Está fechado em casa há duas semanas como muitos portugueses e olha com esperança a situação do mundo sob uma pandemia que não se adivinhava poder regressar ao planeta de uma forma tão violenta.
Não perdeu a confiança na ciência mas também não acredita que a humanidade sairá deste susto tão diferente assim. Nem ao nível da economia, um dos piores receios para o passo seguinte nas sociedades, mesmo que acredite em algumas alterações políticas em países com governantes como Trump ou Bolsonaro.
Quando se lhe pergunta se as pessoas poderão "perder" a cabeça nestas próximas semanas de isolamento social, responde com cautela:
"Não direi perder, mas sei que nem todos estão com a cabeça segura. O que é preciso agora? Responder racionalmente ao problema. Ele existe e é preciso usar o melhor do nosso conhecimento e ter muito em conta a atitude de cada um para resolver a questão."
Não sabemos como é que isto vai acabar, de facto há uma grande incerteza em tudo e essa é a maior das nossas maiores preocupações. Não sabemos lidar com a incerteza, até pode acontecer que não seja apenas um pico agora e que volte mais tarde, no inverno, mas estou confiante de que vai passar. Irá haver um mundo depois deste surto epidémico e tudo irá continuar - não lamento desiludir os que anunciam o fim. É claro que teremos de fazer por isso e esta crise poderá revelar tanto o melhor de nós como o pior. Aliás, esta situação já se verifica. No melhor, por exemplo, o podermos rapidamente espalhar conhecimento com base na ciência que temos. Não sabemos tudo, mas sabemos muita coisa. No pior, é o espalhar da desinformação através das redes que temos montadas e que resultam também do conhecimento científico.
Como se pode exibir essa forma de pior?
Não sei o que passa pela cabeça de pessoas que inventam falsidades e as espalham, com o medo que daí resulta e nos tolhe os movimentos. O medo nem sempre é um fator de racionalidade.
O que sabemos agora e podemos fazer?
Sabemos que é um vírus, situação que há cem anos, na gripe espanhola de 1918, se desconhecia. As pessoas morriam sem saber porquê. Agora, com base na sequenciação do genoma do covid-19, já feito de uma forma muito rápida, avançou-se muito. A pandemia foi declarada em março, o primeiro caso conheceu-se em novembro, mesmo que só no final de dezembro se soubesse o que era, porque existiam pneumonias a mais na China.
Até há dias acreditava-se no poder infinito da ciência. A falta de uma resposta científica não fará descrer nesse conhecimento?
A ciência está a fazer o que pode. Os testes que foram criados são fruto de uma tecnologia extremamente rápida - nunca vi a ciência ser posta tão rapidamente em ação - e já sabemos quais os meios que temos para nos prevenirmos. A questão do distanciamento social é uma das respostas, que vai mudar a nossa sociedade. E atenção, porque não iremos precisar dele apenas por dois meses.
Até há dias falava-se em ir a Marte, mas nem se é capaz de resolver o problema na Terra!
Vamos conseguir resolver com certeza, só que dentro das limitações que temos. Não somos super-homens nem deus e devemos evitar certas expectativas por parte de algumas pessoas.
Esta quarentena poderá ser uma lição?
Sim, será uma lição, mas apenas para as pessoas que depositavam demasiadas expectativas na ciência. O que é a ciência? É apenas o melhor método que temos de conhecimento válido sobre o mundo. Que sairá reforçado - nunca diminuído -, pois até as pessoas que estão surpreendidas com o que está a acontecer devem lembrar-se de que o mundo está cheio de epidemias. Neste século já tivemos muitas epidemias, basta que se chame a este vírus o SARS-CoV-2, no entanto o que pensávamos é que era uma coisa pequena e lá longe; não foi o que aconteceu, é gigante e está por todo o mundo. Mas era bem conhecido dos cientistas, existiam previsões, tanto que há um relatório da Organização Mundial da Saúde de outubro que chamava a atenção para os perigos de uma epidemia.
Não se podia evitar esta pandemia?
As pessoas estão habituadas a carregar num botão ou a tomar um medicamento, mas esquecem-se de que essas situações pressupõem muitos anos de trabalho e décadas de investigação. Talvez a ciência devesse transmitir melhor a nossa relação com o planeta, que somos parte dela e que sempre dividimos a Terra com o resto da vida. Há um prémio Nobel especialista em biologia molecular, Lederberger, que diz que só há dois competidores no planeta: o homem e os vírus. Eu acrescentaria as bactérias, que são mais antigas do que os homens e que continuarão mesmo que aconteça algum cataclismo que ameace a espécie humana. Como somos parte da natureza e a evolução nos trouxe até aqui apesar de todos os ataques de vírus e de bactérias - a humanidade está aqui e mais forte do que nunca -, não sou pessimista. Aliás, temos um sistema de saúde e de higiene pública em Portugal que foi desenvolvido à custa de epidemias.
Não é uma novidade para os nossos antepassados estes combates epidémicos?
Não, no final do século XIX, Ricardo Jorge tomou medidas contra a peste bubónica no Porto, que era um surto da peste negra do século XIV, vinda da China também, e foi com isso que aprendemos. Contudo, não devemos demonizar os micro-organismos, até porque fazemos insulina com uma bactéria. Podemos dizer que temos uma enorme vantagem sobre os vírus e as bactérias, e há um historiador, Yuval Harari, que chamou recentemente a atenção para isso: os vírus e as bactérias não comunicam uns com os outros nem dizem da China para aqui "faz isto ou aquilo", enquanto nós estamos a falar entre os vários países do mundo. Partilhamos o mundo com vírus e bactérias, mas estou convencido de que somos mais poderosos. Basta ver que criamos ciência, cultura e meios de comunicação. Creio que há soluções e que sem a ciência não nos salvaríamos, mas não é apenas a ciência que nos salva, existem outras coisas - como a solidariedade e a cooperação - e também devemos estar atentos à economia, à política e à ética.
Está de quarentena? Já começou a questionar algumas das suas certezas ou mantém-se firme nas crenças sobre a ciência?
Sim, estou em casa há duas semanas e só saí uma única vez, evitando todos os contactos. Quanto a interrogações, não há pessoa que não as faça. Contudo, até agora nada descobri que não soubesse. Se tenho questionamentos filosóficos e metafísicos que não tinha antes, não. Esta situação vem consolidar algumas das questões de que eu estava convencido, por exemplo, que o conhecimento é um valor e que a sua partilha é importante. Mesmo fechados em casa, temos de perceber o valor enorme que é a possibilidade de comunicação. Estamos sozinhos, mas não estamos sozinhos; o mundo parece estar aparentemente fechado mas continua aberto na verdade, e esse é um conseguimento nosso. Quero crer que esta é uma oportunidade para a sociedade e para os governos acreditarem e valorizarem o conhecimento. Iremos sair desta situação de uma forma mais sustentável e, se eu já tinha esta certeza, sei que iremos continuar no mundo, só que com outros problemas para resolver.
Não faltam problemas ao planeta?
Será o caso das alterações climáticas globais, que, com este problema premente que nos afeta, será possível ver melhor que daqui a 30 ou 40 anos será tarde de mais. Não vemos as mortes a acumular-se com as alterações climáticas, mas perceberemos melhor que as décadas em falta para solucionar essa questão passarão num instante. Daí que espere que esta epidemia leve a uma consciencialização maior da que têm certas figuras inimigas da ciência, como Trump e Bolsonaro. Creio que acabarão também vítimas disto porque o que vai acontecer com a quebra da economia é que as pessoas perceberão melhor o que eles andaram a prometer que iria acontecer, negando a ciência. Portanto, há coisas que lhes vão correr mal.
É o preço da democracia?
Seria um dano lateral positivo se alguns desses personagens que não ajudam ao futuro do mundo pudessem cair. Estamos num estado de exceção, mas gostaria muito que as democracias resistissem a isto. A China respondeu, mesmo sendo uma autocracia muito forte e que lidou de uma maneira muito dura com esta situação, mas agora está a ajudar a Europa. Seria irónico que também tivesse de ajudar os Estados Unidos! Não acredito que a democracia esteja em risco nem quero, mesmo que não tenha sabido resolver o problema das desigualdades; o que precisamos é de mais democracia e o que estamos a fazer fechados em casa é sacrificar alguns dos nossos direitos na atualidade para os poder ter de forma plena depois. Vamos voltar à rua, fazer manifestações e greves, mas de momento fazemos uma interrupção voluntária.
Confirma-se que tem fé na ciência...
Fé não é a palavra, prefiro confiança na ciência...
Deixe-me usar a palavra fé, porque neste momento há milhões de católicos que não observam por parte da Igreja grandes respostas. Como será a reação à inoperância da Igreja perante esta crise?
Não é uma pergunta fácil, mas vou tentar responder. Entre os séculos XIV a XVI, por exemplo, quando não se sabia a origem dos males do mundo, estes eram atribuídos ao castigo divino. Num mundo dominado pelo cristianismo, era a fúria de Deus! Aliás, vimos isso em Portugal no século XVIII, quando o padre Malagrida é queimado pela Inquisição porque não queria reconstruir a cidade de Lisboa pois não valia a pena voltar ao mundo que existia por ser um mundo de pecado e, decerto, voltaríamos a ser castigados - reedificar a cidade era voltar a pecar. Agora, as cidades secularizaram-se e não estamos mais num tempo em que a questão seja entre ciência e religião - como já foi noutras épocas -, e sabemos o que é responsabilidade de cada uma. O problema do vírus não pertence à religião, embora esta possa ajudar e servir de consolo às pessoas. Com certeza que os religiosos encontram consolo na oração e soluções pessoais e, de algum modo, coletivas. A religião poderá ser uma força para a solidariedade numa situação de crise como é a atual, mas isso não quer dizer que a solução efetiva não tenha de ser da ciência. E a religião hoje sabe isso.
Os fiéis têm consciência de que a religião nada poderá fazer neste caso?
Não pode fazer nada do ponto de vista científico, mas pode o que sempre fez: criar coesão. Estou muito admirado pelo facto de terem acabado as missas em Portugal, uma coisa nunca vista nos últimos séculos, até diria que é inédito na história de Portugal porque mesmo no tempo em que as pessoas morriam por contágio, e houve epidemias terríveis - como a da gripe espanhola, que matou mais gente em todo o mundo do que a I Guerra Mundial, 50 milhões de pessoas -, e até nesse tempo a missa e os serviços religiosos continuavam. Agora estamos numa situação inédita, que é a de não termos serviços religiosos e tudo passar pelos meios de comunicação à distância que a ciência inventou. É muito complexo não haver funerais, uma realidade culturalmente muito entranhada entre nós e que neste momento está limitada a serviços mínimos. Conseguiremos lidar com isto temporariamente, mas tenho dúvidas de que consigamos por muito tempo.
GRIPE ESPANHOLA
Como vê certas profecias sobre o fim da pandemia?
As pessoas que vêm anunciar que isto está resolvido no dia xis estão enganadas. Nestas alturas aparece sempre muita gente a dizer coisas como, por exemplo, os modelos matemáticos; modelos não são mais do que isso. Um epidemiologista e um médico olham de outra maneira porque a questão é complexa e depende de muitos fatores. É que não é só a ciência a atuar, há a economia, dos valores da ética - que transcendem largamente a ciência. Sei que as religiões têm uma palavra sobre a ética, que é um assunto civil e laico, e neste momento há sobressaltos éticos enormes. Por exemplo: se tivermos um ventilador e dois doentes terminais, a qual deles vamos dar o aparelho? Este assunto que, felizmente, em Portugal ainda não se põe, acontece já em Itália e em Espanha. A quem serve o ventilador é uma questão da ética, é um problema de todos; de um momento para o outro estamos confrontados com questões em que a ciência não entra, ou só de forma muito limitada.
O que tem a ciência a dizer sobre a ética?
É preciso ter consciência de que a ciência tem limitações e não fornece respostas a algumas questões. Não dá resposta a questões do tipo religioso, filosófico ou metafísico. Diz coisas sobre o homem e a vida que são importantes para continuarmos a viver, mas não sobre os sentidos que alguns continuam a procurar e encontram. Percebo bem que a religião tenha um papel, mas situações como esta ajudam também a perceber que cada um tem o seu lugar e que não é o de conflito. O pior de tudo seria se as várias dimensões humanas entrassem em choque.
Nas últimas semanas, a sociedade portuguesa discutia a eutanásia. De um momento para o outro esse debate foi ultrapassado com situações de ter de deixar morrer pessoas, questionamento que até há alguns dias não se colocava aos médicos!
É isso mesmo, estamos perante problemas sobre os quais não pensámos o suficiente e espero que não estejamos a pensar mal agora. Vou crer que sim. Ao contrário da gripe de 1918, que atacava sobretudo os mais novos e levou pessoas na flor da idade, como Amadeo de Souza-Cardoso, Egon Schiele e Apollinaire, agora, por razões que só em parte percebemos, está a ter taxas de mortalidade que são notórias nas pessoas com mais de 70 anos e com outras fragilidades. É importante interrogarmo-nos se estamos a tratar bem essas pessoas, nomeadamente quando a sociedade estava a colocá-las em armazéns chamados lares. A questão é se depois iremos tratar os mais idosos da mesma forma.
Como vê o facto de filhos e pais não se poderem ver por agora para evitarem o contágio?
Neste momento a política de afetos tem de funcionar à distância, mesmo que haja esta questão: o afeto consegue anular a distância? A ciência não diz nada sobre isso, mas consegue dar meios para que uma questão humana, a do afeto, seja transmitida de outra forma que não com abraços e beijinhos. É até uma situação de reinvenção social, e não vai ser uma coisa por dois meses, iremos ter cuidado a cumprimentar durante muito tempo.
A ciência não terá a obrigação de se humanizar em face do que se assiste?
Calma... a ciência não é algo desumano, pelo contrário, é do mais humano que conheço. Este impulso que a espécie humana tem e que lhe garantiu a sobrevivência para chegar aos sete mil milhões de humanos no planeta não existiria sem ciência, nem estaríamos aqui nesta quantidade e nesta longevidade. A ciência assegura a continuação e a duração do humano, portanto não se pode dizer que é um conhecimento desumano. Não somos entes deslocados do mundo, somos feitos de células, estas de moléculas que obedecem às leis da física e da química. E não deixamos de poder amar ao saber como somos feitos, portanto a imagem de desumanidade que se cola à ciência é equívoca. Os cientistas que conheço são humanos e, espero voltar ao tempo em que os abraçava - eles eram feitos de carne e osso - apesar de neste momento não lhes poder tocar. Não conheço nenhum cientista extraterrestre. A ciência é um processo que não nos dá verdades absolutas, mas chegámos até aqui com este saber e iremos chegar mais além e com mais saber. É um caminho que conta também com a capacidade humana de compreender onde estamos e quem somos. Estas questões humanas estão escritas desde há muito no Templo de Apolo, em Delfos.
O que irá acontecer à cultura do individualismo que as sociedades vinham a valorizar perante a vivência deste isolamento social?
Não podemos fechar-nos em nós próprios porque desse modo não existe ciência e sociedade - não há coisa nenhuma. O homem é um animal social desde o neandertal e é essa ligação entre humanos que tem garantido a construção das sociedades e a nossa civilização. Assistimos a processos de maior ou menor agregação, maior ou menor individualização ou coletivização, mas uma coisa é certa, se não estivermos juntos não saberemos enfrentar dificuldades como até agora. A frase do Evangelho "Ama o teu próximo" é verdadeira, pois não temos mais ninguém para amar senão aqueles com quem partilhamos este planeta. Espero que esta crise nos leve a tomar consciência dessa proximidade com os outros e que o facto de estarmos isolados fisicamente neste momento temporário não poderá significar que não iremos precisar de voltar a estar juntos. E a nossa cultura tem aí um grande papel a desempenhar logo que possa voltar a acontecer, pois por agora não podemos estar juntos numa sala de espetáculos.
Não acredita no futuro dessa cultura do individualismo?
Talvez mais do que o individualismo é a do egoísmo, que sempre existiu, e pior do que isso é a do egoísmo de grupo. A questão dos nacionalismos era muito patente que estava em crescendo, como a da exclusão do outro, a da diferença com base na cor da pele ou da religião. Não garanto que não continue a acontecer, pois se não temos ainda vacina para esta epidemia, também será difícil encontrar aquela para os problemas da sociedade. Não tenho a ilusão de pensar que o mundo vai mudar subitamente. Não, está a ser bastante sacudido neste momento, mas este mundo como conhecemos vem assim desde o tempo dos gregos.
O mundo não mudará assim tanto com este pesadelo?
Não vai ser totalmente diferente, mas vai haver diferenças. Espero que certos comportamentos mudem, que a ciência seja mais percebida como um bem comum, que as nações saibam enfrentar as alterações climáticas, mas não tenho a certeza se o mundo vai ser melhor depois do que estamos a viver. Não se pode adivinhar o futuro nem, por exemplo, se irão acontecer grandes alterações na economia como tanto se fala. Ninguém o pode afirmar, para mim estão a confundir a realidade com os seus próprios desejos. Eu também posso estar a fazer isso, afinal projetamos sempre no futuro os nossos desejos. Mas de uma coisa estou certo, este tempo por que estamos a passar não será o fim da diferença entre as visões do mundo.
O secretário-geral da ONU, António Guterres, pediu um cessar-fogo dos conflitos em todo o mundo. O que acha desta proposta?
Eu percebo a intenção dele - de esperança e de paz -, mas é um bocadinho ingénua. Vimos em toda a história que nunca houve um período de paz. O conflito não vai acabar na espécie humana, vamos, sim, continuar a ser humanos noutras circunstâncias. O importante é saber como serão distribuídos os recursos acumulados.
Vai pôr-se a velha e grande questão sobre a diferença entre ricos e pobres?
Essa é uma questão permanente e não existe resposta fácil para ela. Seria bom dizer que vai haver mais equidade, no entanto, basta ver os EUA, que estão a ter esta epidemia em força agora e em que os pobres são os mais afetados. Isso é muito visível nesse país porque não têm um serviço nacional de saúde como os países da Europa. Os pobres irão sofrer mais nos EUA, o que nos leva até ao resultado das próximas eleições em novembro: esta epidemia pode mudar as intenções de voto nas próximas eleições? Não o sei, mas gostava que o atual presidente não pudesse continuar mais quatro anos.
Escreveu sobre a visita de Einstein a Lisboa em 1925 e de como foi ignorado...
Ele passou em Lisboa quando viajava de navio da Alemanha para o Brasil, onde foi recebido com todas as honras. Ele já era prémio Nobel, mas cá não foi reconhecido. Passeou na Baixa, foi aos Jerónimos e ao Castelo de São Jorge, reparou que as nossas varinas eram muito bonitas... foi pena que não tivesse encontrado o Fernando Pessoa, que andava pela Baixa nessa altura. Seria o encontro de dois génios, mas se passaram um pelo outro não se reconheceram. Até porque o Pessoa era desconhecido à época entre nós. Portanto, houve duas pessoas a quem não prestámos atenção, o que mostra que não é só para com os estrangeiros que temos dívidas. Estávamos na República e a educação, a ciência e a cultura científica eram muito embrionárias. Houve uma guerra mundial, a gripe espanhola, o assassínio do presidente Sidónio, golpes de estado sucessivos e uma crise económica grave. Depois a ciência não melhorou, veja-se a história de perseguições e censura aos cientistas. A nossa história do século XX não foi muito amiga da ciência e só mudou em 1974, mais em 1986 com a adesão à União Europeia e ainda mais em 1995, quando Mariano Gago foi ministro da Ciência e Tecnologia e colocou a questão da ciência no Conselho de Ministros e da cultura científica na sociedade. Neste momento, quando vem um cientista prémio Nobel a Lisboa toda a gente sabe.
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