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segunda-feira, 17 de janeiro de 2022

"O remorso de um dissidente: Alexander Zinoviev sobre Stalin e a desintegração da URSS"

 




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Alexander Zinoviev (1922-2006) foi um filósofo, sociólogo, matemático e escritor russo. Zinoviev é um caso extraordinário de um dissidente na União Soviética que, após a desintegração desta, retratou-se pelo seu anti-sovietismo e anti-stalinismo. Quando jovem, em 1939, foi preso por estar envolvido em uma conspiração para matar Joseph Stalin. Foi como chefe e professor do Departamento de Lógica da Universidade Estadual de Moscou que Zinoviev adquiriu a sua reputação como dissidente. Ele deixou a União Soviética em 1978 e passou a viver na Europa Ocidental até 1999.

Tendo a oportunidade de viver tanto dentro do sistema socialista na URSS quanto do sistema capitalista da Europa Ocidental, Zinoviev alterou os seus pensamentos após os eventos contrarrevolucionários na União Soviética (1989-1991). Ele se arrependeu profundamente pelo seu posicionamento anti-soviético anterior e pediu perdão ao povo russo.

Ele escreveu em um de seus livros:

“(...) o comunismo foi tão pertinente para a Rússia e entrou com tanta força no modo de vida, na mentalidade do povo russo, que a destruição do comunismo foi equivalente à destruição da própria Rússia e de seu povo como um povo histórico. (...) Em poucas palavras, eles [soldados da guerra fria ocidentais] miraram no comunismo, mas mataram a Rússia”. (Alexander Zinoviev, Russkaya tragediya (publicado originalmente em 2002), em AZ, Nesostoyavshiisya proekt, Moscou: Astrel’ 2009, p. 409).

Em entrevista concedida no ano de 2005, ele disse que sua prisão em 1939 foi justificável, já que fez parte do complô que planejava a morte de Stalin. Sobre Joseph Stalin – a quem Zinoviev odiou durante a maior parte de sua vida – ele disse, em 1993:

“Eu o considero como uma das maiores pessoas da história da humanidade. Na minha opinião, em relação à história da Rússia, ele foi até maior do que Lênin. Eu era anti-stalinista até a sua morte, mas sempre o considerei como uma personalidade brilhante.”

A respeito de seu anti-stalinismo e sua prisão por conspirar o assassinato de Stalin, Alexander Zinoviev disse:

“Eu já era um anti-stalinista convicto aos meus 17 anos... A ideia de matar Stalin preenchia meus pensamentos e sentimentos... Nós estudamos as possibilidades ‘técnicas’ para um ataque... Até praticamos isso. Se eu tivesse sido condenado à morte em 1939, seria uma decisão justa. Eu tinha um plano para matar Stalin; isso não era um crime? Quando Stalin ainda estava vivo, eu via tudo de uma forma diferente, mas, quando olho para trás, posso afirmar que Stalin foi o maior indivíduo deste século, o maior gênio político. Adotar uma atitude científica em relação a uma pessoa é muito diferente de ter sobre a pessoa uma atitude pessoal.”

Zinoviev não foi nem um comunista e muito menos um Marxista-leninista. No entanto, após a derrubada do socialismo na URSS, ele se tornou um grande defensor das conquistas do sistema socialista. Ele reconheceu que, apesar de seus problemas e ineficiências, o sistema socialista era muito mais humano do que a barbárie causada pelo capitalismo.

Aqui estão algumas observações interessantes de sua entrevista concedida à revista francesa Figaro (1999):

Pergunta: Então a luta contra o comunismo foi uma conspiração para destruir a Rússia?

ZINOVIEV: Precisamente. Digo isso porque já fui cúmplice involuntário dessa ação que achei vergonhosa. 

O Ocidente quis, e programou, a catástrofe russa. Eu li documentos e participei das pesquisas que, sob um pretexto de luta ideológica, contribuiu para a destruição da Rússia. Isso passou a ser tão insuportável para mim que não podia mais ficar no mesmo campo daqueles que destruíram o meu povo e o meu país. O Ocidente não é um estranho para mim, mas o considero como um império inimigo.

***

“Após a queda do comunismo na Europa Oriental, um ataque maciço aos direitos sociais dos cidadãos foi lançado no Ocidente. Hoje, os socialistas que estão no poder na maioria dos países europeus, buscam políticas de desmantelamento do sistema de seguridade social, destruindo tudo o que era socialista nos países capitalistas. Não existe mais uma força política no Ocidente capaz de proteger os cidadãos comuns. 

A existência de partidos políticos é uma mera formalidade. Eles irão se diferenciar cada vez menos com o passar do tempo. A guerra nos Balcãs foi tudo, menos democrática. Ainda assim, a guerra foi perpetrada pelos socialistas que historicamente se opuseram a esse tipo de empreendimento. Ambientalistas, que estão no poder em alguns países, saudaram a catástrofe ambiental causada pelos bombardeios da OTAN. Até ousaram afirmar que as bombas contendo urânio empobrecido não são perigosas para o meio ambiente, ainda que os soldados que as carregam usem macacões de proteção especiais. Assim, a democracia está gradualmente desaparecendo da estrutura social do Ocidente. 

O totalitarismo está se espalhando por toda parte porque a estrutura supranacional impõe suas leis aos estados individuais. Essa superestrutura antidemocrática dá ordens, impõe sanções, organiza embargos, lança bombas, causa fome. Até Clinton obedece a isto. 

O totalitarismo financeiro subjugou o poder político. Emoções e compaixão são estranhas ao totalitarismo financeiro frio. Comparada com a ditadura financeira, a ditadura política é humana. A resistência foi possível dentro das ditaduras mais brutais. A rebelião contra os bancos é impossível.”

“Um cidadão ocidental está sofrendo uma lavagem cerebral muito maior do que um cidadão soviético sofreu durante a era da propaganda comunista. Na ideologia, o principal não são as ideias, mas sim os mecanismos de sua distribuição. O poder da mídia ocidental, por exemplo, é incomparavelmente maior do que o dos mecanismos de propaganda do Vaticano quando estava no auge de seu poder. E isso não apenas em relação ao cinema, à literatura, filosofia – todas as manobras de influência e mecanismos usados para a disseminação da cultura, em seu sentido mais amplo, trabalham para esta direção. Ao menor impulso, todos aqueles que trabalham nesta área respondem com tão grande consistência, que é difícil não pensar que todas as ordens vêm de uma única fonte de poder.”

“Na União Soviética, 10 a 12% da população ativa trabalhava na área de gestão e administração do país. Nos Estados Unidos, este número é de 16 a 20%. Contudo, a URSS foi criticada por sua economia planejada e pelo peso do aparato burocrático. Duas mil pessoas trabalhavam no Comitê Central do Partido Comunista. O aparelho do Partido Comunista atingiu 150 mil trabalhadores. Hoje, no Ocidente, você encontrará dezenas, até mesmo centenas de empresas nos setores industrial e bancário que empregam mais pessoas. 

O aparato burocrático do Partido Comunista Soviético era insignificante se comparado com o pessoal das grandes corporações transnacionais do Ocidente.”

Do In Defense of Communism.

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