Daniel Vaz de Carvalho
Segundo Aristóteles, conquistar uma cidade é fácil, conservá-la é que é difícil. Conceito que tem sido repetidamente comprovado pelos EUA. A vitória militar pode não passar de uma "vitória de Pirro", como lhe chamaram os romanos, se não for apoiada numa vitória económica e política. Para além do que a propaganda esconde, a situação foi dramaticamente definida pelo presidente da Federação Russa: "Para os EUA, a Ucrânia é uma questão de dividendos geopolíticos. Para a Rússia, é uma questão de vida ou morte". Quando gente com responsabilidades na NATO e na UE e primeiros-ministros (como António Costa) dizem que a guerra acaba quando a Rússia for vencida, a questão é: Como? É o que tentamos analisar.
1 - O confronto militar
Menos de um mês após o inicio das operações, as capacidades de combate ucranianas tinham sido significativamente reduzidas, sobretudo em equipamentos. Scott Ritter, ex-oficial dos marines e ex-inspetor de armamento, enumera o material que a Ucrânia dispunha no início do conflito, incluindo "540 canhões de artilharia auto-propulsados de 122 mm, 200 obuses rebocados de 122 mm, 200 sistemas de lançamento de foguetes múltiplos de 122 mm, 53 canhões auto-propulsados de 152 mm, 310 obuses rebocados de 152 mm e 96 auto-propulsados de 203 mm". A Rússia alegou ter destruído "521 instalações de múltiplos sistemas de foguetes de lançamento" e "1947 morteiros e artilharia de campo". "Perante a destruição deste equipamento e doutro entregue entretanto, "a Ucrânia solicita 1.000 peças de artilharia e 300 sistemas de foguetes de lançamento múltiplo, mais que o disponível pelo exército e marines dos EUA, e 500 tanques de batalha principais – mais do que Alemanha e Reino Unido têm em conjunto".
Segundo Scott Ritter, com base na análise da matemática militar preditiva básica, os níveis de baixas reais e projetadas, ditavam que o governo ucraniano, despojado de um exército viável, não teria escolha a não ser a rendição. Tendo a NATO decidido (?!) que a Rússia não podia ganhar, seguiu-se um acelerado envio de armas [NR] e combatentes sob a forma de mercenários. O que existe é uma guerra NATO x Rússia que segundo a Rússia: "aumenta o número de vítimas, mas não poderá influenciar o resultado da operação”.
O resultado obtido pela Rússia até agora é tanto mais significativo quanto durante oito anos e constantes ataques às Repúblicas do Donbass, os EUA/NATO armaram e treinaram um exército de centenas de milhares de efetivos e estruturaram um sistema de defesas fortificadas profundamente escalonadas. Um resultado que a Rússia alcançou numa ofensiva em que os atacantes, contra todos os procedimentos militares, eram em menor número que os defensores. Uns 160 mil contra 200 a 250 mil [1].
Apesar da intervenção da NATO em milhares de milhões de dólares em assistência militar, envio de milhares de efetivos como mercenários, orientação e informações, a Rússia vence a guerra no terreno, libertando do domínio das formações nazis as Repúblicas de Lugansk e Donetsk, dentro das fronteiras administrativas iniciais dessas oblasts (distritos), e os ucranianos não são capazes de manter uma linha de frente estável. As ações ucranianas limitam-se a alguns contra ataques, sem sucesso, intensa propaganda repetida no ocidente para os povos aceitarem os sacrifícios feitos em nome dos "interesses do ocidente" e da clique da Kiev – telecomandada de Washington.
Sobre a forma como a Rússia conduz esta guerra e suas estratégias, é exemplo a tomada de Mariupol e Sverdonetsk, preparadas com a colaboração da NATO, para uma longa defesa enquadrada com os efetivos mais aguerridos da Ucrânia, os grupos nazis como o Azov.
De acordo com o Ministério da Defesa da Rússia, os ucranianos perdiam o equivalente a um batalhão cada dois dias, sem mencionar dezenas de tanques, veículos blindados, peças de artilharia, caminhões, centros de comando. Os nazis ucranianos literalmente sequestram moradores locais e os forçam a pegar em armas. Além disso, levam não apenas jovens, mas até mesmo moradores idosos.
A TASS informou que, desde o início, as Forças Armadas da Ucrânia tinham perdido pelo menos 50 mil soldados mortos sem contar os feridos e os que se renderam. Segundo The Guardian: “As perdas ucranianas variam de 600 a 1.000 pessoas por dia. "O número total de baixas – mais de 20 mil por mês – levanta questões sobre o estado o exército ucraniano se a guerra se prolongar até ao outono." (Intel Slava Z – Telegram em 27/6 e 13/6).
Escolas, jardins de infância, hospitais e igrejas são locais preferidos pela tropa ucraniana. Um dos principais problemas que subsistem para as forças russas é o de civis serem usados como escudos humanos. A estratégia russa de cercos parciais mostra-se eficaz, porém torna-se uma guerra sangrenta dado que as chefias ucranianas recusam-se a dar ordens para retiradas sensatas. Um prisioneiro dizia que Zelensky emite deliberadamente ordens suicidas para exibir um cenário de resistência. (Intel Slava Z – Telegram em 2/6)
Em resumo, a situação é a seguinte: as forças russas controlam o espaço aéreo e marítimo da Ucrânia e 20 a 25% do território. As rotas para entrega de armas à Ucrânia são controladas pelo exército russo, as ferrovias estão danificadas e os caminhões com armas são atacados, todo o sector de refinação de petróleo deixou de trabalhar devido aos ataques russos.
Um artigo do Washington Post em 26/5, relatava que contrariamente às narrativas que têm sido difundidas, muitas tropas ucranianas têm sobrevivido com uma batata por dia e desertado dos seus postos sentindo que os seus líderes os enviaram para uma morte certa. Anichados em trincheiras, sujeitos a artilharia e mísseis, os homens rezavam para que a barragem de fogo parasse. Enquanto isto, "os líderes ucranianos, projetam uma imagem de invulnerabilidade militar das suas forças, aguentando triunfantes os ataques".
O New York Times em março declarava que a Ucrânia seria vencedora, não importava quanto tempo levasse. (?!) Em 11 de maio um artigo documentava que não ia tudo bem para os EUA na Ucrânia salientando que uma mudança de orientação era necessária. Em 19 de maio, considerava-se que uma "vitória total" sobre a Rússia não era possível, a Ucrânia tinha que negociar a paz de forma que refletisse uma "avaliação realista" da situação e os "limites" do comprometimento dos EUA.
Com o essencial dos efetivos treinados já fora de combate, a clique de Kiev procede à mobilização de jovens. A resistência faz-se em instalações civis e zonas industriais, com efetivos enquadrados por grupos nazis, mercenários e serviços de segurança que, segundo relatos de prisioneiros, controlam, ameaçam, matam mesmo os que tentam render-se. (Intel Slava Z – Telegram 14/6)
Nada diferente do que acontecia no final da 2ª Guerra Mundial, no campo nazi, bem como o desespero de lutar para não morrer, com a clique de Kiev e "conselheiros" da NATO, obrigando os soldados ucranianos a sacrifícios inúteis.
Após a passagem para o controlo da Rússia, de todo o Donbass, Kerson, já ligado à Crimeia, e Zaporozhye, contíguo, a ofensiva será completada para Krakov, a partir de Sverdonetsk, e Odessa, a partir de Nikolaev. A Rússia ficará no entanto com vários objetivos por cumprir: a desnazificação e a desmilitarização da Ucrânia, além da criação de uma estrutura de segurança europeia. A guerra irá portanto prosseguir numa fase mais complexa:
- ou a Rússia prossegue a ofensiva até Kiev, o que implica uma mobilização de meios humanos e materiais muito maior – além de grandes sacrifícios para a população ucraniana agora e no futuro.
- ou a Rússia coloca-se numa posição defensiva nas regiões tomadas, aguardando as ações que a outra parte tomar.
Em qualquer dos casos a guerra prosseguirá com cada vez maior envolvimento da NATO, dado que Ucrânia não tem meios humanos e materiais para lançar qualquer ofensiva ou sequer gerir política e economicamente o país. Os EUA vão fornecer misseis e respetivos meios de lançamento que poderão atingir o território russo, treinando há meses equipas ucranianas na sua utilização. Estes meios, têm a fragilidade de seu transporte e montagem serem facilmente detetados.
O confronto entre a NATO e a Rússia vai intensificar-se, não sendo de excluir que se estenda a outros países. De qualquer forma, é extremamente preocupante, que grupos nazis, soprados pelos belicistas neocons e outros russofóbicos, disponham de misseis que podem atingir território russo. Os belicistas apostam neste cenário.
A insistência de Kiev na entrega de mais armas, devia fazer pensar para quê. Desde março que a NATO e UE fazem intensas entregas de armas à Ucrânia. Que foi feito delas? Na Fox News afirmava o tenente-coronel na reserva Daniel Davis: "A Rússia tem uma vantagem "esmagadora" na guerra na Ucrânia, não apenas tomando território, mas destruindo a capacidade da Ucrânia de defender o país em qualquer lugar. E mesmo todas as armas que prometemos fornecer dificilmente são um décimo do que seria o mínimo necessário. Se se olhar apenas para estas duas coisas, então não há caminho racional para a vitória da Ucrânia". (Intel Slava Z – Telegram em 24/6)
O Pentágono duvida da eficácia do lado ucraniano. Desde março, as perdas ucranianas aumentaram dez vezes, enquanto o exército russo, pelo contrário, conseguiu reduzi-las significativamente. De acordo com analistas militares ocidentais, um aumento no fornecimento de armas para a Ucrânia não desempenhará um papel decisivo, as Forças Armadas da Ucrânia são forçadas a ocupar posições defensivas deliberadamente desvantajosas. (Intel Slava Z – Telegram em 15/6)
Contudo, como vê a Rússia a entrega de armas mais sofisticadas por parte dos EUA? Afirma Lavrov: “Quanto maior for o alcance das armas fornecidas pelo ocidente para a Ucrânia, para mais longe Moscovo moverá a linha de ameaça dos neonazis à Federação Russa".
No meio do drama da guerra, "comentadores" afirmam que muitas unidades russas recusam-se a avançar ou como dizia na CNN um general, ex-representante de Portugal na NATO, em cada 10 soldados russos apenas 1 tem vontade de combater. Na revista Visão, de 20/6 o sr. Luís Delgado afirmava que a vitória da Ucrânia é inquestionável. As novas armas começarão a fazer toda a diferença a partir de julho, as forças militares ucranianas já receberam 97 mil sistemas anti-tanque, que são mais do que todos os blindados existentes no mundo. A quantidade russa, alguma com mais de 50 anos, não se equipara à qualidade e sofisticação das armas aliadas. Em nenhuma área. A vitória da Ucrânia é inquestionável. O que está em causa não é só a inqualificável invasão russa, que os ucranianos enfrentaram com bravura, mas também o orgulho e a demonstração de força dos aliados, dando o que de melhor têm nos seus arsenais. A diferença vai notar-se em julho.
Esquecem que a Rússia tem capacidade para destruir a NATO europeia e os próprios EUA. As forças nucleares russas foram mobilizadas, sabe-se que submarinos russos capazes de lançarem os mísseis-torpedo de capacidade nuclear Poseidon [2] se movimentam. Os mísseis Sarmat completaram os testes finais, entraram em produção e estarão disponíveis para as forças russas dentro de quatro a cinco meses.
Larry C. Johnson ex-analista da CIA, dá-nos uma perspetiva realista desta guerra: "Descrever a Rússia como uma força “vazia" é um absurdo sem fundamento. Os russos realizam complexas operações militares numa frente de 1 500 km que se estende de Kharkiv no norte, através do Donbass até Odessa. Além de fornecer munições, combustível, comida e assistência médica às forças terrestres, os russos também estão a alimentar centenas de milhares de civis sem abrigo por causa dos combates. Depois, há a coordenação de artilharia e mísseis de cruzeiro baseados no mar, juntamente com apoio aéreo de aeronaves de asa fixa e de asa rotativa. Ao contrário dos pronunciamentos triunfalistas de Washington, a Rússia está ganhando a guerra, a Ucrânia perdeu a guerra. Infelizmente para Washington, quase todas as suas expectativas sobre esta guerra mostram-se incorretas. E a maior parte do resto do mundo – América Latina, Índia, Oriente Médio e África – encontra poucos interesses nacionais nesta guerra, fundamentalmente americana contra a Rússia".
O New York Times revela que a CIA e forças especiais dos EUA apoiam as operações militares na Ucrânia e coordenam o envio e operação do armamento. Segundo Caitlin Johnstone este facto desmente Biden e representa a admissão de que a NATO está envolvida "numa guerra total por procuração com a Rússia", isto é, em operações contra uma superpotência nuclear com todos os seus perigos. Falcões como o congressista Seth Moulton dizem coisas como: "Não estamos em guerra apenas para apoiar os ucranianos. Fundamentalmente estamos em guerra, embora um pouco por meio de um proxy, com a Rússia – e é importante que vençamos”.
Diz ainda Scott Ritter, "As tentativas da Ucrânia em retardar o avanço russo, são feitas com sacrifício dos soldados na frente, milhares de pessoas atiradas na batalha com pouca ou nenhuma preparação ou equipamento". "Deve-se ainda considerar as perdas sofridas pela Ucrânia e o facto da Rússia parecer capaz de sustentar o seu atual nível de atividade de combate indefinidamente. Mas há outra conclusão que esses números revelam: não importa o que os EUA e a NATO façam em termos de servir de arsenal da Ucrânia, a Rússia vencerá a guerra. A questão agora é quanto tempo o ocidente pode dispor para a Ucrânia, e a que custo. A feia verdade sobre a Ucrânia é que quanto mais a guerra continuar, mais ucranianos morrerão e mais fraca a NATO se tornará".
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