domingo, 4 de abril de 2021

A maldição, em vez de benção, de interpretar Jesus no cinema

 

Ao longo da história do cinema há alguns papéis que marcaram um antes e um depois. Não só pela qualidade interpretativa que pode ser reconhecida com múltiplos prêmios, senão pelas desgraças que alguns atores sofreram ao se meter na pele dos personagens. Há papéis que criaram uma verdadeira mitologia ao seu redor que, inclusive, para outros atores que queiram interpretar esse mesmo personagem, supõe enfrentar uma maldição que irá persegui-lo também.


A maldição, em vez de benção, de interpretar Jesus no cinema

A história de Jesus, por exemplo, fascina a humanidade há mais de 2.000 anos, mas o papel de "Jesus" se tornou uma verdadeira miragem para os atores de Hollywood. Assim como na história da Bíblia, os atores que interpretaram Jesus passaram por momentos terríveis nos sets, a ponto do próprio Mel Gibson advertir de antemão Jim Caviezel no momento que o convidou para estrelar seu filme.

De fato, encarnar Jesus Cristo em um filme não representa apenas um grande desafio atoral, senão que o ator deve estar muito bem preparado psicologicamente e ser muito bem resolvido. Sem contar que muitos acham que o papel pode ser uma verdadeira dor de cabeça amaldiçoada. Casualidade ou não, listamos três atores que interpretaram o Filho de Deus e arruinaram suas carreiras.

Jim Caviezel, "A Paixão de Cristo"

A maldição, em vez de benção, de interpretar Jesus no cinema




Com seu metro noventa e pouco, olhos claros e porte invejável, Jim Caviezel saltou à fama em 1998 como Robert Witt em "Além da Linha Vermelha". Aplaudido por público e crítica encadeou uma série de bons filmes: "Frequency", "Olhos de Anjo" e "O Conde de Monte Cristo". Assim não se surpreendeu quando Mel Gibson o convocou para um novo projeto: ser Jesus no filme a "A Paixão de Cristo".


Gibson alertou que o personagem seria muito difícil e que o ator poderia acabar sendo marginalizado em Hollywood. Caviezel pediu um dia para pensar. Vinte e quatro horas depois sua resposta foi:

- "Acho que temos que fazer isso, ainda que seja difícil. E algo mais, minhas iniciais são J. C. e tenho 33 anos. Não tinha me dado conta disso até agora, cara."

As condições de trabalho foram extremas. Maquiar Caviezel implicava oito horas de tarefa. O "calvário" começava as duas da madrugada para terminar as 10, quando começavam as filmagens. A gravação era interrompida o tempo todo para retocá-lo; se começava a chover suspendiam as tomadas e ele dormia maquiado. Os produtos eram resistentes, só saíam com uma ducha furiosa com água muito quente. Sua pele ficou coberta de bolhas que ante o mínimo toque provocavam fortes dores.

Para as cenas do caminho ao calvário carregou uma cruz de 70 quilos, o peso deslocou seu ombro. A crucificação foi ainda pior. Durante 15 dias permaneceu horas suspenso no alto de uma cruz. Em pleno inverno e quase nu, sofreu ataques de hipotermia. Tremia de um modo tão violento que cercaram o set da cena com três aquecedores.

O frio congelava seus lábios e os assistentes passavam panos quentes para que pudesse balbuciar algumas palavras. Nem panos nem aquecedores serviram, e acabou no hospital com pneumonia. Em uma das jornadas de gravação e com um vento fortíssimo, um dos suportes da cruz cedeu e machucou ainda mais seu ombro. Em outra rodada começou uma tempestade e foi atingido por um raio que queimou parte de seu cabelo.

Mas não foi tudo. Segundo o relato cristão, Jesus foi flagelado pelos soldados e para recriar a situação colocaram nas suas costas uma placa de metal, mas um dos atores calculou mal e ao chicotear acertou o ombro de Caviezel, que ficou sem ar e sem respirar pela dor.

- "Estava representando Jesus, mas me sentia enfurecido como um diabo" disse ele em entrevista.

A tomada não serviu para nada, pois ao cair ajoelhado de dor, a placa usada como protetor ficou à vista e a cena teve que ser filmada novamente. O incidente parecia esquecido, mas alguns dias depois, outro ator errou a chicotada e acertou bem cima de seu ombro lastimado. Outra vez a dor foi tão intensa que seu corpo se retorceu, o movimento descontrolado fez com que cortasse os pulsos com os anéis de metal em que estava preso. Quando se aproximaram para ajudá-lo notaram que em suas costas tinha aberto uma ferida de 30 centímetros.

Apesar de tudo Caviezel viveu as filmagens como uma "experiência espiritual" e assegurava sentir a "grande presença" de Jesus em alguns momentos das gravações. O ator estava tão compenetrado em seu papel que os figurantes contratados, ao vê-lo passar, de forma espontânea e fora de roteiro, se ajoelhavam. Quando ele saia, de jeans e camiseta, para caminhar pelas ruelas de Sassi di Matera, a cidade italiana onde o filme foi encenado, alguns moradores pediam benção a Jesus.

A maldição, em vez de benção, de interpretar Jesus no cinema

As filmagens duraram cinco meses. Com um orçamento de 30 milhões de dólares arrecadou 611 milhões em todo mundo. Enquanto os fiéis das igrejas cristãs lotavam os cinemas, o ator recebeu severas críticas por seu anti-semitismo. Teve três indicações ao Oscar, mas não ganhou nenhum.

Estigmatizado segundo alguns e segundo outros abençoado por seu papel de Jesus, Caviezel não voltou a figurar nas manchetes. Passou despercebido no thriller psicológico "Os Desconhecidos" e em "Déjà Vu", ambos muito bons. Bryan Singer não o escolheu para "Superman - O Retorno" porque achava que as pessoas acabariam identificando o homem de aço com... Cristo. Faz três anos voltou à temática religiosa e protagonizou "Paulo, Apóstolo de Cristo". Mas sua imagem já não gera paixão e muito menos bons contratos em Hollywood.

Robert Powell, "Jesus de Nazaré"

A maldição, em vez de benção, de interpretar Jesus no cinema

Em 1975, o papa Paulo VI notou o sucesso de dois programas religiosos transmitidos pela televisão italiana e propôs às autoridades filmar a vida de Jesus. Os produtores ficaram entusiasmados com a ideia e procuraram Franco Zeffirelli, conhecido e reconhecido em todo mundo por suas recriações históricas rigorosas e um declarado católico.

No entanto, o diretor era homossexual, algo que a Igreja condena, mas como jamais reconhecia sua homossexualidade em público e se opunha ao casamento gay, todos fizeram cara de paisagem e o projeto seguiu em frente.

Zeffirelli começou a procurar seu protagonista. Não era fácil. Devia falar inglês, porque a história seria filmada nesse idioma e não tinha orçamento para dublagem. Ademais não podia ter menos de 30 anos, mas também não mais de 35. A primeiro opção foi Dustin Hoffmann e depois alguém sugeriu o nome de Al Pacino, mas seus rostos já eram bastante conhecidos e nenhum dos dois guardavam semelhança com a figura estereotipada de Jesus. O diretor viajou a Inglaterra para ver diferentes obras quando topou com Robert Powell e o convocou para interpretar Judas.

Após o teste de elenco, Zeffirelli ficou impressionado com os olhos do ator e pediu que fizesse as audições para ser Jesus porque "se Judas tem esses olhos, que olhos terá Jesus?". Pediu que o vestissem e maquiassem com as roupas do Nazareno. O resultado foi tão surpreendente, que o inglês não só cumpria seu papel com atitude, mas também irradiava um magnetismo que emudeceu a todos no estúdio.

Talvez porque se tratasse de uma produção sobre o Filho de Deus, o "diabo meteu o rabo": Powell era amasiado com sua parceira, algo também condenado pela Igreja nesse momento e logo apareceram manchetes do tipo "Jesus vive em pecado com sua namorada". Para evitar problemas, o ator passou pelo altar.

Casar-se não foi a única exigência que teve que enfrentar. Zeffirelli pensou que se durante as tomadas mantivesse seus olhos abertos conseguiria se parecer mais ao Messias, motivo pelo qual o obrigou a filmar sem piscar. Nos quase 400 minutos que dura o filme ele apenas pisca uma vez e é na cruz.

Depois da estréia, o rosto do britânico passou a ser reproduzido em milhões de estampas religiosas. Ainda hoje, na verdade, continua muito popular.

- "Uma vez estava na Venezuela gravando uma série e meus colegas foram a uma missa. Quando voltaram, todos estavam rindo e me disseram: 'que bom que não nos acompanhou à igreja, porque, por trás do altar, a imagem que veneram é a sua'. Era um imagem de uma revista", contou Powell.

O que foi uma "bênção" durante a gravação, com o tempo resultou ser uma verdadeira "maldição" para o ator. Ele teve que recorrer a ajuda psiquiátrica para poder se desprender do personagem e pese a ter realizado mais de 30 produções nunca mais voltou a se destacar no cinema ou televisão e, foi quando então, dedicou-se à literatura. Jamais voltou a usar barba e muito menos o cabelo longo porque as pessoas o perseguiam e até pediam milagres como se fosse o próprio Cristo.

Posteriormente fez trabalhos de áudio e leitura de livros para programas radiofônicos. Em 2017 estreou um documentário sobre... "O Redentor". Com 75 anos, hoje se refugia em sua casa dedicado à criação literária e tentando esquecer que ainda agora muitas pessoas, quando imaginam o Nazareno, veem seu rosto.

Jeffrey Hunter, "Rei dos Reis"

A maldição, em vez de benção, de interpretar Jesus no cinema

No início dos anos 50 existiam duas grandes estrelas: Robert Wagner e Jeffrey Hunter. Galãs, bons atores eram as figuras destacadas da poderosa 20th Century Fox. Mas Jeffrey Hunter começou a ganhar mais destaque desde que Marylin Monroe rasgou elogios a ele:

- Para mim, Jeff é o apogeu da juventude americana. Parece que acaba de sair de um campus universitário" disse a atriz em entrevista. - "É extremamente lindo, mas isso não é o que me impressiona. Tem uma espécie de ... bom, um tipo de magnetismo que apaixona qualquer um."

Ele fez grande sucesso em várias produções como "A princesa do Nilo", "A Lei do Bravo" e o faroeste "Sete Homens Enfurecidos". Em 1960 realizou um de seus melhores papéis em "Do Inferno para a Eternidade". O seguinte papel foi interpretar Jesus na produção "Rei dos Reis".

Ainda que tinha a mesma idade que Jesus morreu -33 anos- o aspecto juvenil do ator fez com que o chamassem de "Jesus adolescente". O filme causou polêmica porque mostrava Barrabás como um populista libertador de seu povo em contraste com um Messias espiritual o que reforçava o contraste entre ação e contemplação.

O filme foi gravado na Espanha, onde Hunter sempre esteve acompanhado pela espanhola Carmen Sevilla, como Maria Madalena e com Orson Welles, como narrador da versão original. A crítica elogiou o estilo épico do filme e assegurou que Hunter seria recordado como um dos melhores intérpretes de Jesus Cristo da história do cinema. Parecia que este papel seria a consagração de Hunter, mas não.

Após "Rei dos Reis" apenas participou de modestas produções, filmes B, e em papéis secundários. Para cúmulo começaram a desencadear vários fatos que faziam crer em uma verdadeira maldição.

Em 1969, filmando "Viva América!", durante uma explosão acidental no set sofreu queimaduras em seus braços e vários cacos de vidro feriram seu rosto. Semanas depois, treinando judô com um amigo, recebeu um golpe no queixo, caiu no chão e bateu a cabeça contra uma porta.

No vôo de regresso aos Estados Unidos, sofreu paralisia de seu braço direito e perdeu a fala. Foi diagnosticado com derrame cerebral e foi hospitalizado para tratamento e monitoramento médico constante. Poucos dias depois de receber alta começou a se queixar de vertigem e dores de cabeça.

Ele estava sozinho em sua casa quando sentiu uma dessas tonturas, quando descia uma escada, perdeu o equilíbrio e caiu nos degraus com tanto azar que fraturou o crânio. Encontraram-no horas depois, inconsciente, levaram-no ao hospital e durante a operação morreu, em 27 de maio de 1969. Jeffrey Hunter tinha apenas 42 anos.

Todas estas histórias referendam a lenda que assegura que todo ator que interprete Jesus sofrerá uma maldição e não poderá seguir se destacando mais em seu trabalho. Talvez porque, como assegura o ditado popular: "Todo aquele que se mete a redentor termina crucificado".



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