terça-feira, 1 de junho de 2021

INTERVENÇÃO DE JERÓNIMO DE SOUSA, SECRETÁRIO-GERAL, ENCONTRO COM TRABALHADORES «PELO TRABALHO COM DIREITOS. CONTRA A EXPLORAÇÃO»






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18:11


Os encontros e contactos realizados por membros do PCP com trabalhadores imigrantes e a informação que aqui veio acerca das condições de trabalho na agricultura diz-nos quão grave é a situação dos trabalhadores e brutal a exploração a que estão sujeitos, e quão exigente é a tarefa que temos pela frente para inverter a situação que está criada aqui no Alentejo, mas também noutras partes do País, e assegurar e defender os legítimos direitos e interesses dos trabalhadores.

Todos temos consciência quão desmedida foi a ofensiva de décadas promovida por sucessivos governos de PS, PSD e CDS contra os direitos dos trabalhadores, nomeadamente a ofensiva desencadeada com as alterações às leis laborais e o retrocesso civilizacional profundo que tais alterações significaram, com a sua clara aposta de desvalorização do trabalho e dos trabalhadores.

As revisões do Código de Trabalho, a par de outras medidas de política económica e social a favor do grande capital, não tinham outro objectivo senão degradar salários, promover a precariedade designadamente com a facilitação do contrato de trabalho de muito curta duração, fazer vingar horários prolongados e desregulados, atacar a contratação colectiva e os direitos que esta consagra, facilitar despedimentos, em suma desvalorizar o trabalho e aumentar a exploração.

As consequências dessa política, travada em alguns dos anos, estão hoje mais expostas e agravadas com a epidemia que, aliás, tem servido de pretexto para as práticas mais abusivas, arbitrárias e ilegais por parte do grande patronato.

Problemas gerais que têm aqui nesta região uma expressão particular de brutal exploração e atropelo de direitos laborais, atingindo milhares de trabalhadores – e de forma particular os trabalhadores imigrantes, onde estão presentes situações inaceitáveis e atentatórias de direitos fundamentais.

O caso de Odemira, que o PCP denunciou desde 2012, é apenas uma ponta do icebergue, como aqui se confirma.

Os mesmos que promoveram a ofensiva contra os direitos dos trabalhadores, restauraram o latifúndio e liquidaram a Reforma Agrária com as consequências de desastre humano, ambiental e económico que hoje se vê a olho nu. Liquidaram-na em nome de um desenvolvimento da região que nunca chegou e prometendo um Alentejo de explorações agrícolas familiares e de cooperativas de pequenos agricultores.

A realidade está aí, a terra cada vez mais concentrada nas mãos de uns poucos, que apropriaram e tiraram todas vantagens e mais valias das infraestruturas públicas, como o Alqueva, para promover a agricultura intensiva e superintensiva, retomando velhas formas de exploração.

A terra alentejana é hoje um «activo financeiro», concentrada na mão de grupos financeiros. No perímetro do Alqueva, nos últimos 20 anos, estima-se que cerca de 70% da terra agrícola tenha mudado de mãos e o seu preço multiplicado por seis! Com o Alqueva as culturas de sequeiro deram lugar às culturas de regadio, com o olival a predominar sob o controlo de seis grandes grupos, dominados por fundos internacionais – a Sovena/Oliveira da Serra, o De Prado, Olivomundo, Aggraria, Innoliva e o Bogaris.

A forma de exploração da terra está intrinsecamente ligada à forma das relações de propriedade. A exploração capitalista agrária intensiva (de exigentes rentabilidades), vive de mão-de-obra numerosa, barata, precária/sazonal e dispensável sempre que necessário, como, aliás acontece, e por isso em condições de desprotecção social e laboral quase total, com elevada percentagem de clandestinos, sobre a exploração de empresas de aluguer de mão-de-obra.

Não é por acaso que, nos últimos dez, doze anos a mão-de-obra contratada por empresas prestadoras de serviços aumentou 99,8% (Recenseamento Agrícola 2019) e nos campos do Alentejo, nomeadamente neste distrito de Beja, (segundo o INE) residem indivíduos de 94 nacionalidades diferentes, contratados por empresas criadas para o efeito, muitas vezes em articulação com redes mafiosas e de tráfico humano.

Alguns vão diretamente para as explorações, onde vivem e trabalham, longe da vista de todos.

As suas condições de trabalho e de vida não serão diferentes de outras realidades e experiências existentes do outro lado da fronteira e os que residem em aldeias, vilas ou na cidade são transportados diariamente para os campos, contratados por essas ditas empresas, que abrem num dia e fecham no outro.

Em alguns locais da cidade, por volta das 6 da manhã, montam sucedâneos de praças de jorna. Se chove, não trabalham e não ganham, ficar doente nem pensar pois muitos nem têm os documentos com eles para poderem ir aos serviços de saúde.

É louvável e saudamos o esforço que o Sindicato dos Trabalhadores da Agricultura – neste caso o SINTAB – faz para chegar com a sua palavra e informação sobre a contratação colectiva para o sector e informações sobre a sindicalização. É muito útil o seu trabalho e é indispensável o empenhamento de todos nós no combate à exploração que aí está.

Temos realidades tremendamente violentas – imposição de extenuantes ritmos de trabalho, baixíssimos salários, abaixo do limiar da pobreza, de discriminações salariais. Falta de condições habitacionais e sanitárias.

E sim, uma realidade de trabalho não declarado e ilegal, com exploração do trabalho imigrante com situações de autêntica escravatura e, em geral, associado ao tráfico de mão-de-obra – uma realidade difícil de avaliar na sua verdadeira dimensão, mas que não pode servir para ausência de intervenção.

Exploração, injustiças, desigualdades para garantir a um reduzido número de accionistas dos grandes grupos e fundos colossais lucros.

Estamos perante uma violação dos direitos humanos e da dignidade de cada um destes homens e mulheres trabalhadoras.

Em Portugal é significativa a dimensão de trabalhadores com situações de trabalho ilegal ou não declarado e de recurso ao trabalho temporário para funções e tarefas permanentes.

Empresas utilizam estas pessoas como mão-de-obra gratuita nos períodos de época alta, substituindo necessidades efectivas de trabalhadores, obrigando-as à realização de horários de 50, 60 ou mais horas semanais. E muitas vezes os enganam deixando salários por pagar e os descontos para a Segurança Social por regularizar, embora feitos pelos trabalhadores.

Ao mesmo tempo, a realidade caracteriza-se por uma reduzida eficácia da ACT, agravada pela falta de meios humanos e técnicos. A realidade da arbitrariedade e violação de direitos que se verifica impõe o reforço e o aumento da eficácia de mecanismos de informação, fiscalização, punição dos infractores, bem como esquemas de apoio aos trabalhadores.

Sim, a exploração, os baixos salários, a precariedade, a falta de condições em que habitam é neste momento a realidade da maioria dos trabalhadores agrícolas do distrito de Beja e isto não pode continuar. Isto tem que acabar!

O Governo não pode continuar a assobiar para o lado!

É urgente criar mecanismos que invertam esta realidade por forma a que os trabalhadores agrícolas imigrantes e portugueses, tenham um trabalho digno e com direitos.

É preciso pôr fim a estas brutais práticas de exploração que têm a cumplicidade das empresas empregadoras agrícolas, sobretudo as multinacionais detentoras das grandes explorações, e que assim dispõem de um exército de mão-de-mão barata, da qual se desresponsabilizam completamente, pretendendo assim distanciar-se do incumprimento da lei e da violação dos direitos humanos, sociais e laborais destes trabalhadores.

É urgente travar a generalização e legitimação da precariedade. A precariedade é um flagelo individual e colectivo que representa uma grave violação de direitos e exige o seu firme combate e erradicação – erradicação de todas as formas de precariedade.

Há um problema de legislação laboral. É preciso revogar as normas gravosas da legislação laboral. É preciso garantir que uma empresa constituída para realizar uma determinada actividade tenha um quadro de trabalhadores para a realizar, que uma empresa que se dedica à agricultura tenha um quadro de trabalhadores agrícolas e não se esconda e desresponsabilize atrás de contratação de serviços a empresas em cascata, incluindo as de todo o tipo de trabalho temporário.

É necessário que as empresas beneficiárias do trabalho também sejam responsabilizadas pela situação dos trabalhadores que aí operam independentemente do grau de subcontratação a que recorrem.

O PCP agiu e age para que essas alterações da lei se concretizem.

Para o PCP só uma legislação de trabalho que retome a sua natureza de protecção da parte mais desprotegida é compatível com uma perspectiva progressista e com o desenvolvimento económico e social e a garantia do direito ao trabalho.

A par de uma legislação laboral negativa, há ainda o não cumprimento dos limites que ela contém. Há a impunidade do grande capital que se alimenta da violação das leis, da corrupção, do tráfico camuflado ou explicito de seres humanos.

As autoridades devem intervir, a ACT, Autoridade para as Condições de Trabalho, deve intervir, deve dispor dos meios humanos e técnicos necessários, deve ter orientações adequadas, deve além dos autos ter poderes de acção executiva, como há muito o PCP propõe.

É preciso acabar com a política do faz de conta nas violações patronais dos direitos dos trabalhadores. Fica-se pelos autos, ou então pelo aconselhamento patronal. Isto não pode continuar assim, a violação dos direitos dos trabalhadores tem que ser punida.

Para o PCP o desenvolvimento tem como elemento central a valorização do trabalho e dos trabalhadores.

Exige o aumento geral dos salários e do salário mínimo como uma emergência nacional.

Exige condições de trabalho dignas e a aplicação dos direitos a todos os trabalhadores, independentemente da nacionalidade ou etnia.

Exige a redução do horário de trabalho e o combate à desregulação dos horários nas suas diferentes variantes.

Exige a revogação das normas gravosas da legislação laboral, nomeadamente da caducidade da contratação colectiva e a reposição do princípio do tratamento mais favorável ao trabalhador.

Exige uma justiça laboral que actue com eficácia no cumprimento dos direitos que a Constituição da República Portuguesa consagra.

Ouvimos António Costa, agora enquanto recandidato a Secretário-geral do PS dizer que a “pandemia deixou bem patente o grau de desregulação que existe nas relações de trabalho”.

Ora este é o mesmo PS que ainda há dois anos se juntou a PSD e CDS para alargar o período experimental para seis meses apesar dos avisos que fizemos, levando a que milhares de jovens fossem despedidos mal começou a epidemia, o mesmo PS que vota contra as iniciativas do nosso partido para pôr fim à caducidade da contratação colectiva sabendo que essa é uma fonte de desregulação.

O mesmo PS que em vez de garantir vínculos efectivos aos profissionais de saúde está a contratar para responder à Covid, os deixa numa inaceitável precariedade. Não bate a cara com a careta.

É preciso romper com as opções do passado de regressão e exploração e construir um Portugal mais justo no plano laboral e social com novas soluções, onde o direito ao trabalho e trabalho com direitos tenham uma realização concreta na nossa vida colectiva.

Embora com a plena consciência que a solução para os problemas não dispensam, bem pelo contrário, exigem essa ruptura com a política de direita e a concretização de uma política patriótica e de esquerda, nós continuamos a estar como sempre temos estado, empenhados na procura das soluções e tomada de medidas que correspondam a legítimas aspirações dos trabalhadores e do povo português a uma vida melhor.

Da nossa parte vamos continuar a intervir. Fazer o que fizemos ainda há dias, obrigar a debater e a confrontar o Governo do PS sobre os direitos dos trabalhadores.

Vamos continuar a tomar iniciativas legislativas e fazer propostas, e a confrontar todos na Assembleia da República com a exigência da garantia dos direitos dos trabalhadores.

Vamos continuar a desenvolver a campanha pelo emprego e os direitos dos trabalhadores, contra a exploração, contactando os trabalhadores, esclarecendo, mobilizando.

Vamos continuar a apelar aos trabalhadores para que lutem pelos seus direitos e a melhoria das suas condições de vida.

Nós vamos continuar o nosso combate pela alternativa, que tem como uma das prioridades a valorização do trabalho e dos trabalhadores.

É perante uma realidade que apela ao reforço do combate contra a exploração, que mais uma vez reafirmamos que a Reforma Agrária permanece como um projecto de futuro.

Um projecto necessário e que mantém toda a actualidade como parte integrante do processo de desenvolvimento do Alentejo.

Um projecto que não abandonaremos e pelo qual continuaremos a lutar. Uma Reforma Agrária que, cumprindo a Lei Fundamental do País, liquide a propriedade latifundiária! Um sonho de gerações que um dia, estamos certos, será concretizado!

O PCP conta com os trabalhadores. Os trabalhadores podem contar com o PCP!


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