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domingo, 31 de outubro de 2021

Devolver IRS é aumentar a injustiça social na cidade

Josué Caldeira


A proposta de devolução do IRS “aos lisboetas” é, simultaneamente, uma fraude económica e uma opção socialmente injusta. Afinal, os “novos tempos” estão carregados de passado, as políticas que anunciam têm como foco proteger os privilegiados.

Quanto é que são 70 milhões no orçamento da cidade?

- 70 milhões correspondem a cerca de 50% do investimento municipal anual, a 3,5 anos de investimento nas políticas sociais e a seis anos de subsídios à exploração da Gebalis (bairros municipais).

- 70 milhões são, de facto, uma verba que pode fazer a diferença, se aplicada nas áreas de desenvolvimento social e, fundamentalmente, no combate às desigualdades e às diferentes manifestações da pobreza urbana.

-70 milhões são também fundamentais para que a trajetória da cidade responda aos desafios do desenvolvimento urbano sustentável com que Lisboa se confronta. Estes deverão ser, de facto, o foco das políticas públicas locais cuja relevância social se vê reforçada no contexto que a pandemia provoco

Quem beneficiaria, então, com a opção de Carlos Moedas, impondo uma redução brutal da receita municipal com o propósito de “devolver o IRS aos lisboetas”?

O gráfico que acompanha este texto fala por si. A devolução do IRS “aos lisboetas”, a ocorrer, apresentaria um padrão altamente diferenciado ao longo dos escalões de rendimentos segmentados por decis de rendimentos. Esta devolução favoreceria, principalmente, os contribuintes com rendimentos mais elevados, os do 10.º decil (rendimentos brutos acima dos 46 mil euros por sujeito passivo). Em média, um sujeito pertencente a este grupo de contribuintes beneficiaria de uma devolução de 1285 euros, isto é, 80 vezes a devolução média a um contribuinte do grupo dos 50% mais pobres (rendimento inferior a 14 mil euros) cuja devolução totalizaria 16 euros.

PÚBLICO -
Aumentar

Os lisboetas com rendimentos mais elevados são, de facto, os grandes beneficiados com a proposta de Moedas. O conjunto de 10% de contribuintes integrantes do 10.º decil arrecadaria 56% do IRS devolvido. Se se considerar a devolução de IRS que caberia aos dois últimos decis (grupo dos 20% de contribuintes com rendimentos mais elevados) chegamos a um valor igual a 76% da devolução de IRS.

No lado oposto da escala de rendimentos, para os contribuintes de baixos rendimentos, o valor da devolução é insignificante, como já referido, sendo o benefício individual da proposta praticamente nulo. A devolução aos 50% mais pobres é igual a 3% do montante total a devolver.

Isto é, a proposta de devolução do IRS “aos lisboetas” é, simultaneamente, uma fraude económica e uma opção socialmente injusta. Atributos que se aplicam também à proposta do PS, aprovada durante o mandato anterior, de devolução do IRS, ainda que pela metade do valor que Moedas agora propõe. É uma fraude económica porque a devolução do IRS consubstancia uma forte redução de receita própria do município, uma despesa fiscal que o município teria de assumir e que teria como consequência a significativa diminuição da sua capacidade de investimento.

É, por outro lado, uma opção orçamental socialmente injusta, porque impõe uma perda de receita municipal para beneficiar diretamente as famílias de rendimentos mais elevados e, particularmente, as famílias mais ricas da cidade de Lisboa (que integram o grupo das famílias mais ricas do país). Esta opção viola, ainda, o princípio da progressividade do imposto sobre o rendimento pessoal estabelecido pela Constituição da República.

Os desafios de desenvolvimento urbano que Lisboa hoje enfrenta, garantindo as condições para um direito à cidade para todos, exigem mais políticas públicas, mais investimento público, mais orçamento público. O contrário é uma ficção!

A proposta de Moedas tem, contudo, uma virtude: mostra que, afinal, os “novos tempos” estão carregados de passado, as políticas que anunciam têm como foco proteger os privilegiados e como resultado aumentar a injustiça na cidade.

O autor escreve segundo o novo acordo ortográfico

sábado, 30 de outubro de 2021

NA NÁUSEA E FARTUM

 


Paulo Querido in facebook


Na náusea e fartum. Uma pessoa liga a televisão, qualquer canal, ou olha distraidamente para um televisor num restaurante ou café, e lá está, um banho de PSD. Uma imersão completa. Recados, contra-recados, promoções legítimas, ilegítimas — não há peso nem medida, vale tudo para promover Paulo Rangel como *o* futuro PM, favas contadas.
Custa ver os jornalistas bandarilhados, quando não são eles próprios os agentes desta lavagem ao cérebro, desta sobre-ocupação do espaço público com um único sinal partidário, esmagador.
O fartum é tal que até um dos outros protegidos do poder mediático, Nuno Melo, candidato ao CDS, se veio queixar de golpe. Golpada. Só falta Ventura vir acusar as televisões de não lhe darem o espaço suficiente.
Vale tudo para levar Paulo Rangel ao colo. Tudo. Perguntem a Marcelo, que provocou esta crise política em benefício de Rangel, o que vale.
Marcelo Rebelo de Sousa precipitou uma decisão antes da Assembleia da República ter sequer tempo de ponderar uma hipotética moção de censura, antes que o Governo apresentasse um Orçamento alternativo, quiçá negociável com outros partidos (a Comissão Europeia sugeriu esta solução; Marcelo nem deu por isso, estava ao telefone com Rangel).
Nada: Marcelo não quis saber nem do Governo, nem da AR, nem dos parceiros sociais, nem dos partidos, nem sequer do Conselho de Estado. Todas as audiências serão cumprir calendário. Um formalismo. Assim mandam as regras de educação do PR que já tomou a sua decisão e a anunciou antes mesmo que a AR votasse o Orçamento.
Vale tudo. E só te digo: o espaço público, e em especial o televisivo, vai piorar muito daqui até à véspera das eleições informalmente marcadas por... Paulo Rangel.
Protege-te, abriga-te. Vai ser uma impenitente saraivada de falsidades, fontes anónimas, exércitos de bots, de comunicadores profissionais e muito, muito voluntariado, em especial no Facebook, Twitter e Instagram, para reduzir tudo a um nome, uma pessoa, um salvador.
O homem que já disse ao que vem: aliança com a extrema-direita para obliterar o centro, o centro-esquerda e a esquerda, subjugar meio país, corporizando esse peculiar visão das eleições como um jogo em que o vencedor reduz os vencidos a escravos e muda as regras a seu favor para se eternizar no poder. Como Orbán, como Trump. Como Putin.

EM ALTA VOZ - A ENTREVISTA NA ÍNTEGRA DE VASCO CARDOSO PCP


 CLIQUE NO LINK ABAIXO PARA O(A) LEVAR AO VÍDEO


entrevista com os protagonistas das notícias que marcam os dias. Para ouvir na TSF (às sextas, depois das 13h00, com repetição ao sábado, ...

O que faltava: bombas de lava rodando pelo vulcão de La Palma


 

As rochas que caem rodando pelas montanhas a grande velocidade são por si uma visão assustadora, mas resultam ainda mais quando são pura brasa em vermelho vivo. O geoquímico Harri Geiger da Universidade Albert-Ludwigs de Alemanha está pesquisando as erupções em curso no vulcão Cumbre Vieja na ilha de La Palma. O vulcão entrou em erupção em 19 de setembro e não parece estar interessado em se deter tão cedo. Geiger faz parte de uma equipe de investigação internacional coordenado pela Universidade de Las Palmas da Grande Canária.


O que faltava: bombas de lava rodando pelo vulcão de La Palma

Ele e seus colegas estavam tomando amostras de cinzas na zona de exclusão do vulcão quando a rocha fez seu dramático aparecimento. Enquanto Geiger encontrava-se aproximadamente a 1 quilômetro do respiradouro vulcânico, capturou um vídeo extraordinário de uma bomba de lava descendo a toda velocidade pelo morro. Geiger estimou que a bomba de lava media aproximadamente 1 metro de diâmetro e pesava ao redor em meia tonelada.

As bombas de lava fragmentada são rochas expulsas por vulcões em erupção bastante perigosas. Em 2018, uma bomba de lava do tamanho de uma bolinha de basquete se chocou contra um barco turístico em frente à costa de Havaí, ferindo 20 pessoas e enviando 4 ao hospital.

Felizmente, ninguém ficou ferido por esta bomba de lava em particular em La Palma.

- "Estávamos a uma distância prudencial e vimos outras bombas de lava antes, estamos atentos em todo momento"disse Geiger, que naturalmente vê isto como uma experiência de aprendizagem. - "Ver uma bomba 'viva' é uma ocasião estranha, podemos aprender sobre a velocidade de ejeção, as trajetórias, a distância de viagem e a formação geral de bombas de lava de fragmentação."

Escrevendo no blog de Landslide, o geólogo Dave Petley da Universidade de Sheffield disse que o incidente demonstra a espantosa mobilidade das rochas rolantes.

- "Como mostra o vídeo, se trata de uma rocha aproximadamente esférica, e se move sobre uma superfície essencialmente desprovida de obstáculos e que tem, até o final da sequência, uma descida constante"escreveu Petley. - "O vídeo resultante é um registro notável da extrema mobilidade nestas situações."

O que faltava: bombas de lava rodando pelo vulcão de La Palma

Por suposto, se alguém tivesse o azar de cruzar com esta bomba de lava enquanto ainda estava rodando, teria sido seu final. Felizmente, Geiger e seus colegas evitaram esse destino.


https://www.mdig.com.br/

Estão contra o golpe militar no Sudão e saem à rua sem medo

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VÍDEO
De  euronews
Estão contra o golpe militar no Sudão e saem à rua sem medo





Centenas de manifestantes saíram à rua, este sábado, no Sudão, contra o golpe militar que está em curso. Pelas ruas de Cartum, a capital do país que fica no norte de África, ouvem-se gritos de protesto contra a ação militar que levou à dissolução do governo e à imposição de estado de emergência, mesmodepois dos últimos protestos sangrentos.

Na segunda-feira passada, o grupo miltitar que fazia parte do governo interino deteve o primeiro-ministro e outros membros do governo e tomou controlo do poder total.

O general Abdel Fattah al-Burhan diz que o golpe serve para terminar com a uma instabilidade do país que está a ser provocada pela divisão de governo entre civis e militares.

Depois do golpe, as ruas encheram-se de protestos, nove manifestantes acabaram mortos e 170 feridos.

EUA pediram aos militares para que deixassem os civis protestarem sem conflitos, este sábado, o que, até agora, está a acontecer. A ONU diz estar em contacto com as duas partes para encontrar uma solução de paz.


VÍDEO

Crime, disse ela!





O Festival Literário Internacional de Óbidos – Folio – tem todas as condições para servir de cenário a uma história de psicopatia e homicídio. Por toda a vila de Óbidos há uma tentativa desesperada de perfeição, uma obsessão com a harmonia das coisas em tons de pastel e sorrisos de realeza.

O som dos passarinhos é substituído pelas vozes melífluas que, aos microfones, conduzem conversas literárias cheias de bonomia e uma vaidade contida que anseia por se revelar debaixo da caxemira. Entre os paralelos e as casinhas castiças, uma bicicleta inútil com um cestinho com livros indiferenciados completa esta complexa estética das vidas simples. Só um coração sem qualquer maldade não veria aqui um psicopata a emergir.

O Folio não é só um exemplo de como o turismo se transformou na única alternativa de muitas localidades. O festival demonstra bem como a cultura, trabalhada enquanto entretenimento, pode ser um produto turístico com tanto valor como o chocolate e a ginja. O produto que está ali à venda não é, contudo, a literatura. Em Óbidos vende-se um sonho de pertencer a um mundo literário, passear no meio de escritores e editores, críticos, jornalistas e outras personalidades que preenchem o espectro desse imaginário de sofisticação e vanguardismo intelectual. A aparência do ser culto constitui-se como um imperativo moral e um gesto necessário de pertença.

«Em Óbidos vende-se um sonho de pertencer a um mundo literário, passear no meio de escritores e editores, críticos, jornalistas e outras personalidades que preenchem o espectro desse imaginário de sofisticação e vanguardismo intelectual.»

Há uns anos, a propósito da chacota com a forma de falar de Jorge Jesus, Manuel Sérgio dizia que há no mundo intelectual uma certa sobranceria, um complexo de superioridade, muito semelhante ao dos aristocratas, como se a intelectualidade lhes estivesse no sangue. A consequência disso é um julgamento público das capacidades intelectuais e cognitivas das pessoas que não partilham a mesma condição e a criação de uma divisão cujos critérios são, essencialmente, classistas.

Apesar da total ausência de confronto no mundo literário (se queremos polémicas temos de ir às páginas da Vértice dos anos 50 e 60), há conceções de vários assuntos que saem de festivais como o Folio que necessitam urgentemente de uma análise crítica e de discussão. Naqueles espaços existe uma espécie de pacto de não-agressão, para não ferir suscetibilidades e para parecermos todos muito civilizados. Provocar uma discussão, entrar em desacordo frontal, é quebrar aquela harmonia e desestabilizar aquele sistema de relações públicas, dependente, que tenta sobreviver num país pequeno e periférico. Mas, sem este confronto, corremos o risco de agravar ainda mais os problemas de acesso à cultura. Há determinado tipo de ideias que, não tendo qualquer contraditório, se disseminam e criam clivagens socioculturais de difícil reversão.

Veja-se, por exemplo, este texto de Paula Perfeito, apresentado no Folio a propósito do projeto literário Bode Inspiratório. A certa altura, a jornalista conta que em conversa com o filho disse que «quando escrevemos com erros, significa que pensamos mal». A facilidade com que isto é dito sugere-nos que esta ideia lhe parece consolidada, comprovada, certamente pela profunda análise social feita a partir da relação entre a ortografia e o processo cognitivo.

Este fetiche com a ortografia não nos é estranho, claro. Já assistimos a algo parecido nas discussões sobre o acordo ortográfico (que permanecerão mesmo depois do apocalipse). Em primeiro lugar, temos a ortografia como o fim último da expressão escrita. Depois, temos uma relação entre pensar mal e ser ignorante, o que nos leva a perguntar: o que é pensar mal?

Consigo imaginar uma dezena de razões para as pessoas darem erros ortográficos (ou até gramaticais, que são bem mais frequentes e menos percetíveis). Entre a dislexia e as várias circunstâncias do acesso à educação, tenho alguma dificuldade em fazer a associação implacável de Paula Perfeito.

Considerar que dar erros na escrita é um sintoma de mau pensamento é o mesmo que tratar o analfabetismo como uma falha do caráter, uma inevitabilidade moral. Essa conclusão não é só um erro de análise. Ela reflecte uma posição de classe, mesmo que sem consciência – a posição de quem vive alheado da realidade dos outros.

Há muitos anos, era eu um adolescente, entrei com um amigo numa livraria no Porto, frequentada por bastantes operários da zona. Enquanto procurávamos qualquer coisa que nos interessasse, uma mulher de bata e chinelos entrou na mesma loja, dirigindo-se à caixa e perguntando à livreira por um disco ao vivo do José Mário Branco. A mulher jurava que havia um disco ao vivo chamado Remendos e Côdeas, como a canção de 1978 de A Mãe.

A discussão envolveu uma troca de argumentos sobre censura e sobre a importância de o disco se chamar Remendos e Côdeas. Não me recordando bem da conclusão, lembro-me sim de uma mulher destemida a discutir com uma livreira sobre assuntos que na altura eu julgava só estarem reservados a uma elite. Imagino que aquela mulher não tivesse nenhum doutoramento em cultura popular contemporânea, mas a forma como expressou as suas ideias, o caráter revolucionário das suas ideias, é ainda um dos momentos mais marcantes da minha formação enquanto indivíduo.

«Há muitos anos, era eu um adolescente, entrei com um amigo numa livraria no Porto, frequentada por bastantes operários da zona. Enquanto procurávamos qualquer coisa que nos interessasse, uma mulher de bata e chinelos entrou na mesma loja, dirigindo-se à caixa e perguntando à livreira por um disco ao vivo do José Mário Branco. A mulher jurava que havia um disco ao vivo chamado Remendos e Côdeas, como a canção de 1978 de A Mãe

O que falta nestes festivais de literatura é aquilo que falta em praticamente todo o setor da cultura: o acesso de todos à criação, produção e fruição cultural. O Folio, como as Correntes d' Escrita, e outras iniciativas da família, estão feitos para um nicho. Neles não vemos uma única área onde se procure ouvir a classe operária sobre cultura.

Mas, a literatura não se faz sem a classe operária. Ela está, aliás, presente em toda a sua história, mesmo que subentendida, e sobretudo no seu processo de produção. Acredito que sem a sua presença, que não é nem pensada nem estimulada, se torne mais fácil simplificar estereótipos e tirar conclusões, que acabarão validadas pela anuência desse mesmo nicho. Porém, não se pode ignorar o caráter proletário desse processo de produção, nem deixar de envolver os seus protagonistas numa programação sobre cultura.

Sabemos, porém, que a necessidade do turismo, visto da perspetiva do capitalismo, dita que o sucesso de uma iniciativa está dependente da captação do «público-alvo» e da promoção de uma «experiência» que «inspire» os «clientes». É a cultura num parque de diversões que muda de cenário de quatro em quatro meses, conforme o tema – hoje, mundo dos livros; amanhã, aldeia do chocolate.

Não sei quando regressarei a Óbidos. Mas não minto se disser que me assusta um aglomerado de tanta gente perfeita, tanto cenário de ficção policial em pequena vila castiça. Sinto-me bem mais seguro nas imperfeições, nos «erros» e nas contradições da realidade.


 www.abrilabril.pt 

E agora, pá?


 manifesto74.pt 



“O PCP chumba o orçamento, vamos para eleições, a direita ganha, o Vintruja vai para o governo, ai ui é o fascismo, e não tarda nada é a lasanha que me está a meter a mim no microondas. A única forma de evitar isto é votar no PS!”

Caaaalma, geringoncista. Tanto stress ainda te rebenta uma veia. Mais dialética e menos diazepam. O futuro não está escrito na pedra. A única crise política que existe é a que o Marcelo criou, e o OE era tão mau que o único partido que votou a favor foi o PS. O governo, se quiser (e não quer) tem 90 dias para apresentar outra proposta. Ou então pode governar em duodécimos.

É uma crise? Crise é que um em cada cinco trabalhadores viva abaixo do limiar da pobreza. Crise é que ao português comum sobra sempre mês no fim do dinheiro, nunca dinheiro no fim do mês. Crise é que nos grandes centros urbanos um salário mínimo – aquele que o governo acha que pode ser só 705€ – esteja abaixo duma renda de casa média – fruto da lei das rendas que o governo não quer revogar. Não sei se já olhaste para os resultados do Censos 2021, mas crise é termos hoje quase menos 200 mil habitantes do que tínhamos há dez anos. Com a política salarial que o PS quer manter, perdemos para a emigração. Sem as creches gratuitas, perdemos natalidade. Sem soluções nem vontade para as aplicar, é normal que o OE tenha sido chumbado.

Já deu para perceber que tu achas que vivemos num tempo novo, mas cai na real: desde 2015, o governo PS tem-se recusado a fazer alterações estruturais, fazendo avanços tímidos, repondo apenas umas coisitas, limitando-se a umas migalhitas nos últimos dois anos, mas sempre limitado por aquela que é a natureza de classe e os interesses do PS. Outra coisa não seria de esperar, e por isso é que aquele entendimento que teve início em 2015 teria que ter um fim. 

A realidade é que os problemas de base não se resolveram e ao fim de 6 orçamentos se têm vindo a acumular. E a malta foi tendo paciência, mas a paciência tem limites. E esses limites foram atingidos agora, face à intransigência nas negociações. Repara, até o Paulo Pedroso, até a Maria de Lurdes Rodrigues (aquela que encavou os professores enquanto ministra da educação do Sócrates), até a Ana Gomes, em quem tu foste votar porque era o grande baluarte antifascista, vieram a público dizer que havia margem e devia ter havido muito mais disponibilidade do governo para negociar e ceder. Foram eles, que são do PS, que disseram, não fui eu. 

Aqui ninguém matou a geringonça, ela estava morta desde 2019 e o único entendimento que houve desde então foi em dois orçamentos do Estado, e mesmo assim, já com todos os sinais de que ou havia mudanças significativas, ou a coisa estava presa por arames.

Portanto acalma a franga e deixa de dizer que vais a correr votar no PS para conter a extrema-direita porque o CHEGA vai crescer. O CHEGA cresce com a reconfiguração da direita e o teu voto “contra” não muda nada nessa reconfiguração.

E já agora, acerca desse medo do papão da extrema-direita: ela sempre lá esteve, pá. Quem foram o Sá Carneiro e o Pinto Balsemão, deputados da Assembleia Nacional fascista? Fundadores do PSD. Ou o Adriano Moreira, Ministro do Ultramar fascista? Presidente e deputado do CDS. Ou o Veiga Simão, ministro da Educação Nacional fascista? Deputado e duas vezes ministro do PS, uma vez com o Soares e outra com o Guterres. A única diferença entre estes e o Vintruja é que estes são fachos de salão, e o Vintruja arma-se em facho da tasca.

Portanto, a não ser que o eleitorado de esquerda vá a correr votar na direita, o mais provável é que depois das eleições fique tudo mais ou menos na mesma.

Se quiseres, claro. Porque se mesmo depois do que viste acontecer em 2015, ainda cederes à pressão do voto útil e fores a correr votar no PS (caso em que, diria o meu avô, para seres burro só te faltam as penas) e eles tiverem maioria absoluta, não tens mais Costa, tens é mais Sócrates. Tens um PS a ser PS, a finalmente aliviar toda a sua tesão privatizadora que teve de conter durante estes 6 anos. Se um PS minoritário não avançou em reformas estruturais importantes para a classe trabalhadora, imagina um PS com maioria absoluta.

“PS a conter privatizações”, óleo sobre tela, 2021

Se isto ainda não te tinha passado pela cabeça, notícia de última hora: a eles passou. Por isso é que preferiram não apresentar um OE que pudesse ser aprovado, para com o apoio do Marcelo poderem ir novamente a eleições com a maioria absoluta no horizonte. Cabe-nos agora não cair no conto do vigário.


E agora, pá?

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