A ligar as margens do Sado, em Alcácer do Sal, desde 1945, a estrutura ao estilo Eiffel destinava-se à passagem de comboios e teve uma existência anterior, unindo as margens de outro rio. Poucos sabem também que a ponte teve um "canhão" e um "carrossel".
A ponte rodoviária metálica sobre o Sado é uma das principais imagens que fica na memória de quem visita Alcácer do Sal. Parece estar ali desde sempre, imutável e bela na sua robustez que faz lembrar outras eras.
Os mais velhos, no entanto, ainda se recordam da anterior e instável passagem, mas poucos saberão que a atual ponte foi criada para unir as margens de outro rio e receber comboios, em vez de automóveis. Ganhou uma nova “vida” por iniciativa do conhecido ministro das Obras Públicas e Comunicações, Duarte Pacheco.
Efetivamente, aquela que foi durante muito tempo passagem obrigatório no percurso de para o Algarve, destinava-se a permanecer sobre o rio Judeu, no nunca concluído Ramal Ferroviário de Cacilhas, iniciado em 1901, ao longo do arco ribeirinho do Tejo, ligando os concelhos de Barreiro, Seixal e Almada.
Apenas um troço esteve em funcionamento, entre 1923 e 1969. Em 1940, Duarte Pacheco decidiu que parte das estruturas não utilizadas deveriam ser reaproveitadas em Alcácer do Sal, onde a antiga travessia em madeira que já se mostrava desadequada e insuficiente para as necessidades.
Assim seria, embora o governante nunca o chegasse a ver, porque morreria num acidente de viação – entre visitas a obras – dois anos antes do fim dos trabalhos.
A obra, dirigida pelo engenheiro Carlos Couvreur, seria, aliás, mais complexa que o esperado, obrigado à utilização de diversas técnicas construtivas, como estacaria cravada na rocha, 19 metros abaixo do leito do rio.
As águas inundavam o estaleiro, fazendo estragos (na imagem 5), e o constante movimento das marés dificultava muito os trabalhos, nomeadamente o assentamento da estrutura metálica sobre os encontros de betão junto às margens, que se fez à custa da utilização de barcaças e obrigou a várias tentativas (na imagem 4).
No final, o investimento ascendeu a 2.3 milhões de escudos, para pouco mais de 107 metros de extensão.
A inauguração foi a 15 de janeiro de 1945.
Os mais jovens também não sabem que o tramo central levantava para permitir a passagem de embarcações e que o atual tabuleiro, uma laje em betão, não é o original.
Inicialmente, existia um pavimento em madeira, responsável por muitas noites mal dormidas para quem habitava nas proximidades, pois a circulação de camiões sobre as travessas alinhadas originava um ruído ensurdecedor, semelhante a rajadas de metralhadora, tanto que foi batizado de “canhão”.
Quando, em 1965, foi instalado um novo tabuleiro em grade metálica, começaram outros problemas. Numa terra ainda fortemente rural, era frequente os rebanhos passarem na ponte e os pobres animais ficavam com as patas presas nos orifícios, o que provocava grandes constrangimentos aos próprios e aos pastores, tentando salvar as suas ovelhas e cabras de se magoarem a sério.
A partir dos anos 80 do século XX, a beleza desta estrutura foi ligeiramente ofuscada pela construção paralela de um pontão, que assegurava os trajetos norte-sul, atenuando os engarrafamentos e a sobrecarga da velha travessia. Com a criação de uma variante rodoviária, que retirou parte do trânsito do interior de Alcácer do Sal, o pontão provisório acabaria por ser demolido e a bela estrutura metálica foi alvo de profundas obras de requalificação, que lhe devolveram o antigo esplendor e firmeza, já em 2007-2008.
À margem
Se a ponte metálica tinha um” canhão”, a antiga travessia em madeira tinha um “carrossel”, ou pelo menos era assim que era vista a trepidação provocada pelo trânsito de veículos, que fazia estremecer toda a estrutura. O balanço era aproveitado pela “gaiatagem”, que se sentava nas guardas e gritava de excitação com o movimento, como se de um divertimento de feira se tratasse.
A nova construção ao “estilo Eiffel”, por outro lado e como as imagens demonstram, foi motivo de grande atração por parte de toda a população, que, independentemente da idade ou estrato social, marcava presença para acompanhar os trabalhos e dar o seu palpite. Quando a estrutura foi finalmente aberta ao público e ao tráfego automóvel, não demorou muito até que começasse a ser usada como prancha de mergulho pelos rapazes mais afoitos.
Como seria de esperar, todos os anos, o Sado reclamava algumas destas vidas jovens e atrevidas, tal como reclamou e levou os belos repuxos ali instalados pelo município nos anos 90, a fazer lembrar o lago Léman, na Suíça, mas que em vez de jorrarem água, lançavam lodo em grande quantidade e altitude.
Mas isso é outra história…
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Já aqui antes falei das pontes de Alcácer e das peripécias que rodearam a reconstrução da travessia que caiu no final do século XIX.
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Fontes
Arquivo Municipal de Alcácer do Sal
Janela para a História
PT/AHMALCS/CMALCS/CAMARA/12/5A/02/002
Atos Oficiais
PT/AHMALCS/CMALCS/CAMARA/ 02/03/022
Sistema de Informação para o Património Arquitetónico
http://www.monumentos.pt/Site/APP_PagesUser/SIPA.aspx?id=35385
http://www.tpfplanege.pt/files_tpfplanege/estaleiro_21043_2.pdf
http://www.betar.pt/upload/pdf/pdf_1318953538.pdf
http://www.opway.pt/opway/homepage.asp?Language=PT
https://pt.wikipedia.org/wiki/Ramal_do_Seixal
Imagens
https://senhorenfermeiro.blogs.sapo.pt/barreiro-antiga-ponte-barreiro-seixal-14630
Arquivo Municipal de Alcácer do Sal
Reprodução a partir de imagem original de Manuel João da Silva
Arquivo Histórico Municipal – Fundo Baltazar Flávio da Silva
PT/AHMALCA/CMALCS/BFS/ 01/07/001-009
https://osaldahistoria.blogs.sapo.pt/
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