O “balanço” do Afeganistão visto pelo Bloco
Reconhecer o fracasso da invasão do Afeganistão hoje não significa que o seu propósito e missão estivessem errados à partida
Não foi preciso esperar muito para que a reacção dos que veladamente se regozijam com a humilhação dos Estados Unidos e da NATO no Afeganistão aparecesse exultante. No próprio dia em que Cabul colapsou, o Bloco de Esquerda exigia “a quem na altura apoiou” a invasão do Afeganistão que faça agora “o seu balanço”. Aqui vai ele: 20 anos de libertação de um povo do jugo de um dos mais miseráveis regimes da história; 20 anos em que meninas com mais de 12 anos puderam ir à escola; duas décadas sem um santuário do terrorismo internacional da Al-Qaeda; anos em que os afegãos escaparam à violência ou à lavagem ao cérebro e puderam acreditar num país no qual pudessem ser donos das suas vidas, de disporem da sua liberdade religiosa, de decidirem se usam barba ou não.
Está à vista de toda a gente que a intervenção liderada pelos Estados Unidos foi um rotundo falhanço. Fica claro que o colapso do regime resultou da arrogância, incompetência e incapacidade de lidar com as causas que alimentam o fundamentalismo. É óbvio que o bilião de dólares gasto na força militar foi um desperdício. É nítido que a ocupação teve como foco principal a guerra e não a melhoria das condições de vida dos afegãos. Mas reconhecer o fracasso da intervenção hoje não significa que o seu propósito e missão estivessem errados à partida. No Inverno de 2001, com as Torres Gémeas ainda na memória, derrotar esse regime vil era uma causa civilizacional.
Olha-se para o empenho do Bloco em causas destas e não se percebe essa espécie de prazer em exigir explicações aos que defenderam a invasão em nome dos direitos humanos.
Ou melhor, percebe-se. No fundo, o Bloco mantém a coerência ideológica da sua matriz de extrema-esquerda.
O antiamericanismo ou a aversão à NATO são ingredientes fundamentais das suas crenças. Os ideais pacifistas, que os leva a defender, antes como agora, outras “formas de apoiar o povo afegão” submetido a “fanáticos”, são enternecedores, mas iludem a realidade. Se Catarina Martins pedir aos mullahs para respeitarem as mulheres, será vista como blasfema. Não há forma de ajudar o povo afegão com os fanáticos no poder.
E agora? Infelizmente, é o futuro negro. Mais do que o fracasso americano, o que mais há a lamentar nesta história é o destino dos afegãos. O drama mantém-se: se os taliban não mudarem, é provável que a criação de novos santuários terroristas determine uma nova invasão no futuro. O Bloco, claro, será contra. Se essa é a única forma de libertar todo um povo de uma horrível ditadura, isso pouco interessa ao seu “balanço”.
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