!

Cândido infiel, Cândido fora... para sempre
Como resultado da infidelidade do seu capitão - Ribeiro dos Reis era um dos futebolistas da equipa - o seu grande amigo e antigo capitão da equipa Cândido de Oliveira nunca mais regressou ao Clube, encontrando sempre em Ribeiro dos Reis, dirigente do "Glorioso" praticamente até morrer, um obstáculo ao seu regresso. Quando António Ribeiro dos Reis faleceu em 3 de Dezembro de 1961 já Cândido de Oliveira deixara o nosso mundo em 23 de Junho de 1958.


Fotografia de Cândido de Oliveira nos ficheiros da PIDE (Polícia Internacional de Defesa do Estado) Fotografia gentilmente enviada pelo dedicado leitor do blogue Victor João Carocha. Obrigado. Fotografia e legenda acrescentada às 03.05 da matina de sábado, 05 de Julho de 2014

E tantas vezes Cândido de Oliveira podia - e ao que constava queria - ter regressado ao Benfica
Cândido de Oliveira depois de futebolista tornou-se o melhor treinador português, talvez o melhor de sempre, treinando no Brasil o mítico CR Flamengo, em 1950, importante ano da fase final do Campeonato do Mundo realizado no Brasil. Durante os anos 30, 40 e 50 o Benfica necessitou inúmeras vezes de um treinador. De "um" treinador! Quanto mais do "melhor deles"! Para António Ribeiro dos Reis, um dos pilares do Benfiquismo que burilou o Benfiquismo do pioneiro Cosme Damião: Quem sai porque quer não regressa por querer...

Uma promessa para 24 de Setembro

Deixo já a digitalização de uma fotografia (a do início deste texto) retirada de uma edição do jornal "O Benfica". Enquanto  procuro uma fotografia com melhor qualidade em que estejam estes dois amigos prometo para dia 24 de Setembro de 2014 - dia em que passam 118 anos do nascimento de Cândido de Oliveira - escrever acerca desta relação benfiquista entre dois Benfiquistas... mas "fora" do SLB.



Copiar (parte) do livro
Entretanto aqui ficam - no final deste texto - deliciosas, mas tenebrosas, páginas de um capítulo do livro de Cândido de Oliveira para quem quiser ler ou copiar para levar de férias. O tempo de ócio vai ser bem ocupado. E não vai ser tempo perdido.

E mais três notas

1.       O prefácio do livro, apenas editado em Portugal depois do 25 de Abril de 1974, é de José Magalhães Godinho que foi o primeiro director do jornal "O Benfica". Por agora fica neste espaço um prefácio que valeria também um magnífico artigo. Mais tarde haverá um texto evocando esse Benfiquista de Sempre, José Magalhães Godinho, nascido em 12 de Fevereiro de 1909 e falecido em 25 de Março de 1994, aos 85 anos;


Só um clube desinteressado do Poder do Estado Novo e sem temer represálias por que também não queria benesses podia ter como primeiro director do Jornal "O Benfica" ainda com o nome inicial de "Sport Lisboa e Bemfica", entre 1942 e 1946, um oposicionista como José Magalhães Godinho que foi referenciado pela PIDE quatro vezes durante o tempo em que dirigiu o Semanário do Clube. E foi preso quatro vezes, duas em 1930 e duas nos anos 40 (1947 e 1948). A sua acção democrática anti-censura, responsável e tolerante deu ao cargo de director do Semanário um prestígio e responsabilidade que outros depois - ao ocupar o mesmo cargo - tiveram dificuldade ou incapacidade em honrá-lo! A essa função e ao pioneiro director...
2.      António Ribeiro dos Reis (10 de Julho de 1896 a 3 de Dezembro de 1961) terá também um destaque neste blogue, em princípio no último dia deste ano (31 de Dezembro) assinalando os 100 anos da sua estreia com o "Manto Sagrado" na 1.ª categoria;

3.      O Benfica nunca foi um clube que discriminasse. Era, sim, um clube agregador que acolhia no seu seio todos os que quisessem engrandecê-lo independentemente da sua ideologia, etnia, género ou classe social. Em contraponto a um democrata, anti-fascista e anti-salazarista como Cândido de Oliveira, o EDB no espírito do Benfiquismo e da Gloriosa Cultura do Clube fará também a evocação de uma outra grande figura Benfiquista, ministro de Salazar: Augusto Cancella de Abreu, presumo que também salazarista e de direita, ao contrário de Cândido de Oliveira. Mas que só exerceu cargos no "Glorioso" depois de deixar de ser ministro e estar ligado ao Poder. Em 14 de Agosto de 2014, dia em que se completam 119 anos do seu nascimento em Anadia, no ano de 1895, o EDB homenageará um antigo presidente da Mesa da Assembleia Geral do Benfica, falecido em 6 de Abril de 1965. E dedicará a Cancella de Abreu o mesmo fervor, dedicação e rigor que terá para com Cândido de Oliveira, praticamente um mês depois. Se bem que o tema não seja o mesmo. Para Cancella de Abreu interessa destacar a sua acção como 11.º presidente da Mesa da Assembleia Geral, entre 27 de Julho de 1956 e 26 de Março de 1964, já doente. Enquanto que para Cândido de Oliveira interessará evidenciar uma amizade "fora do Benfica" entre ele e Ribeiro dos Reis. Ribeiro dos Reis que foi o 10.º presidente da Mesa da Assembleia Geral do Benfica antes de... Cancella de Abreu! 




Apesar de preferir destacar o Clube enquanto colectividade e não somatório de individualidades é sempre um prazer escrever acerca de Benfiquistas que sempre serviram o Clube e nunca se serviram dele!

Alberto Miguéns

Prefácio de José Magalhães Godinho ao livro de Cândido de Oliveira



Último capítulo do livro (páginas 129 a 153)











  1. O futebol é feito em primeiro lugar pelos seus praticantes. E esses são também homens (ou mulheres), com as suas incongruências, as suas cambiantes e as decisões que tomam em função do meio onde se inserem e interagem com os seus semelhantes.

    Cândido Oliveira foi um homem notável. Um praticante de qualidade, um mentor , um treinador de sucesso. Foi tudo o que o Dr. José Magalhães Godinho escreve nesse prefácio.

    A vida é assim, por vezes afasta-nos daqueles que foram amigos num dado tempo. Pelo que nos diz, a cordialidade e a amizade entre Cândido de Oliveira e Ribeiro dos Reis manteve-se forte apesar da saída de Cândido que arrastou quase uma equipa inteira do Benfica com ele para a Casa Pia. Afinal fundaram o jornal "A Bola". Interessante como Ribeiro dos Reis terá então apartado o Benfica de tudo o resto, não colocando em causa a relação entre amigos mas fazendo questão de impedir qualquer regresso ao Benfica. Valores sólidos e coerência ao longo de décadas. Homem de fibra com certeza.

    Entende-se mas pelo menos do pouco que sei ainda assim lamento que não tenha havido uma reconciliação. Quando saiu Cândido era capitão do Benfica. Era treinado por Cosme Damião. Deveria pois ser o seu braço direito. Seria interessante perceber também a relação entre esses dois homens. Tanto quanto sei terão existido conversas antes da tomada de decisão. Não sei se o Alberto sabe alguma coisa sobre isso. Penso se não estou em erro que já li qualquer coisa de si a propósito de Cândido de Oliveira ter protelado por 1 ano essa decisão pois terá feito questão de sair como campeão.

    Cândido de Oliveira foi um dos maiores "ses" do Benfica. Como teria sido se não tem saído. Teriamos tido a crise de 1926 mais cedo? Teria sido diferente? Ter-se-ia Cosme afastado nessa data? Cândido era um pensador e por isso teria tido uma enorme importância na definição do Benfica como clube. Teriamos tido uma dupla Candido de Oliveira e Ribeiro dos Reis a fazer parte do pequeno núcleo de figuras-chave do clube. Parece mais do que provável.

    A parte do livro, a parte da experiência do Tarrafal é terrível. Cândido de Oliveira era um intelectual e pode - viveu para isso - racionalizar e relatar a sua experiência. Outros não tiveram a mesma sorte. É terrível perceber até que ponto um ser humano pode descer tão baixo para subjugar a este ponto um seu semelhante.
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