quinta-feira, 24 de setembro de 2020

As influências do Árabe na Língua Portuguesa e locais portugueses com nomes árabes


 



Estiveram alguns séculos em Portugal e deixaram inúmeros heranças e costumes. Descubra as influências da língua árabe na língua portuguesa e na toponímia.

Árabe

O P





O Português sofre inevitavelmente a influência da Língua Árabe, influência que ultrapassa em muito a extensão que a maioria dos autores refere, não só em termos de “marca” no seu léxico, como da própria forma como se opera






Assim, a extensão da influência do Árabe no Português, que a maioria dos autores resumem a cerca de 1.000 substantivos, deve ser consideravelmente alargada, não só no seu número, que segundo Adalberto Alves é de 18.073 termos, como ao nível gramatical, já que inclui não só substantivos, como adjectivos, verbos, pronomes, artigos e interjeições. (ALVES, 2013, pág. 23)

A influência do Árabe no Português é bastante mais marcada do que no Castelhano ou no Catalão, línguas que, localizando-se geograficamente mais próximas de França recebem a sua influência directa e têm um efeito de tampão no Português. A título de exemplo refira-se que aos 18.073 termos que o Português recebeu correspondem cerca de 4.000 termos recebidos pelo Castelhano.

A conversão dos mouriscos – retábulo da Capela Real de Granada

Até 1496, data do decreto de expulsão das minorias muçulmana que não aceitassem a conversão forçada ao cristianismo, o processo de influência do Árabe no Português persiste, não só nas chamadas “ilhas muçulmanas em território português”, as mourarias, como através da influência sofrida em Marrocos pelos portugueses via “Mouros de Pazes”.

Com a instituição do terror da Inquisição em 1552, o Árabe é proibido, reduzindo-se à sua expressão mínima e clandestina, a escrita “aljamiada”. Inicia-se então um período de expurgação de tudo o que é ou soa a Árabe.

Apesar dos mais de 500 anos que durou a presença Árabe em Portugal essa influência refere-se essencialmente ao léxico, pelo que não podemos falar de uma influência estrutural. Um aspecto extremamente relevante é o da adopção de muitos termos Árabes na formação do calão português, a chamada “gíria dos rufiões“, que no período da inquisição terá tido grande incremento através da utilização de expressões e termos encapotados pelos mouriscos e cripto-muçulmanos.

De seguida procura-se dar, apenas a título de exemplo, uma visão geral relativa aos aspectos mais evidentes desta influência.

Antes de mais uma referência a quatro exemplos paradigmáticos e que fazem supor que algumas expressões de caracter religioso perduraram pelo engenho popular:

Oxalá (law xá Allah ou incha Allah, se Deus quiser).

Olá (wa Allah, Deus, saudação).

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Olé (wa Allah, Deus, interjeição utilizada como aplauso ou incentivo).

Olarilolé (la illaha ila Allah, não há divindade senão Deus, profissão de fé muçulmana).

Casa do Alentejo
Casa do Alentejo

A grande maioria dos substantivos começa com o artigo definido Al (o ou a), muitas vezes com o assimilado à consoante inicial do substantivo, concretamente quando esta é uma consoante solar. No alfabeto Árabe não existem vogais, mas apenas consoantes, e as consoantes dividem-se em consoantes lunares e consoantes solares.

As consoantes lunares não têm influência na pronúncia do l do artigo Al, quando constituem a letra inicial da palavra, como por exemplo em Alferes (o cavaleiro), Almeida (a mesa) ou Alcântara (a ponte). Mas as consoante solares quando colocadas na mesma posição assimilam o l do artigo Al, duplicando o seu valor.

Por exemplo Azeite escreve-se Alzeite em Árabe, mas pronuncia-se Azzeite pelo facto de o z ser uma consoante solar. Daí a origem de termos como AzulejoAçorda ou Atalaia.

Casa do Alentejo
Casa do Alentejo

Outras formas comuns de início de termos de origem Árabe são as palavras que começam por (XadrezXarope ou Xerife) ou por enx (EnxaquecaEnxoval ou Enxofre).

Outras palavras são caracterizadas pela terminação, como as que terminam em (JavaliMufti ou Sufi), em il (CordovilMandil ou Anil), em im (AlecrimCarmesim ou Cetim) e as terminadas em afe ou aque (AlcadafeAlmanaque ou Atabeque).

Algumas consoantes Árabes não entram nos vocábulos portugueses por uma questão de não se adaptarem à forma de pronunciar do português, como o h que geralmente se transforma em f, como em Alfama (do Árabe Alhammam), Alfazema (do Árabe Alhuzaima) ou Alface (do Árabe Alhassa).

“Volta do Mercado Saloio” de Roque Gameiro

Saloio é a designação dos muçulmanos expulsos de Lisboa após a sua conquista pelos portugueses, que se instalaram na área rural situada a Norte e Poente da cidade; a origem do termo não reúne consenso, sendo a explicação mais plausível a que defende que deriva da palavra صلاة“salat” ou “oração”, já que designava aqueles que rezavam 5 vezes por dia “fazendo o çala”, e que eram chamados na época “çaloyos”; esta seria também a origem de “çalayo”, nome do imposto pago sobre o pão na região de Lisboa; outra explicação é a origem do termo na palavra ساحلي “saheli”, que significa “habitante do litoral”; outra ainda é a origem em سلاوي “salaui” ou habitante da cidade marroquina de Salé, designação local para a população rural.

Os substantivos podem ser agrupados em várias categorias, maioritariamente relativas a inovações ou contributos que os Árabes introduziram na nossa sociedade, e a topónimos, que se observam de Norte a Sul do País e que muitas vezes aportam informações sobre o passado das próprias localidades.

No primeiro caso refiram-se as designações de cargos públicos (AlcaideAlmoxarife ou Alferes), termos de tipologias de edificações (AlcácerAlcáçova ou Aljube), de construção (AlvenariaAzulejo ou Açoteia), de instituições administrativas (AldeiaArrabalde ou Alfândega), de plantas

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(ArrozAlfazema ou Alfarroba), de frutos (TâmaraRomã ou Ameixa), de profissões (AlfaiateAlmocreve ou Alfaqueque), de termos relacionados com a agricultura (EnxadaAlcatruz ou Azenha), com a actividade militar (AdagaArsenal ou Arrebate), de termos médicos (XaropeEnxaqueca ou Alcalino), de termos geográficos (AzinhagaLezíria ou Albufeira), de unidades de medida (AlqueireArroba ou Arrátel), de animais (AlcatrazLacrau ou Javali), de adereços (AlfineteAlmofada ou Alcatifa), de instrumentos musicais (AdufeAlaúde ou Rabeca), de produtos agrícolas e industriais (AzeiteÁlcool ou Alcatrão), das ciências exactas (ÁlgebraAlgarismo ou Cifra).

Castelo dos Mouros
Castelo dos Mouros

Alguns nomes próprios e apelidos têm também a sua origem em nomes Árabes, como por exemplo Leonor (em Árabe Li an-Nur, ou que vem da luz), Abel (Abu l-, pai de), Fátima (nome de uma das filhas do Profeta Maomé), Albuquerque (Abu-l-qurq, ou o do sobreiro), Bordalo (Badala, abundante) ou Almeida (Al maida, a mesa).

Muitos termos do calão português, do mais brejeiro ao mais indecente, têm origem no Árabe. Por exemplo Marafada (Mraa Khaina, ou mulher que engana), Mânfio (Manfidesterrado ou proscrito) ou ainda Marado (Marid, ou doente).

No caso dos topónimos, para além da grande maioria de termos iniciados pelo artigo Al ou pela sua forma com o l assimilado, existem outros com origem comum, que podemos agrupar.

Por exemplo, os topónimos iniciados por Ode (do Árabe Ued ou Rio), como OdemiraOdeceixe ou Odeleite.

Os iniciados por Ben (em Árabe Ben ou Ibn significa Filho, mas em toponímia tem o significado de Lugar), como BensafrimBenfarras ou Benamor.

Castelo dos Mouros

A título de curiosidade refiram-se alguns topónimos de origem Árabe com indicação do seu significado:

Albarraque (Albarrak, o brilhante), 

Albufeira (Albuhaira, a pequena barragem),

Alcabideche (Alqabidaq, a “mãe de água”),

Alcácer (Alqassr, o castelo),

Alcáçovas (Alqassba, a cidadela fortificada),

Alcalar (Alqalaa’, o forte),

Alcaidaria (chefia),

Alcaide (o chefe),

Alcains (Alkanissa, a igreja),

Alcanena (Alqanina, a cabaça),

Alcântara (a ponte),

Alcantarilha (diminutivo de Alcântara),

Alcaria (a aldeia),

Alcobaça (Alkubasha, os carneiros),

Alcochete (Alqucha, o forno),

Alcoentre (Alqunaitara, a ponte pequena),

Alcoitão (Alqaiatun, a tenda),

Alcongosta (Alkunasa, o areal),

Alcoutim (Alkutami, o falcão),

Alfama (Alhamma, a fonte),

Alfambras (Alhamra, a vermelha),

Alfarelos (Alfahar, a louça),

Alfeizerão (Alhaizaran, o canavial),

Alfarim (Alfaramin, os decretos),

Alfarrobeira (Alharruba, o mesmo que em português),

Alferce (Alfarzo que separa, entre duas colinas),

Algarve (Algharb, o Ocidente),

Algeruz (o canal),

Algés (Aljaich, o exército),

Algueirão (Aljairan, as grutas),

Alhandra (Alandar, a debulha),

Alijó (Alaja, telhado plano),

Aljezur (Aljuzur, as ilhas),

Almacave (Almaqabara, os cemitérios),

Almada e Almádena (Almadana, a mina),

Almansil (a estalagem),

Almargem (Almarj, o prado),

Almarjão(Almarjun, o pedregal),

Almedina (a cidade),

Almeida (a mesa),

Almeirim (Almirin, o limite),

Almoçageme (a água que corre),

Almodôvar (Almuduar, o meandro),

Almoster (Almustar, lugar de aprovisionamento),

Alpedrinha (Albadri, luarento),

Alpiarça (Albiraz, o duelo),

Alqueidão (Alhaima, a tenda),

Alte (Altaf, elegante),

Alvaiázere (Albaiaz, o falcoeiro),

Alvalade (Albalad, o campo),

Alverca (Albirka, o pântano),

Alvor (Albur, a charneca),

Alvorge (Alburj, a torre),

Anadia (delicada),

Arouca (Aruqa, a bela),

Arrábida (edifício religioso fortificado),

Arrifana (Arihana, a murta),

Arronches (Arauxan, as penhoras),

Arruda (Aruta, planta silvestre),

Asseca (o caminho recto e plano),

Atalaia (lugar alto de onde se exerce vigilância),

Aveiro (Aluarai, retirado, resguardado),

Azambuja (o zambujeiro),

Azeitão (Azeitun, a oliveira),

Azóia (Azauia, a ermida),

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Belamandil (Banu Mandilnome de tribo), 

Bela Salema (Banu Salam, filhos da paznome de tribo), 

Belixe (garça), 

Benaciate (Ben sayyad, lugar ou filho do caçador),

Benaçoitão (Ben As-Sultan, filho do poder),

Benafin (Ben ‘Affan, filho do puro),

Benagil (Ben Ajawid, filho do generoso),

Benamor (Ben ‘Ammar, filho do devoto),

Benavente (Ben ‘Abbad, lugar do devoto),

Bencatel (Ben Qatil, filho da vítima),

Benevides (Ben ‘Abid, lugar do adorador),

Benfarras (Ben Farraj, filho da consolação),

Benfica (Ben Fiqa, filho da calmeirona ou da mulher alta),

Bensafrim (Ben Saharin, lugar dos feiticeiros),

Beringel (beringela),

Birre (Bir, poço),

Bobadela (Bu abdallah, pai do escravo de Deus),

Boliqueime (Bu Alhakim, nome próprio),

Borba (Birba, labirinto),

Bucelas (Basala, cebola),

Budens (Bu Danis, nome de tribo que governou Alcácer do Sal),

Burgau (Burqa, zona com o solo pedregoso),

Cacela (Qassila, seara), 

Cacém (Qassim, nome próprio, que significa aquele que testemunha),

Cacilhas (Hasila, lixeira),

Caneças (Kanissaigreja),

Cartaxo (Qar at-Taj, residente do Tejo),

Caxias (Kashih, inimigos),

Charneca (Xarnaqa, terreno inculto),

Chelas (Xila, arco),

Colares (Kula, pequeno lago),

Coruche (Quraichi, nome de tribo),

Cuba (cúpula),

Elvas (Ilbax, risonha),

Estoi (Ustul, esquadra), 

Estômbar (Ustuwanat, arcos),

Falacho (solo gretado),

Faro (Harun, nome próprio),

Fatela (Fath Allah, vitória de Deus),

Fátima (nome da filha do Profeta Muhammad),

Golegã (Ghalghal, entrar ou penetrar), 

Leça (Laza, ferrolho),

Loulé (Al’ulia, a elevada),

Loures (Lawr, lira),

Lousã (Lawha, ardósia),

Luz (amêndoa),

Mafamede (Muhammad, muçulmano),

Mafamude (Mahmmud, louvável),

Mafra (Mahfracova),

Magoito (Maqhut, árido),

Malhada (lugar de travessia de um rio),

Marateca (Mar’a at-Taqia, mulher devota),

Marvão (Marwan, nome próprio),

Massamá (Maa as-Sama’, água do céu),

Mesquita (Massjid, o mesmo que em português),

Messejana (prisão), 

Messines (elogioso), 

Mora (Murah, pastagem),

Moscavide (Maskbat, sementeira),

Mucifal (Mussafa, vale inundável),

Muge (Muhja, alma),

Murça (Mussa, nome do conquistador Árabe do Gharb Al-Andalus),

Nexe (Naxa, juventude),

Niza (disputa),

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Odeceixe (Ued Sayh, rio da torrente),

Odeleite (Ued Layt, rio do eloquente),

Odelouca (Ued Luqat, rio das sobras),

Odemira (Ued Amira, ou rio da princesa),

Odiáxere (Ued Arx, rio da punição),

Odivelas (Ued Ballas, rio da terracota),

Oeiras (Urwah, moitas),

Olhão (‘Ullyah,elevado),

Oura (Awra, esconderijo),

Ourén (Wahran, nome de cidade na Argélia),

Ourique (Wariq, verdejante),

Ovar (‘Ubr, curso de água),

Palmela (Bismillah, ou em nome de Deus),

Parchal (Barjal, circuito),

Penela (Ben Allah, filho de Deus),

Peniche (Ben ‘Aixa, filho de Aixa),

Quelfes (Kallaf, moço de estrebaria),

Queluz (vale da amendoeira),

Retaxo (Ritaj, entrada),

Sacavém (Xaqaban, próximo),

Safara (Saharadeserta),

Salema (Salamapaz),

Sameiro (Samar, junco),

Samouco (Samuq, alto),

Sargaçal (Xarqwasi, arbusto),

Serpa (Xarba, poção),

Sertã (Saratan, caranguejo),

Setil (Sabtil, de Ceuta),

Sever (Sabir, colina),

Sines (Sin, fortaleza),

Sor (Sur, cerca),

Tarouca (Turuq, caminhos),

Tavira (Tabira, ruína),

Tercena (Dar as-Sina, casa da industria), 

Trofa (Taraf, extremidade),

Valada (Balat, planície),

Vau (Wad, rio),

Vieira (Bayara, concha), 

Xabregas (desfazer),

Zambujal (de Zabbuj, oliveira brava),

Zavial (Zauia, azóia),

Zêzere (Za’za’a, agitação).

Autor: Frederico Mendes Paula

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