Há coisas que nos passam pelos olhos que das duas uma:
Ou são mentiras deliberadas e quem as conta não se importa de as contar ou quem as escreve pensa que somos todos uma cambada de acéfalos.
Que o tema dos refugiados é um tema sobre o qual as personalidades gostam de discorrer, muitas vezes puxando o pé para a caridadezinha porque coitadinhos temos que os ajudar, já todos estamos mais do que habituados.
Agora, que pessoas com responsabilidades políticas «à esquerda» façam deste tema uma bandeira, por sistema, e sejam, concomitantemente, directamente responsáveis pela ausência total e absoluta de apoio aos refugiados é absurdo, ofensivo e de uma grande falta de vergonha.
O Bloco de Esquerda, mais concretamente o seu Vereador Manuel Grilo, têm sido estrelas em Lisboa pela total ausência de políticas na área social e na educação, causando directamente situações de aumento de privação no quadro de um momento pandémico que, por si só, agravou os muitos casos de pobreza, sem abrigo e, particularmente, as condições em que estão a ser recebidos os requerentes de asilo na cidade de Lisboa.
Além de não ser novidade que o Bloco de Esquerda e Manuel Grilo desperdiçaram o financiamento de um milhão de euros para a construção de um centro de acolhimento para refugiados, também não é novidade que não há participação popular nenhuma na construção do plano municipal para a integração de migrantes de Lisboa nem tão pouco das associações que os representam.
Mas, sobretudo, não é novidade que este pelouro simplesmente desapareceu quando se detectou que, em Lisboa, o Centro Português para Refugiados mantinha protocolos com hostéis que alojavam 60 a 90 pessoas em locais onde não cabiam mais de 30. Quando, por exemplo, foram encontradas 200 pessoas num local com capacidade para 60, algumas infectadas com CoVid-19 e em condições de indignidade total. Que estas pessoas estavam a passar fome, algumas estavam já subnutridas, muitas com problemas mentais, que muitas estavam em situação de trabalho irregular e exploração, que as condições de salubridade dos alojamentos eram de tal forma que havia pragas de percevejos que se alastraram a casas contíguas.
Estas pessoas não tinham sequer um analgésico ou anti-inflamatório, não tinham auxílio médico ou medicamentoso, informação sobre a covid-19, uma máscara, roupa, sapatos, nada.
M., perdeu o bebé por falta de assistência médica. A., doente crónica, não tinha medicação para a diabetes. As mulheres tinham infeções vaginais e num dos hostéis apenas lhes era permitido usar a máquina de lavar roupa uma vez por semana (para 12 pessoas num quarto de 6). Y não tinha onde ficar e não lhe garantiam nem o quarto a que tinha direito nem o valor a que tinha direito mensalmente.
Duas casas de banho para 60 homens noutra das pensões.
A maioria sem falar ou entender português, sem apoio jurídico, sem tradução.
Como é que eu sei isto? Porque fui, porta a porta, bater em cada um dos hostéis e falei com eles. Porque quem os sinalizou foram redes de solidariedade informal que os apoiavam do seu bolso e nunca obtiveram qualquer resposta do Pelouro do Bloco de Esquerda. Quem assumiu a ajuda a cerca de 300 requerentes de asilo foi a Junta de Freguesia de Arroios, em articulação com a Protecção Civil Municipal e estas redes informais, até ao dia de hoje, garantindo a distribuição de alimentos, roupa, medicação e articulação com as entidades competentes. Distribuindo informação em várias línguas.
O meu telemóvel e o de várias outras pessoas ainda hoje é o único contacto que têm e o que resolve várias situações.
Todas as entidades acabaram por se reunir e neste quadro, quem nunca se pronunciou? Quem nunca apareceu? Quem nunca tomou nenhuma medida? Precisamente: o Bloco de Esquerda. Nem uma vez. O titular do Pelouro.
Agora vamos ler um excerto do texto do deputado municipal do Bloco de Esquerda, Ricardo Moreira, publicado no Jornal Económico:
“Marisa Matias já o disse: um novo campo não é solução, a solução é a recolocação urgente destas pessoas nos vários países da Europa. A solução é a solidariedade.
O Governo português afirmou que está disponível para acolher 100 pessoas do campo de Mória, mas a Câmara Municipal de Lisboa aprovou na passada semana uma moção do vereador Manuel Grilo do Bloco de Esquerda (que tem um acordo de governação com o PS) para acolher mais refugiados, para se dar mais tempo aos programas de acolhimento e para se investir mais nas condições de habitação. A solução é a solidariedade.”
E o que dizer sobre a amiga e aliada de Tsipras (primeiro-ministro grego entre 21 de setembro de 2015 e 8 de julho de 2019) Marisa Matias, que durante o seu governo criou dezenas de campos de refugiados com condições miseráveis – Idomeini, Nea Kavala, Skaramangas, Souda Camp, etc.
Na verdade, se dependerem das soluções do Bloco de Esquerda e de Manuel Grilo, estes refugiados encontrarão silêncio, fome, ausência de apoio e abandono total.
E sim, desafio quem quer que seja a provar que estou errada.
Pelo caminho, leiam outras fontes aqui, aqui, aqui ou a intervenção do deputado Miguel Graça na sessão de 28 de Abril de 2020 na Assembleia Municipal de Lisboa:
Esta tarde em sessão de Assembleia Municipal, o Deputado Municipal dos Cidadãos por Lisboa Miguel Graça questionou o Vereador dos Direitos Sociais Manuel Grilo sobre a inação do seu Pelouro durante a Pandemia Covid-19, abandonando à sua sorte os lisboetas mais desprotegidos, como é o caso de muitos utentes dos lares, das pessoas em situação de sem-abrigo, dos imigrantes e dos refugiados. Frisou ainda que o Vereador se desmultiplica em contactos com a Comunicação Social mas é incapaz de montar as respostas sociais que urge levar a cabo. O Deputado referiu ainda a estranheza das recentes declarações do Vereador que alegou desconhecer as condições de alojamento dos requerentes de asilo, apesar do seu gabinete ter estado presente em eventos em que estas condições foram descritas. “O Sr. Vereador Manuel Grilo acha que não está nas suas obrigações colaborar com o Estado, com as entidades de acolhimento ou com as autoridades de saúde no sentido de arranjar soluções condignas para os requerentes de asilo que ainda não têm resposta e que esperam em Lisboa por uma? Não existem aqui refugiados de uns e refugiados de outros. Recolocados, reinstalados ou espontâneos, são todos seres humanos, são todos cidadãos e, enquanto aqui estiverem, são todos lisboetas, Sr. Vereador… “ referiu Miguel Graça. 28/04/2020
manifesto74.pt
Sem comentários:
Enviar um comentário