É um pouco milagroso que tanta arte e arquitetura europeias tenham sobrevivido, dada a frequência com que o continente se meteu em guerras que destruíram quase todo o resto. O "Retábulo de Gante", ou "Adoração do Cordeiro Sagrado", pode ser o caso mais famoso. É também, de longe, a obra de arte mais roubada da história, vítima de 13 crimes diferentes nos últimos 600 anos. Concluída em 1432 pelos irmãos Hubert e Jan van Eyck, e considerada um dos maiores tesouros do mundo, a enorme pintura com vários painéis (um políptico) resistiu a tudo. |
A obra, que também se destaca por ter uma ovelha muito feia, foi roubada pela primeira vez por Napoleão.
O autoproclamado imperador francês levou a como troféu de guerra, mas a obra foi devolvida em 1815 depois de sua derrota em Waterloo. Os alemães a levaram de novo durante a Primeira Guerra Mundial, mas tiveram que devolver como parte do tratado de Versalhes ao término do conflito.
De fato, o retábulo quase foi destruído em um incêndio, quase foi queimado por calvinistas rebeldes, foi forjado, saqueado, desmembrado, censurado, vendido por um clérigo renegado, então roubado repetidamente durante a segunda guerra mundial... Göring o queria para sua coleção particular, Hitler como peça central de seu super-museu em toda a cidade.
Em 1934 ocorreu um dos roubos mais soados da obra, um cujo mistério ainda segue sem resolver em nossos dias. Um dos painéis deste políptico desapareceu. A polícia belga recebeu várias pedidos de resgate pedindo um milhão de francos. Enquanto isso, o restaurador e falsificador Jef Van der Veken se apressava em pintar uma réplica para substituir o original.
Durante anos achou-se que talentoso restaurador era o autor do crime, sem provas. Após a conclusão da sua cópia, houve fortes rumores persistentes de que o original da obra estava abaixo de sua cópia. Inegavelmente, a alta qualidade da cópia desempenhava um papel importante nesta afirmação. Investigações técnicas posteriores mostraram, no entanto, que a cópia foi feita em um suporte de madeira, o que não tinha nenhuma relação com a obra original.
Vista do políptico fechado (painéis traseiros).
O restaurador, para harmonizar sua cópia com a aparência dos outros painéis do "Retábulo de Gante", aplicou uma camada de cera para criar uma pátina semelhante. Van der Veken sutilmente indicou que seu trabalho era uma cópia, dando a um dos cavaleiros as características faciais do então rei belga Leopoldo III.
Em 1940 Hitler decidiu que queria o quadro para seu grande museu, de modo que quando os nazistas invadiram a Bélgica, as autoridades belgas decidiram enviar a obra à França.
Má ideia, Os nazistas interceptaram-na e guardaram-na, junto a milhares de outras obras roubadas, na mina de sal de Altaussee, na Áustria.
Na verdade, os nazistas e Hitler, em particular, estavam absolutamente convencidos de que o ocultismo e o sobrenatural do quadro eram reais. Eles realmente achavam que o retábulo era um mapa para as relíquias da crucificação de Cristo.
A história de como recuperaram essas obras é épica em si mesma porque inclui a um comando aliado chamado "The Monuments Men" que era especializado precisamente em recuperar obras de arte. Se você quiser saber mais recomendamos o bom filme homônimo, "Caçadores de Obras-Primas", de 2014, dirigido por George Clooney.
Em 2019, a obra voltou a ocupar as manchetes porque sua restauração revelou que a ovelha que aparece em um dos painéis tem uma cara surpreendentemente humana e em absoluto realista. A restauração também permitiu que a obra fosse investigada, quando os peritos revelaram ou um dado inquietante: Van der Veken não tinha pintado sua cópia sobre o original como alguns acreditavam. Era inocente e sua cópia era simplesmente isso, uma fabulosa cópia.
A morte de um traficante de arte revelou uma nota de resgate que não foi enviada à polícia. Nela estava escrito que a obra estava oculta em algum lugar onde ninguém poderia levar sem despertar a atenção do público.
Desde então a obra é um caso aberto para a polícia Belga e chegaram a praticar análises de DNA sobre a saliva do envelope em que chegaram os pedidos de resgate.
Tudo em vão. O painel original segue desaparecido e constitui um dos grandes mistérios da pintura.
É uma história cheia de muitas reviravoltas bizarras e apenas uma das muitas na longa história do retábulo. Mas por que? O que há nessa obra, além do fascínio oculto, que atraiu tanta atenção indesejada? Com onze metros de altura por 4,5 metros de largura e composta por 24 painéis, a obra redefiniu a arte e tornou-se instantaneamente famosa. Com efeito, Jan van Eyck, que substituiu seu irmão mais velho, Hubert, criou uma série de pioneirismo na arte.
O retábulo foi o primeiro a exibir um interior realista, a primeira paisagem genuína, a primeira paisagem urbana adequada, os primeiros nus tangíveis, os primeiros retratos renascentistas realistas. Na série de vídeos acima e abaixo, dos historiadores da arte Beth Harris e Steven Zucker, você pode aprender muito mais sobre as qualidades que tornaram o "Retábulo de Gante" irresistível.
Sem comentários:
Enviar um comentário