Falta de equipamentos de proteção individual adequados e em quantidade suficiente, fardamento e desinfetantes são apenas alguns dos muitos problemas com que os enfermeiros do Algarve se estão a debater neste momento.

O Sindicato dos Enfermeiros Portugueses (SEP) enviou, a 20 de março, um ofício com as principais preocupações e reivindicações destes profissionais à direção da Administração Regional de Saúde (ARS) Algarve e ao conselho de administração do Centro Hospitalar e Universitário do Algarve (CHUA).
documento, ao qual o barlavento teve acesso em primeira mão, traça um cenário do que está acontecer em pleno estado de Emergência, devido à pandemia do novo Coronavírus (COVID-19) nas várias unidades de saúde da região.
«Exigimos que as instituições de Saúde respondam o mais rápido possível e comecem a implementar as medidas necessárias para uma maior segurança dos profissionais e utentes. Esperamos que os responsáveis consigam agora valorizar as reivindicações de vários anos, porque se as tivessem adotado antes, hoje estaríamos muito melhor preparados para enfrentar esta pandemia. Esperamos que as medidas reivindicadas não sejam apenas de aplicação circunstancial, mas duradouras», alerta ao barlavento Nuno Manjua, da direção regional de Faro do SEP.
O ofício surge «face ao conjunto de questões com que os enfermeiros estão confrontados e para que seja garantido que todos continuem a estar, física e psicologicamente, disponíveis para continuarem a desenvolver todas as intervenções com a segurança necessária».
A primeira preocupação elencada pela direção regional do SEP no Algarve tem a ver com a falta de Equipamentos de Proteção Individual (EPI).
«Onde existiam estão a esgotar-se ou já se esgotaram, colocando em causa a própria segurança e daqueles com quem convivem. No limite, as suas vidas».
«Constatamos que não existe uma distribuição destes materiais com critério, de acordo com orientações da Direção Geral de Saúde e há serviços em que as orientações variam de dia para dia. A máscara é obrigatória no contacto com os doentes, de acordo com a DGS, mas há serviços em que as recusam aos profissionais!»
«Há colegas a usar uma máscara durante todo o turno, enquanto outros se vêm na obrigatoriedade de a utilizar por mais um ou dois dias. Há profissionais que compraram do seu bolso, enquanto ainda havia disponível», denuncia o sindicato.
Nuno Manjua está apreensivo, já que a reposição que é feita, «não chega para suprir as necessidades».
«Várias têm sido as denúncias de profissionais a serem ameaçados de processos disciplinares, caso não façam o registo biométrico de assiduidade, mas as instituições não estão a garantir a solução alcoólica desinfetante junto aos terminais. Estas e quaisquer ameaças que possam acontecer, são inaceitáveis. Há, também, testemunhos de profissionais que compraram lixívia por esta não existir nos serviços», sublinha.
«Se já antes era uma vergonha não haver fardas lavadas disponíveis, agora o cenário ainda se agravou e há colegas que levam as fardas para lavar em casa sob pena de terem que andar dias seguidos com o mesmo fardamento», acresce o dirigente que assina o oficio enviado à ARS Algarve e ao CHUA.
Este problema em concreto foi agravado pela criação de Áreas Dedicadas para a Avaliação (ADC) e tratamento de doentes, onde mais fardas são necessárias, sobretudo nos Centros de Saúde do Algarve.
«Esta situação tem que parar, já! Exige-se que sejam adquiridas fardas descartáveis e que seja efetuado um acordo imediato com lavandarias nos vários concelhos», pede o documento.
Nuno Manjua sabe que nem todos os colegas estão informados no que toca às regras de segurança no trabalho no atual cenário de pandemia: «a muitos profissionais, incluindo elos de ligação ao Programa Nacional de Prevenção e Controlo de Infeções e de Resistência a Antimicrobianos (PPCIRA), não foi realizada a formação sobre procedimentos e circuitos a adotar, o que é motivo de ansiedade e maior exposição ao risco dos próprios e dos utentes».
«Há situações de profissionais que estiveram em contacto desprotegido com doentes confirmados com COVID-19, mas que não foram aplicadas quaisquer medidas de isolamento profilático, nem testes, nem tão pouco lhes disseram como deverão proceder, apenas lhes é dito para continuar a trabalhar», reforça o dirigente.
Uma outra situação insólita referida no documento do SEP é que no Algarve, alguns Centros de Saúde não têm água quente para os profissionais poderem tomar banho antes de regressar a casa. «Já antes tínhamos reportado esta situação», garante Nuno Manjua.
Embora os casos de COVID-19 na região ainda sejam relativamente baixos, o SEP chama a atenção para a necessidade de se criarem mais quartos de isolamento de pressão negativa na região.


Nuno Manjua, dirigente regional do Sindicato dos Enfermeiros Portugueses (SEP).
«Tem sido uma nossa reivindicação, que agora reforçamos. No Algarve apenas existem quatro e estão todos no Hospital de Faro. Deve ser dada prioridade aos hospitais de Portimão e Lagos, onde não há nenhum».
Por fim, o SEP alerta para uma condição dramática. «Em espaços existentes ou criados (contentores) de isolamento/atendimento a utentes com suspeita de COVID-19, há situações em que os utentes esperam horas ao frio e sem nada para comer. Há enfermeiros a comprar-lhes comida».
O ofício sindical prevê que dada «a possibilidade de aumento do número de doentes internados em suas casas, aumentará também a necessidade de prestação de cuidados ao domicílio», pelo que será necessário um reforço de enfermeiros.

«Se já antes todos assumiam a carência de profissionais, que há muito deveriam ter sido contratados em número suficiente, torna-se agora ainda mais necessário. Exige-se a abertura imediata de concursos e que sejam encontradas formas ágeis de recrutamento de enfermeiros. A duração dos contratos serem apenas de quatro meses, com possibilidade de renovação, é simplesmente inaceitável. Os contratos deverão ser por tempo indeterminado. O alojamento não será um problema para quem vem de fora, visto que várias unidades hoteleiras estão a disponibilizar guarida temporária», diagnostica o SEP.
Paulo Morgado, presidente da ARS Algarve, disse ao barlavento, à margem da apresentação do novo Centro de testes à COVID-19, no Parque das Cidades, entre Loulé e Faro, no domingo, dia 22 de março, que há dificuldades na aquisição de material, devido à elevada procura.
O responsável compreende os anseios do SEP e garante que a primeira preocupação daquela entidade é a «segurança de todos os profissionais e utentes» enquanto durar a atual pandemia.

Onde está a Saúde no Trabalho para quem trabalha na saúde?

«Um escândalo!», considera Nuno Manjua, da direção regional de Faro do Sindicato dos Enfermeiros Portugueses (SEP).
«Como é possível que ao longo dos anos não tenha havido, ou tenha havido de forma muito residual, médicos do trabalho no Serviço de Saúde Ocupacional do Centro Hospitalar e Universitário do Algarve (CHUA) e da Administração Regional de Saúde (ARS) Algarve?», questiona, em declarações ao barlavento.
«Se já antes eram necessários para cumprir com os requisitos legais, no acompanhamento de acidentes de trabalho, da avaliação de incapacidade para o trabalho, da realização de exames médicos de admissão ou periódicos (não há resposta para a maior parte dos profissionais nestas situações), ainda mais necessários são no atual contexto, quer para a elaboração dos planos de contingência do COVID-19, quer para a avaliação das condições para os profissionais continuarem a trabalhar», afirma.
O dirigente regional do SEP diz não compreender porque motivo a ARS do Algarve e o CHUA, «grandes empregadores da região», não contratam em permanência Médicos do Trabalho.


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