O desporto asiático chamado buzkashi, no qual jogadores a cavalo lutam por uma cabra ou bezerro decapitado e estripado, é certamente para os observadores ocidentais uma das competições mais estranhas do mundo. Embora tenha sido descrito como "polo com uma cabra sem cabeça", a comparação não se sustenta. As regras variam de acordo com o país, mas a maioria das partidas de buzkashi não tem times, nem relógio, nem campo de jogo claramente definido. É uma guerra de todos contra todos, em que o vencedor é o cavaleiro que carrega com sucesso a carcaça além de um ponto definido ou a joga em uma determinada área. |
Desde o momento em que ouviu falar desse esporte radical pela primeira vez, a fotógrafa espanhola Anna Huix sabia que queria filmar uma partida. Ela finalmente teve sua chance em março de 2019 em uma viagem de duas semanas ao Tajiquistão, uma antiga república soviética montanhosa e sem litoral, que faz fronteira com o Afeganistão, Uzbequistão e China.
- "Sou fascinada por tradições, e o buzkashi é uma tradição muito antiga", disse Anna. - "Eu também estava interessada no fato de que quase não tem regras. Parecia haver algo selvagem e cru nisso."
Foi assim que Anna, viajando com uma jornalista sul-africana, acabou entre os vários milhares de espectadores de uma partida de buzkashi em um vale poeirento na estepe da Ásia Central.
Como as duas únicas mulheres presentes, e também as únicas pessoas que não eram locais, a jornalista e Anna -que estava grávida de seis meses- foram tratadas como VIPs pela multidão. Ofereceram farta comida e bebida e as convidaram a ficar na carroceria de um caminhão para que tivessem uma visualização privilegiada.
- "Perguntei aos homens mais velhos por que não havia mulheres e ele me disse que no Tajiquistão os homens gostam de buzkashi e as mulheres gostam de casamentos", disse ela. - "Eles gostaram do fato de estarmos interessadas."
Uma vez que o jogo começou, Anna achou difícil acompanhar a ação, o que não surpreende em um jogo com cerca de 80 cavaleiros, todos lutando pela mesma carcaça de animal. Na versão tadjique do jogo, toda vez que alguém consegue arremessar a carcaça dentro de um círculo marcado, ganha um prêmio e o jogo recomeça.
Os prêmios incluem ovelhas, tapetes, carros e, às vezes, uma casa. Alguns dos jogadores possuem seus próprios cavalos; outros são contratados pelo proprietário do cavalo ou concordam em dividir quaisquer ganhos com o proprietário. Até onde Anna sabia, qualquer pessoa que quisesse jogar era bem-vinda para se juntar ao jogo.
A partida que Anna observou durou várias horas, só terminou quando os cavalos levantaram tanta poeira que se tornou impossível vê-la. Após o jogo, muitos dos competidores posaram alegremente para a fotógrafa em seus trajes esportivos tradicionais, incluindo capacetes de couro antiquados. Durante todo o tempo, Anna se viu ao mesmo tempo horrorizada e fascinada pelo esporte.
- "Achei tão brutal, quero dizer, eles estão brincando com o cadáver de um animal", disse ela. - "Por outro lado, sou da Espanha, onde temos touradas. Muitas de nossas tradições parecem envolver fazer os animais sofrerem."
O jogo foi desenvolvido a partir de uma habilidade comum entre os cavaleiros da estepe asiática: agarrar uma cabra ou um bezerro do chão em pleno galope. O objetivo dos jogadores é agarrar a carcaça sem cabeça de uma cabra, livrar-se dos adversários e arremessá-la através de uma linha de meta, ou então, em outras versões, dentro de um barril ou de um círculo.
Hoje é jogado principalmente no Afeganistão, onde é o esporte nacional. Durante o primeiro reinado do governo talibã no país, o buzkashi foi banido por considerarem o jogo imoral. Depois que o Talibã afegão foi deposto em 2001, o esporte voltou a ser praticado. Quando o Talibã recuperou o poder em 2021, eles permitiram que o esporte continuasse.
A versão afegã engloba várias modalidades. Na mais organizada, um time jogo contra o outro para levar a cabra a dois círculos, como dois gols, em lados opostos do campo. Esses tombos mostrados no vídeo devem doer.
Na modalidade "zoada" é todo mundo contra todos e a concorrência é tipicamente feroz. Antes do estabelecimento de regras oficiais pela Federação Olímpica Afegã, o esporte era conduzido principalmente com base em regras como não chicotear um colega ginete intencionalmente ou deliberadamente derrubá-lo de seu cavalo. Os ginetes costumam usar roupas pesadas e proteção para a cabeça para se protegerem contra chicotes e botas de outros jogadores.
Ainda que tenham dito a Anna Huix que as mulheres tadjiques "gostam mais de casamento, isto está prestes a mudar. A amazona Malika Rajabova está acostumada a ser a única mulher em campo quando joga buzkashi. Ela diz que alguns homens disseram que ela não deveria jogar, mas isso só aumentou sua motivação de "roubar" a cabra.
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