segunda-feira, 16 de agosto de 2021

A decrepitude periférica Portugal esfarela ao sol. É apenas um sítio, virado para o Atlântico, um Cabo Cadaveral.

 


Seria aconselhável que os elencos autárquicos fossem bem mais pequenos; que as assembleias tivessem reais poderes e que fosse a população a escolher os seus representantes, de modo direto e, não os partidos .

Sumário

1 – O folclore eleitoral em cenário de despovoamento

2 - Um modelo coercivo e excludente

3 – Portugal, demografia regressiva consolidada

4 – O esvaziamento demográfico do território

 

VVVVVVVVVVV OOOOO VVVVVVVVVV

 

1 – O folclore eleitoral em cenário de despovoamento

Prepara-se um carnaval em outubro e um assalto ao erário público, com a recomposição de misturas entre negócios de autarcas à custa das câmaras; e, o que se chama aparelho de justiça, atuará adequadamente na espera da prescrição das atitudes criminosas. Com um pano de fundo repleto de coronavírus para assustar e entreter.

As cores quentes que dominam o mapa (ver mais abaixo) nada têm a ver com o calor estival, nem com a praia, onde deverá vigorar o “distanciamento social” sob pena de multa, uma prática ameaçadora devidamente orquestrada ad nauseam pelos mandarins de topo; mais concretamente, um modelo exposto por um hipocondríaco, um barrigudo, uma loura insegura e um portador de três queixos.

Essas cores quentes predominantes representam nuances do despovoamento, do abandono da população que se dirigiu para outras paragens ou que se encaminhou ou encaminhará em breve, para o cemitério… enquanto houver alguém para servir de coveiro… Se não houver, contrata-se uma empresa de negreiros (conhecidas como fornecedores de trabalho temporário) que se encarregará de encontrar alguém, suficientemente na miséria, para aceitar qualquer contrapartida pelo exercício dessas funções; a empresa, agradecida, não se recusará a compensar o autarca de serviço.

Em 2019 o número de emigrantes portugueses espalhados pelo mundo era de 2.6 M (o equivalente a 25.6% dos residentes), contra 2 M em 2000 (19.3% dos residentes); uma dinâmica reveladora. Quanto à população residente, era de 10.4 M em 2001, 10.6 M em 2010 e 10.3 M em 2020, contribuindo para o efeito a subida do número de imigrantes de 651 mil em 2000 para 888 mil em 2019. Se a imigração tivesse estagnado ao nível do princípio do século, a população hoje residente pouco ultrapassaria a fasquia dos dez milhões de pessoas.

Mais chocante é que entre janeiro e junho deste ano, nasceram 37.675 crianças em Portugal e que em 2020 morreram 115000 pessoas; daí ressalta um enorme deficit, prenunciando uma quebra demográfica só compensada com a chegada de gente do Sul da Ásia (nepaleses, indianos, paquistaneses) para o trabalho duro no campo, com poucos direitos e onerado pela parcela cobrada pela intermediação de parasitas[1].

2 - Um modelo coercivo e excludente

Um modelo económico capitalista exige o crescimento infinito da acumulação, grosseiramente medida pelo PIB. Esse crescimento exige uma imensa mobilização da força de trabalho e dos recursos do planeta, com o demente desprezo pelos impactos ambientais e climáticos, como na saúde e no conforto da população humana; e daí que as jornadas de trabalho tenham sido relativamente inelásticas no último século, a despeito dos investimentos em equipamento, conhecimento, das maiores qualificações da força de trabalho e, seus reflexos na produtividade.

A desigualdade no seio da espécie humana tem sido uma constante histórica. A despeito das enormes capacidades para a satisfação das necessidades humanas, o planeta tem suprido com relativa facilidade essas necessidades mas, com custos crescentes quanto à apropriação dos recursos minerais, com a redução da diversidade animal e vegetal, com a deterioração da qualidade da água e da atmosfera. E, com a redução do intervalo entre moléstias globais e o aumento da sua disseminação que empobrecem, assustam e debilitam as pessoas.

Mostra-se delirante que uma espécie animal, provida de imensos recursos criativos, artísticos e de gestão das suas necessidades, mantenha as brutais desigualdades, que vão do faminto e doente ser humano vítima de seca, ao volume de recursos utilizados por um tal Jeff Bezos na demente satisfação de um curto percurso suborbital.

A dívida, gerada de modo facilitado e insano – pública, privada, inerente aos negócios ou à especulação - inclui-se numa lógica que se afasta totalmente das necessidades humanas e do meio envolvente; e os impulsos eletrónicos que a criam são incorporados no PIB e nas cotações de títulos e moedas, tornando totalmente artificial a consideração de que aquele pode crescer indefinidamente.

Nesta volúpia, há vários participantes, um grupo relativamente pequeno de responsáveis – os especuladores, o sistema financeiro, os capitalistas em geral e as classes políticas - que empurram as sequelas da demência financeira, para as pessoas comuns, pobres ou remediadas, novas ou velhas, de qualquer religião ou cultura; e, obviamente, recorrendo ao controlo ideológico que Thatcher bem definiu – there is no alternative – através dos media, das redes sociais, para a cultura de massa que, evidentemente, não deixa de colher o seu quinhão financeiro, como se observa em Gates, Zuckerberg, Ellison, Bezos, Arnaud, Musk… A ausência de pulsões libertárias na grande massa dos seres humanos corresponde à pachorrenta aceitação da violência dos poderes, mais ou menos disfarçada por detrás da vacuidade que carateriza os media ou, as chamadas redes sociais, ambientes marcados pela imbecilidade, pela mentira, pela infantilidade, pelo mais estéril devaneio.

Os estados-nação surgiram e consolidaram-se na base de uma lógica capitalista de acumulação de riqueza (para alguns) e de segmentação social; de fora ficam trabalhadores, velhos, desempregados. Essa é a regra que une capitalistas e políticos na senda do saque e da corrupção em qualquer estado-nação; contra a população que trabalha sob a ameaça da autoridade estatal, das suas estruturas repressivas (polícias e tribunais) e imbuída de um veneno chamado nacionalismo ou patriotismo; um falso sentido de pertença.

Como dizia Eça de Queirós, há mais de um século, “Portugal é apenas um sítio, pouco mais do que a Lapónia que nem sítio é”. Essa frase resume magistralmente a fragilidade de um país, incapaz – em devido tempo - de manter um império comercial como a Holanda, por exemplo. Que cedeu Bombaim (!!) à Inglaterra como dote de uma princesa a casar com um rei inglês mas, que resistiu a ceder “preciosidades” como Damão e Diu à Índia enquanto o navio de guerra “Afonso de Albuquerque”, em 1960, se escondia atrás dos navios mercantes em Pangim, até ser forçado a encalhar na praia encurralado pelos navios de guerra indianos. Depois de ter perdido o lugar de campeão do tráfico de escravos, sob a ameaça da Inglaterra, Portugal arrastou-se quanto pode para ter um império africano mesmo sem ter uma indústria para incentivar ao saque colonial. No século XX, atolou-se em África, numa guerra colonial antecipadamente perdida e que teve como único fruto saudável, o golpe de 25 de Abril de 1974 que eliminou o fascismo; mas que não foi suficiente para evitar o dealbar do pos-fascismo em 1975 – com o enquistamento de uma nova classe política que:

·       procedeu a nacionalizações de empresas falidas, em 1975;

·       seguidamente as capitalizou através de investimento público;

·       em 1985, por acordo entre Cavaco e Constâncio, procedeu à sua alienação;

·       em 2014, por imposição da troika, procedeu a uma última maré de privatizações, com forte domínio de capitais estrangeiros; e que não evitou um acentuado aumento da dívida pública.

No seguimento destes factos voltou a acentuar-se a emigração[2], o empobrecimento, o alargamento do fosso socio-económico relativamente à grande maioria dos países europeus, incluídos na UE.

Entre os poucos casos de empresas relevantes de capital português, destacam-se dois portentos (?) de tecnologia, duas cadeias de supermercados que em breve, terão a espanhola Mercadona a ombrear com elas. Em termos comerciais e empresariais Portugal é um prolongamento de Espanha apresentando, quase todo o território, um perfil próximo do registado pela autonomia mais pobre do estado espanhol (a Extremadura).

3 – Portugal, demografia regressiva consolidada

Como se pode ver no mapa seguinte, Portugal é um local de fuga, de abandono populacional com uma dinâmica demográfica claramente regressiva contando apenas  com 41 concelhos (num total de 305), grande parte em definhamento demográfico e económico, “semeados” de casas fechadas, desocupadas, quando não arruinadas, campos abandonados, zonas arborizadas não tratadas, prontas para incendiar, com venda garantida da madeira queimada, às fábricas de celulose. Recentemente o sociólogo Carlos Taibo publicou Iberia Vaciada: Despoblación, Decrecimiento, Colapso abordou esta situação para um quadro ibérico.

Para os mais crentes nas realizações do regime pos-fascista, adiantamos que morreram em Portugal 115000 pessoas em 2020 e que os nascimentos no primeiro semestre do ano em curso se cifraram em 37675, longe, portanto, de apontar para um saldo fisiológico positivo.

O imobiliário e o turismo tornaram-se as âncoras da economia portuguesa, tendo como complemento a construção, daí resultando preços exagerados das casas que aprisionam os jovens a planos de pagamento contraídos junto da banca, por cinquenta anos, para terem uma habitação; porém, os preços especulativos não constituem limitações para estrangeiros endinheirados, quiçá mafiosos, que encontram em Portugal uma boa lavandaria. A habitação é algo que os governos abandonaram, de todo, ao sabor do mercado especulativo, com forte presença de capitais estrangeiros na aquisição e exploração para fins turísticos, mormente em Lisboa, Algarve e Madeira; certamente que a especulação tem responsabilidades na quebra da população residente naqueles locais.

O negócio das autoestradas com a eterna cobrança de portagens complementa uma rede ferroviária, descapitalizada, desfasada no tempo, com nichos privados no percurso Lisboa-Setúbal (Fertagus) ou com a venda da antiga CP Cargo a uma empresa global. Esse abandono da via ferroviária materializa-se em performances incríveis - 13 h num percurso Lisboa-Irun ou 9 h numa viagem Lisboa-Madrid; e, mesmo intramuros, uma viagem Lisboa-Porto (274 km) pode durar 3h e 24 min. Nos anos setenta, um percurso Paris-Bordéus (600 km) realizava-se em pouco mais de três horas. Dispensamo-nos de referir as velocidades dos TGV europeus ou… chineses. Acrescentemos ainda que há mais de cinquenta anos (!) a nociva mescla empresariato/classe política discute uma alternativa ao aeroporto de Lisboa… fora do casco urbano da cidade!

Um território periférico, tradicionalmente empobrecido e parco de qualificações é uma porta aberta para o domínio de países vizinhos, muito mais ricos, para a colonização pelo capital estrangeiro; e que certamente, são conhecedores da tradição de venalidade da classe política nacional, durante o fascismo como atualmente, no regime pos-fascista. Os “investidores” menos destros sobre a venalidade portuguesa têm à sua disposição, para os devidos efeitos, as nebulosas sociedades de advogados.

A fuga fiscal, a economia paralela, correspondem a uns 30% do PIB e a sua existência não favorece os que trabalham por conta de outrem, as grandes vítimas da punção fiscal. O parasitismo das “empresas de trabalho temporário” é partilhado pelo governo que, por exemplo, vem contratando e por bom preço, junto daquelas “empresas”, pessoal da área da saúde, em tempos pandémicos.

4 – O esvaziamento demográfico do território

O mapa que se segue, apresenta a evolução da população em Portugal entre 2010 e 2020.

·       Não há alterações na composição dos concelhos mas, os governos frequentemente procedem a frequentes modificações na composição e designação das regiões NUT-2 e NUT-3; essas alterações e designações prender-se-ão com disputas sobre fundos comunitários entre os principais gangs partidários; 

·       A população global reduziu-se em 276 mil pessoas (-2.6%);

·       Para a regiões NUT – 2 a involução demográfica é a norma – Norte menos 129 mil pessoas (-3.5%); Centro menos 111 mil pessoas (-5%); Área Metropolitana de Lisboa mais 51 mil (1.8%); Alentejo menos 58 mil (-8%); Algarve menos 10 mil (-2.3%); Açores menos 4 mil (-1.8%); Madeira menos 12 mil (-5%). A manterem-se estes ritmos, de modo aligeirado, pode dizer-se que o Alentejo estará deserto dentro de 12 anos e a região Centro como a Madeira ficarão sem população dentro de 20 anos…

·       Procedendo a uma análise mais fina, a das regiões NUT-3 e, para 2010/20, observa-se:

o  No âmbito da região Norte, nenhuma região apresenta acréscimos de população. As menores quebras populacionais sobressaem no Cávado (-1.5%) e na Área Metropolitana do Porto (-2.0%). Inversamente as regiões com maiores quebras demográficas são registadas no Alto Tâmega e nas Terras de Trás-os-Montes, com perdas de população de 9.8 e 9.7%, respetivamente; de modo linear, aqueles ritmos de redução demográfica significam a desertificação num prazo de dez anos.

o  Quanto à região Centro, a quebra populacional é de 5% no período 2010/20 e, nenhuma das regiões integrantes apresenta aumento demográfico. As menores quebras registam-se no Oeste e na Região de Aveiro, com valores de -0.5 e -1.4% respetivamente. As sub-regiões com uma desertificação humana mais marcada são Beiras e Serra da Estrela (-11.1%) e Beira Baixa (-10.6%); matematicamente, no âmbito daqueles valores, aquelas regiões estarão desertas… dentro de dez anos.

o  No que se refere à Área Metropolitana de Lisboa observa-se um crescimento de 1.8%, correspondentes a 50670 pessoas.

o  Como referimos, o Alentejo perde 8% da população em 2010/20, repartidos por todas as regiões NUT-3 durante a década. As quebras populacionais mais marcantes observam-se no Alto Alentejo (-13%), Alentejo Central (-9.5%) e Baixo Alentejo (-9.2%) que correspondem a uma perda da ordem das 43000 pessoas.

o  No Algarve, a regressão populacional foi de 2.3%.

o  Nos Açores a quebra populacional foi de 1.8%.

o  Na Madeira a população decresceu quase 5%.

Um país ou uma região que reduz a população mostra a sua “falta de competitividade” para atrair investimentos, num mundo onde a lógica do lucro determina todas as decisões, determinando enormes assimetrias entre áreas desertificadas e outras, mormente urbanas, onde a densidade dos seus habitantes promove pilhas de edificado, adornadas com automóveis em todos os cantos, lixos variados, ausência ou insuficiência de jardins e parques, transportes públicos deficientes, etc…

Onde há redução da população há uma gradação na fuga de população, entre os que emigram e os que morrem, em quantitativos muito superiores aos que nascem; sobrando os que se mantêm, porque relacionados com as funções estatais (nacionais, regionais, locais), como escolas, centros de saúde, polícias, câmaras municipais; ou ainda, pequenas atividades como o comércio que reste depois da implantação de supermercados, bem como cafés e restauração. O caso atual da Dielmar evidencia o nefasto impacto que o fecho da empresa terá em Alcains e arredores.    

Observemos para cada região NUT – 3, os concelhos com melhores/menos más evoluções demográficas em 2010/2020; e, os que mais se afundaram na regressão populacional.   

Região NUT -3

Melhor/menos má evolução

Pior regressão demográfica

Alto Minho (-6.6%)

V. N. Cerveira (-4.0%)

Melgaço (-13.5%)

Cávado (-1.5%)

Braga (1%)

Terras do Bouro (-13.8%)

Ave (-3.7%)

Vizela (0.7%)

Vieira do Minho (-10%)

Área Metrop. Porto (-2.0%)

Valongo (4.3%)

Porto (-9.6%)

Alto Tâmega (-9.8%)

Paços de Ferreira (0.7%)

Montalegre (-16.5%)

Douro (-7.9%)

Tarouca (-3.5%)

Freixo Esp. à Cinta (-14.4%)

Terras T-os-Montes (-9.7%)

Bragança (-5.3%)

Vinhais (-16.6%)

Oeste (-0.5%)

Arruda dos Vinhos (17.7%)

Nazaré (-6.4%)

Região de Aveiro (-1.4%)

Oliveira do Bairro (6.7%)

Sever do Vouga (-9.1%)

Região Coimbra (-5.9%)

Condeixa-a-Nova (4.6%)

Góis (-12.2%)

Região de Leiria (-3.2%)

Batalha (1.7%)

Castanheira Pera (-19.7%)

Viseu-Dão-Lafões (-6.1%)

Viseu (-1.5%)

Aguiar da Beira (-16.2%)

Beira Baixa (-10.6%)

 Castelo Branco (-7.5%)

Idanha-a-Nova (-19.2%)

Médio Tejo (-6.2%)

Entroncamento (7.9%)

Mação (-16.4%)

Beiras Serra Estrela (-11.1%)

Belmonte (-7.6%)

Almeida (-21.0%)

Área Metrop. Lisboa (1.8%)

Alcochete (14.6%)

Lisboa (-7.2%)

Alentejo Litoral (-5.0%)

Grândola (-1.9%)

Alcácer do Sal (-11.6%)

Baixo Alentejo (-9.2%)

Alvito (-2.1%)

Mértola (-17.3%)

Lezíria do Tejo (-4.2%)

 Benavente (6.7%)

Coruche (-13.7%)

Alto Alentejo (-8.3%)

Campo Maior (-7.6%)

Gavião (-23.0%)

Alentejo Central (-9.5%)

Vendas Novas (-5.4%)

Mora (-19.0%)

Algarve (-2.3%)

Albufeira (3.5%)

Alcoutim (-28.6%)

R. A. Açores (-1.8%)

Corvo (12.0%)

Calheta (-16.7%)

R. A. Madeira (-5.0%)

Santa Cruz (7.2%)

Porto Moniz (-15.1%)

O quadro é eloquente e preocupante. A quebra de população tem causas várias e a sua efetivação nunca é algo de promissor.  E o mapa seguinte é chocante.

 grazia-tanta.blogspot.com

Sem comentários:

Enviar um comentário