A extrema-direita apostava em vencer as eleições regionais e exigir a queda do governo. Acabou derrotada por cerca de oito pontos percentuais. Depois de mobilizar multidões para as ruas, o movimento de protesto popular das “sardinhas” vê assim cumprido um dos seus primeiros objetivos.
Foto de 6000 sardine, movimento italiano contra a extrema-direita
O líder da Liga, o partido de extrema-direita italiana, tinha planeado que as eleições regionais de Emilia-Romagna seriam um passo importante para o seu regresso ao poder. Matteo Salvini pretendia ganhar a região, outrora maioritariamente comunista e sempre fiel à esquerda, para depois reclamar a queda do governo de coligação entre os Democratas e o Movimento 5 Estrelas.
Uma aposta falhada, para já. A região do norte de Itália voltou a preferir a esquerda. Stefano Bonaccini, governador em funções apoiado por uma coligação de centro-esquerda, ganhou com 51,42%. A candidata apoiada por Salvini, teve 43,6%. A afluência às urnas reforçou a mensagem política: mais cerca de 30% dos eleitores foram votar este domingo na região.
O “despejo” não aconteceu mas as sardinhas mantêm-se alerta
As eleições eram locais mas as ilações seriam sempre nacionais. O líder do Partido Democrata, Nicola Zingaretti, não tardou a declarar à Reuters que “a maioria de governo sai mais forte” e que a tentativa de Salvini de “empurrar para fora o governo” falhou.
Já Salvini, que andava em tour pela Emilia-Romagna há muito, declarou-se “absolutamente satisfeito” com os resultados que causarão, diz, erosão no poder da esquerda. Se tinha sido ele o primeiro a tornar estas eleições num plebiscito nacional ao dizer que constituiriam “uma ordem de despejo” ao governo, também tinha sido a sua gabarolice acerca dos números de presenças nos seus comícios que levou um grupo de amigos a convocar a primeira manifestação do movimento das sardinhas.
Este movimento anti-fascista de base mobilizou milhares de pessoas e encheu praças em vários pontos do país, especialmente na zona que assistia a uma campanha eleitoral renhida. Salvini estava então num crescendo nas sondagens para as eleições locais que parecia imparável. Mas a extrema-direita esbarrou com as sardinhas.
Numa das páginas que utilizam para comunicar, as sardinhas declaram-se “felizes” por “as palavras memória e resistência ecoarem tão forte”, por se poder ganhar à propaganda profissional e à “enxurrada de dinheiro” com meios como “a gratuitidade, as relações humanas, a criatividade e a empatia”, por se ter redescoberto “essa coisa maravilhosa que é a política”.
Mas o movimento sabe que o trabalho não acabou: “a fase mais difícil começa” agora. “Estaremos atentos e vigilantes onde já se votou, estaremos aguerridos e presentes onde se vai ainda votar”, acrescentam, prometendo que “as sardinhas estarão sempre lá”, com “os seus corpos não manipuláveis, com cérebros que não mordem, com ouvidos que exigem respeito e com olhos que se iluminam apenas para assistir a performances dignas da palavra “beleza”.”
O apagão das Cinco Estrelas e o neo-fascismo que persiste
O resultado eleitoral confirma ainda outras tendências políticas que já se conheciam. O movimento populista Cinco Estrelas, que tinha sido um fenómeno de crescimento, entrando no governo de Itália em coligação primeiro com a extrema-direita, depois com o centro esquerda, está em processo de dissolução.
O partido anti-partidos criado em 2009 pelo cómico Beppe Grillo prometera nada menos do que uma revolução no sistema político. Agora com o seu candidato em Emilia-Romagna a ter apenas 3,4% e na Calabria 7%, os resultados eleitorais afundam ainda mais um partido em debandada de quadros. Muitos saíram para a extrema-direita.
O próprio líder, Luigi di Maio, Ministro dos Negócios Estrangeiros, demitiu-se da chefia do partido devidos às “facadas nas costas” de que se queixa. Apesar de deixar a liderança mantém o cargo governamental e assegura que a legislatura irá até ao fim.
Não passa despercebido também o resultado em Emilia-Romagna do movimento Irmãos de Itália. Com 8,59%, ficaram em terceiro lugar, o partido que faz gala da sua proximidade com Marine Le Pen elegeu três elementos para a Assembleia Legislativa Regional.
Fundado em 2012, o partido reclama-se da tradição neo-fascista que remonta primeiro ao Movimento Social Italiano, partido sucessor do Partido Nacional Fascista depois deste ter sido interditado, depois à Aliança Nacional, que se tinha dissolvido no Povo da Liberdade, a coligação de direita fundada por Berlusconi. Com o falhanço desta integração, vários dos neo-fascistas irão alinhar com este novo projeto.
Este partido começa a descolar nas eleições europeias de 2014 nas quais, com pouco mais de um milhão de votos 3,66%, tinha ficado à beira do patamar de 4% que permitia a eleição. Nas passadas legislativas obteve 4,4%, duplicando o resultado anterior e elegendo 32 deputados e 18 senadores.
Calábria: a vitória da direita que não lhes salvou o dia
Apesar da derrota a norte, a direita ganhou a sul nas eleições regionais da Calabria que também ocorreram este domingo. Salvini, líder de um partido que outrora era regionalista e até separatista do norte, não pode propriamente reivindicar a vitória para si porque a candidata da coligação de direita, Jole Santelli, pertence ao partido de Berlusconi. Mas ainda assim o resultado é auspicioso para tentar partir à conquista do sul do país. Os Irmãos de Itália também têm razões para otimismo nesta região: com 10,85% elegeram quatro pessoas para a Assembleia Legislativas Regionais.
Santelli venceu com 55,29 contra 30,14% do candidato do centro-esquerda, Fillippo Callipo, 7,35% do candidato do Cinco Estrelas e 7,22% de um candidato regionalista. Um panorama radicalmente das eleições de 2014, nas quais Mario Oliverio, do Partido Democrata, tinha sido eleito com 61,4%.
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